Legislação é humanista, mas práticas sociais ainda têm influência machista, diz professora

Legislação é humanista, mas práticas sociais ainda têm influência machista, diz professora

O ano de 2022 tem sido marcado por uma série de violações aos direitos das mulheres no Brasil, direitos esses garantidos pela própria legislação brasileira. O USP Analisa segue abordando esse tema e exibe nesta sexta (23) a segunda parte da entrevista sobre o tema com a professora da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP e coordenadora do projeto Reescrevendo Decisões Judiciais em Perspectivas Feministas, Fabiana Severi. 

Ainda dentro dos direitos reprodutivos da mulher, Fabiana comenta a possibilidade de entrega voluntária da criança para adoção quando há uma gravidez indesejada e a dificuldade que muitas mulheres encontram para conseguir efetivar esse procedimento, somada ao julgamento que elas sofrem da sociedade por tomar essa decisão. 

“Uma sociedade machista, sexista, é marcada por um hiper-julgamento da mulher em qualquer decisão que ela tome, porque a lógica é ela não tomar decisão, não ser um sujeito autônomo. Se a mulher decide pelo aborto, ela é julgada, criminalizada. Se ela decide seguir com a gestação e depois fazer a entrega voluntária, também ela é julgada, também há uma série de entraves. No final das contas, a gente tem uma legislação que, digamos, é humanista, mas uma coisa é mudar a lei e outra coisa é mudar as práticas sociais. Esse é o desafio maior”, explica ela.

A garantia de direitos às mulheres passa também pelas políticas públicas que permitem o oferecimento de uma série de serviços a quem passa por uma situação de violência. A professora Fabiana explica que a Lei Maria da Penha, principal referência de legislação no combate à violência contra as mulheres, está muito mais relacionada a essa garantia de serviços que ao encarceramento do agressor, propriamente. Porém, a redução do orçamento federal destinado a isso está colocando em risco a vida delas.

“Muitas vezes, o que a mulher quer do sistema de Justiça não é o encarceramento do companheiro ou ex-companheiro, é uma medida protetiva de afastamento dele do lar, para que ela pare de sofrer violência, ou abrigamento, já que às vezes, em casos de ameaças muito graves, ela não tem para onde ir. Ela precisa às vezes de uma troca de vaga de escola para filhos e filhas por conta do deslocamento, precisa de apoio psicossocial, precisa obter um emprego em outro lugar, enfim, coisas que envolvem serviços e boa parte desses serviços, pelo desenho da Lei Maria da Penha, era gerida com o orçamento do Governo Federal. Quando você tem essa diminuição do orçamento – e em 2018, 2019 e 2020 foi uma diminuição brusca -, boa parte desses serviços não consegue se manter. O que vai acontecer com a mulher que não tem abrigamento? Ela continua dentro do espaço doméstico com ameaça do seu agressor e risco de morte”, alerta Fabiana.

O USP Analisa é quinzenal e leva ao ar nesta sexta, às 16h45, um pequeno trecho da entrevista, que pode ser acessada na íntegra nas plataformas de podcast Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts, Deezer e Amazon Music.

O programa é uma produção conjunta do Instituto de Estudos Avançados Polo Ribeirão Preto (IEA-RP) da USP e da Rádio USP Ribeirão Preto. Para saber mais novidades sobre o USP Analisa e outras atividades do IEA-RP, inscreva-se em nosso canal no Telegram.

VOCÊ PODE GOSTAR ...