Número 18 – Julho de 2025

Imagem: Jornal o Globo (Getty Images)

Autora: ana Paula Tostes

Vamos falar de emergência climática em ano de COP no Brasil? Um olhar sobre a União Europeia e sua ambição como uma liderança climática, dentre outras coisas que precisamos nos lembrar

 

Em ano de COP no Brasil (Conferência anual criada no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a UNFCCC) é relevante compreendermos melhor o problema da emergência climática e as iniciativas nacionais, regionais e internacionais sobre compromissos e estratégias de enfrentamento à crise planetária. A aceleração da queima de combustíveis fósseis para atividades industriais, desde os últimos séculos, somados à remoção de florestas e emissões causadas por práticas da pecuária (como liberação de gás metano) têm causado uma liberação de CO2 e CH4 na atmosfera em quantidades que geram um aquecimento danoso às condições de vida humana. O aquecimento global se refere à intensificação e aceleração do efeito estufa devido a atividades humanas e ao aumento, principalmente, do uso de recursos fósseis para produção de energia, tais como carvão, petróleo e gás natural. 

O efeito estufa é um fenômeno natural para o equilíbrio da temperatura do Planeta, no entanto, o excedente de produção de Gases de Efeito Estufa (GEE) na atmosfera, em função de atividades antrópicas, tem levado a um desequilíbrio climático em função do aquecimento global. Eventos climáticos extremos são consequências identificadas pela ciência e já perceptíveis por todos nós. O aumento do nível do mar (em função do derretimento de calotas polares), secas extremas, incêndios e inundações, danos à saúde (impactos na qualidade do ar, da água e da alimentação) e diversas consequências para ecossistemas e para a biodiversidade ameaçam o futuro da vida humana. Em cinquenta anos, algumas regiões do Planeta serão inabitáveis pelo ser humano, enquanto outras desaparecerão em função do aumento do nível das águas, uma vez que os oceanos não param de aquecer. 

É neste contexto que países vêm se reunindo em Conferências internacionais e criando regimes internacionais para construírem consensos e negociações sobre os temas do meio ambiente e do clima, desde as últimas décadas. Em 2015 foi assinado o Tratado de Paris, no âmbito da COP21, que na verdade se refere a um acervo de acordos internacionais visando negociações sobre o problema do aquecimento do Planeta, a partir do entendimento de que só pode ocorrer avanços no combate às mudanças climáticas se houver uma articulação global.

Enquanto, sob a presidência negacionista norte americana, os Estados Unidos se retiraram do Tratado de Paris, a União Europeia (UE) tem revelado uma ambição em ser reconhecida como uma liderança climática internacional (Parker et al, 2017; Parker, Karlson, 2010). Apesar de atropelos e oscilações, desde 2015, os esforços da UE em espelhar no âmbito regional e internacional compromissos com as metas da COP21 são notados. 

Desde os compromissos assumidos no Tratado de Paris, países como o Brasil e Estados membros da UE, dentre muitos outros, concordaram em buscar soluções para limitar o aumento da temperatura média global em 2oC acima dos níveis pré-industriais (1850-1900), com esforços para manter o aquecimento abaixo de 1.5oC. Esses foram patamares limites mensurados por cientistas, uma vez que a vida humana (e planetária) está ameaçada, caso não seja freado o aquecimento global de forma drástica. Medidas nacionais de países que se comprometeram com o alcance de metas acordadas internacionalmente foram tomadas desde então e o uso de energia não renovável é um fator vital para a mudança deste quadro.

Direito ao desenvolvimento humano, à saúde, à alimentação, só serão garantidos no futuro muito próximo se a emergência climática for levada à sério. Neste contexto, no dia 28 de julho de 2022, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Resolução que reconhece o direito humano a um ambiente limpo, saudável e sustentável (Resolução 76/300). Resolução que já havia sido aprovada pelo Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas desde 2021. Nada mais coerente, considerando-se o nível de conhecimento científico que temos sobre a emergência climática, do que associar o direito a um meio ambiente saudável, livre de riscos ao Planeta, como necessário ao usufruto do direito à vida. 

Negociações realizadas no âmbito da gestão da presidência da Comissão Europeia de Jean-Claude Juncker (2014-2019) culminaram no estabelecimento de um Pacto Verde Europeu, que foi negociado como uma estratégia de implementação das medidas e prazos necessários ao cumprimento das metas acordadas na COP21. O Pacto, embora negociado pela presidência anterior, foi lançado como estratégia fundamental de gestão da nova presidência da Comissão, assumida por Ursula von der Leyen, em 1 de dezembro de 2019. 

O Pacto Europeu foi lançado em 11 de dezembro de 2019 e entrou em vigor em 2020, em conjunto com outras medidas que complementam as iniciativas necessárias para que a região de União dos 27 Estados-membros pudesse realizar avanços no cumprimento das metas assumidas. A UE se comprometeu com a redução de GEE em, pelo menos, 55%, até 2030 e, dentre outras metas intermediárias, o alcance de uma economia neutra em 2050. 

O Regulamento 2023/1115, mais conhecida como Lei do Clima da UE (ou EUDR) faz parte de um plano de ação mais amplo para combater o desmatamento e a degradação florestal, delineado pela primeira vez pela Comissão Europeia em uma Comunicação de 2019, posteriormente apresentado por um trio de medidas de implementação das metas assumidas no Tratado de Paris, além do Pacto Verde Europeu (2019), as estratégias de sua implementação: a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030 e o Programa Farm-to-Fork (F2F) (mais sobre os temas cf.: https://environment.ec.europa.eu/strategy/biodiversity-strategy-2030_en  e  https://food.ec.europa.eu/horizontal-topics/farm-fork-strategy_en).

Nos debates internacionais há críticas e suporte a algumas das medidas tomadas pela UE no caminho de sua transição energética. A complexidade de suas medidas, dos mecanismos de controle sobre implementação de metas nacionais pelos Estados membros e da taxonomia verde, que implica o reconhecimento de fontes de energia que contribuem efetivamente para a transição de uma economia poluente para uma economia circular, não são temas simples. Logo, aqueles interessados devem aprofundar-se nas medidas, estratégias e programas de investimento em energia renovável e nas iniciativas de transição do modelo de indústria e serviços na Europa. 

Dito isso, dados do Eurostat e da Agência Europeia do Ambiente nos trazem uma visão sobre alguns resultados já mensurados. Segundo resultados publicados, as emissões dos GEE diminuíram 31% na UE-27 até 2022, em comparação com os níveis de 1990, e em torno de mais 8% em 2023 (https://climate.ec.europa.eu/document/download/d0671350-37f2-4bc4-88e8-088d0508fb03_en). O ano de 2023 alcançou um recorde anual de redução de emissões (com exceção de 2020, ano impactado pela COVID-19), em plena guerra na Ucrânia, que não deixa de ser uma guerra na Europa. 

A redução observada nas emissões líquidas de GEE ocorreu após um fortalecimento gradual das políticas de redução de emissões de GEE nas últimas duas décadas. A redução geral pode ser amplamente atribuída a mudanças nos métodos de produção de energia, notadamente um declínio significativo no uso de carvão e o crescimento na adoção de fontes de energia renováveis. No entanto, as projeções atuais de emissões de GEE, conforme compromissos assumidos por Estados-Membros da UE, apontam uma expectativa de redução de 49% nas emissões líquidas até 2030, abaixo da meta de redução de 55% assumida pela Comissão. Assim, políticas e medidas mais ambiciosas estão sendo desenvolvidas em atualizações contínuas dos Planos Nacionais de Energia e Clima para colocar a UE no caminho rumo à neutralidade climática prometida para 2050.

O Regulamento da UE 2024/1991, também conhecido como Lei de Restauração da Natureza, publicado em 2024, visa recuperar ecossistemas degradados em todas as áreas terrestres e marítimas da região. Ele altera o Regulamento de 2022 (2022/869), que se concentrava nas infraestruturas energéticas transeuropeias. O novo regulamento de 2024 estabelece um quadro para os Estados-Membros implementarem medidas de alcance de pelo menos 20% de restauração das áreas terrestres e marítimas na região da UE até 2030 e todos os ecossistemas que necessitem de restauração até 2050.

Em 2 de julho de 2025, a UE aprovou (ainda pendente de aprovação no âmbito dos Estados membros) uma nova meta de redução de emissões em 90% até 2040, incluindo o uso de até 3% de créditos de carbono internacionais para o alcance deste novo objetivo. Elogiada por uns e criticada por outros, essa medida traz uma perspectiva de flexibilidade para o uso de créditos de carbono, limitada a setores da indústria que exigem um processo maior de adaptação e investimento tecnológico, logo um prazo maior para a total descarbonização. 

A literatura sobre a busca de liderança internacional no âmbito das COPs tem revelado uma competição entre UE e China que pode ser vista como virtuosa: duas potências comerciais que cooperam entre si e disputam ao mesmo tempo nos avanços de sua liderança climática (Parker et al, 2017; Parker, Karlson, 2010). No campo do enfrentamento às mudanças climáticas, da transição energética e da liderança exercida em negociações sobre meio ambiente e clima, se pode ganhar com a disputa de protagonismos entre UE ou China na busca de diminuição de emissões de GEE. No entanto, se o modelo de uma economia de mercado que depende do crescimento exponencial de consumo não mudar, e se o setor agrícola não realizar medidas de diminuição de emissões de gás metano e desmatamento – nenhum milagre salvará a humanidade. 

O que muitas vezes é mal compreendido é que o Planeta não acabará, esse continuará a existir – como tem existido há 4,54 bilhões de anos. No entanto, as condições da vida humana, tal como aterrada neste Mundo desde cerca de 300 mil anos, é que se encontra claramente ameaçada. 

Referências

PARKER, C. F. et al. Assessing the European Union’s global climate change leadership: from Copenhagen to the Paris Agreement. Journal of European Integration 39 (2): 239-252, 2017. 

PARKER, C. F.; KARLSSON, C.. Climate change and the European Union’s leadership moment: an inconvenient truth? JCMS 48(4): 923–943, 2010.