Barreiras no Desenvolvimento de Vacinas

Foto: Spencer Davis (Unsplash)

A vacinação revolucionou a saúde pública mundial e transformou a realidade epidemiológica de diversas regiões, mas essa tecnologia ainda enfrenta entraves significativos. O processo de desenvolvimento de imunizantes esbarra em desafios científicos, econômicos e sociais; obstáculos que podem ser superados com investimento e cooperação global.

O desenvolvimento de vacinas e a implementação de campanhas de imunização representam uma das maiores conquistas da saúde pública global. Ao proporcionar elevadas taxas de proteção contra doenças infecciosas, esses imunizantes foram responsáveis por salvar milhões de vidas e transformar realidades epidemiológicas em todo o mundo.

Em 2018, a World Health Organization (WHO) estimou que cerca de 3 milhões de vidas são salvas por ano em função das campanhas de vacinação, resultando na drástica redução da mortalidade infantil em escala global.

A emergência da pandemia de COVID-19, declarada em 2019, revolucionou a vacinologia ao evidenciar a necessidade do desenvolvimento de imunizantes mais sofisticados e vantajosos. A emergência sanitária global acelerou o desenvolvimento de plataformas inovadoras,como as vacinas de RNA mensageiro (mRNA), oferecendo maior eficácia ao mimetizar a patogenicidade natural de uma infecção viral e favorecer a produção de anticorpos específicos atrelados aos antígenos do patógeno.

Apesar dos avanços, o campo da vacinologia ainda enfrenta obstáculos consideráveis. O acesso desigual às vacinas e a falta de investimentos estruturais continuam limitando os benefícios dessa tecnologia para milhões de pessoas, especialmente em países de baixa e média renda.

Em artigo publicado na revista Nature, pesquisadores alertam para as lacunas existentes no desenvolvimento de vacinas e classificam as doenças negligenciadas em duas categorias principais: aquelas para as quais já existem vacinas, mas cujo acesso é falho; e aquelas que carecem de imunizantes, devido a desafios científicos, econômicos ou logísticos.

A dificuldade de acesso às vacinas muitas vezes está atrelada à precariedade de infraestrutura no âmbito da saúde, seja pela carência de recursos econômicos para compra ou pela dificuldade de entregar essas vacinas à população. Além disso, a maioria das vacinas necessita de condições específicas de armazenamento e transporte.

No plano científico, o cenário também é desafiador. Patógenos altamente diversos e com variações genéticas entre diferentes hospedeiros dificultam a identificação de um antígeno alvo universal para a imunização. Ademais, os estudos clínicos realizados na validação das vacinas são geograficamente limitados e podem favorecer a criação de vacinas com maior eficácia em populações determinadas.

Outro entrave recorrente é a falta de interesse econômico no desenvolvimento de vacinas voltadas a algumas doenças caracterizadas por acometer áreas geográficas restritas ou ocorrer em surtos esporádicos.

Para enfrentar esses gargalos, os autores Jennifer Heller, Tania Holt, Leah Kaplow, Matthews Mmopi, Elizabeth Rowland e Adam Sabow propõem quatro ações estratégicas fundamentais a fim de garantir a saúde pública e a proteção global.

A primeira, é o aumento e direcionamento de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D ou Research and Development – R&D) para a produção de vacinas contra doenças negligenciadas, mediante ao incentivo de pesquisadores e colaborações entre diferentes setores sociais.

A segunda ação envolve a concentração de recursos na elaboração de novas tecnologias voltadas à imunização, pois as inovações tecnológicas em saúde mostraram-se eficazes em superar os desafios e necessidades de patologias anteriores, como é o caso da plataforma de mRNA para a COVID-19.

A terceira, é priorizar o investimento de recursos R&D em locais majoritariamente afetados por enfermidades em fase de estudo e cuja imunização vem sendo testada, é a terceira ação, caracterizada pela colaboração entre agentes inovadores, gestores e autoridades de saúde locais para subjugar barreiras específicas desse processo.

Por fim, a quarta medida defende a adoção de um enfoque local na produção de imunizantes por meio da parceria entre governos, instituições acadêmicas e setores da saúde com objetivo de priorizar investimentos no desenvolvimento de vacinas compatíveis com demandas regionais.

Superar esses desafios é essencial para garantir a equidade na saúde global e preservar milhões de vidas. A história recente mostrou que, com investimento e cooperação, avanços extraordinários são possíveis. A próxima etapa é garantir que esses benefícios alcancem a todos.

1. Institute of Medicine; National Institute of Allergy and Infectious Diseases; World Health Organization. Stages of Vaccine Development. In: Vaccine Development: an overview. Washington (DC): National Academies Press (US), 2012. Disponível em: NCBI Bookshelf, capítulo 5. Acesso em: 30 jul. 2025.

2. Pollard, A. J. ; Bijker, E. M. A guide to vaccinology: from basic principles to new developments. Nature Reviews Immunology, v. 21, p. 83–100, dez. 2020. doi:10.1038/s41577-020-00479-7. Errata publicada em: Nat. Rev. Immunol., v. 21, p. 129, jan. 2021.

3. Unmet needs in vaccine development. Drug Discovery Today, v. ? (?), 2025. Artigo disponível em Nature, examina lacunas entre o fardo de doenças infecciosas e a disponibilidade de vacinas; publicado online cerca de duas semanas antes de jul. 2025.

4. Vaccine Development – an overview. In: Textbook of SARS‑CoV‑2 and COVID‑19, 2024. ScienceDirect (Elsevier).

5. Rauch, S. ; Jasny, K. E. ; Schmidt, B. ; Petsch, B. New vaccine technologies to combat outbreak situations. Nature Reviews Drug Discovery, v. 17, p. 261–279, 2018. Citado em Pollard & Bijker (2020) como exemplo de tecnologia emergente, DOI: 10.1038/nrd.2017.243.