SEPULTAMENTO 9 – LAPA DO SANTO
Localização Espacial e Estratigráfica
O Sepultamento 9 estava plenamente contido dentro do nível 11 da quadra G12. A Figura 1 mostra os CEQs correspondentes aos níveis que serão discutidos a seguir. As cotas de abertura da quadra e desses níveis estão na Tabela 1.
Com base nas informações disponíveis no CEQ do nível 11, determina-se que a cota do topo e a da base desse sepultamento são, respectivamente z=-1,156 e z=-1,234. Entretanto, no CEQ do nível 10 pode-se observar que exatamente sobre a região em que apareceria o sepultamento no nível 11 foi possível discernir uma mancha com um sedimento ligeiramente mais duro do que o sedimento do entorno (indicado em azul na Figura 1). Caso esse sedimento tenha feito parte da cova, o que parece ser bastante provável, isso significa que o Sepultamento 9 já estava presente no nível 10 e que, portanto, a cota do topo de sua cova deve ser um pouco mais alta do que a indicada pelo CEQ do nível 11. Ainda assim, já que não há informação a respeito do topo dessa mancha de sedimento, as duas cotas supracitadas (z=-1,156 e z=-1,234) serão adotadas para o topo e a base da cova.
A partir dos CEQs é possível observar que não havia nenhum bloco recobrindo esse sepultamento.
Tabela 1. Cotas verticais iniciais (z). | |||||
Quadra | Nível | NW | NE | SE | SW |
G12 | 1 | -0,406 | -0,328 | -0,174 | -0,218 |
G12 | 10 | -0,980 | -0,963 | -0,889 | -0,913 |
G12 | 11 | -1,066 | -1,039 | -0,983 | -1,008 |
G12 | 12 | -1,263 | -1,203 | -1,069 | -1,106 |
Figura 1 – Lapa do Santo. Sepultamento 9. Croqui de escavação de quadra. Em cinza, os blocos de calcário acompanhados das suas cotas de topo e base. Em azul, sedimento distinto que foi observado logo acima do sepultamento. Em vermelho, região onde foram encontrados os ossos do Sepultamento 9. O ponto preto indica amostra de carvão coletada.
Descrição do Enterramento
Esse sepultamento é composto por um único indivíduo subadulto no qual estavam presentes o crânio, a mandíbula, poucos fragmentos de costelas e partes da bacia. O neurocrânio foi encontrado repousando sobre seu lado esquerdo, com a face ligeiramente inclinada para baixo e voltada para o norte (Figura 2). O neurocrânio estava completamente preenchido por sedimento (Figura 2). Os demais ossos estavam próximos ao neurocrânio. Os ossos da bacia, o temporal e a mandíbula estavam unidos por concreção. Ainda que apenas o neurocrânio tenha se preservado integralmente (Figura 3), os ossos do maxilar (Figura 4a), os da base do crânio (Figura 4b), e a mandíbula (Figura 4c e Figura 4d) também estavam presentes. Os alvéolos da mandíbula e do maxilar estavam vazios, com exceção dos primeiros molares permanentes e de alguns germes de dentes permanentes.
Modo de enterramento
A presença dos ossos do basicrânio, da mandíbula e, especialmente, de alguns germes de dentes permanentes sugere que durante o processo de exumação decorrente da secundarização os tecidos moles ainda estavam presentes em algum grau. Caso ele tivesse sido desenterrado com fins de secundarização após a total esqueletização, ossos tão pequenos como as partes não fusionadas do occipital, a mandíbula e os germes dos dentes permanentes teriam se perdido, o que não ocorreu. Além disso, dois pequenos fragmentos de costela foram recuperados, reforçando a ideia de que esse crânio não foi desenterrado.
Os ílios esquerdo e direito de um indivíduo subadulto foram encontrados próximos ao neurocrânio, possivelmente dentro dele (Figura 6). O tamanho da pélvis e do crânio torna provável que tais ossos e o crânio pertençam a um mesmo indivíduo. A ausência dos demais ossos desse indivíduo sugere que a preparação do corpo, neste caso a separação da cabeça e a possível introdução dos ossos da bacia dentro da mesma, ocorreu em local distinto ao do enterramento. Além disso, o crânio como um todo apresenta coloração avermelhada e em algumas regiões havia uma fina camada de pó vermelho recobrindo o osso, resultado da aplicação de ocre vermelho (Figura 5). A ausência dos dentes de leite pode ser fortuita mas, tendo-se em vista a ocorrência de outros casos no sítio em que os dentes foram intencionalmente removidos dos alvéolos (ex. Sepultamento 14), tal interpretação será estendida ao Sepultamento 9.
No diário de campo existe a seguinte indicação sobre possíveis associações desse sepultamento: “Em julho de 2002, quando da escavação da quadra G13, evidenciamos uma sequência de estruturas semicirculares e circulares de blocos de calcário no canto SE da quadra G13, entre as cotas -0,500 e -0,700 (níveis 3 e 4), que na época não nos fez nenhum sentido, pois não encontramos nada associado a estas estruturas. Com a evidenciação da conta de colar em maio último próximo a cota -0,900 e o Sepultamento 9 pode ser que as estruturas de bloco evidenciadas na Quadra G13 e conta de colares da quadra G12 estejam associadas ao Sepultamento 9”.
A Figura 7 apresenta a estrutura formada por 7 diáfises cortadas e dentes. Possivelmente, essa é a estrutura de “conta de colar” descrita no diário. As diáfises cortadas são virtualmente idênticas àquela encontrada junto ao Sepultamento 23. Essa “estrutura” foi coletada sob o número 2253. A identificação do osso a que pertenciam a diáfise se revelou uma tarefa bastante difícil. Possivelmente, trata-se da ulna de indivíduo adulto, mas essa é uma questão que permanece em aberto. Os dentes são compatíveis com um único indivíduo com cerca de 5 anos de idade[1].
Figura 2 – Lapa do Santo. Sepultamento 9. Fotos de campo. a) crânio antes de ser completamente exposto; b) vista da parte basal do crânio; c) vista da parte superior do crânio; d) crânio logo após ter sido exumado, reparar no preenchimento por sedimento.
Figura 3 – Lapa do Santo. Sepultamento 9. a) Vista frontal; b) lateral esquerda; c) lateral direita; d) superior do crânio.
Figura 4 – Lapa do Santo. Sepultamento 9. a) Maxilar, os alvéolos estavam vazios e os dentes correspondentes não foram encontrados; b) ossos não fusionados do basicrânio; c) vista superior da mandíbula esquerda; d) vista lingual e labial da mandíbula direita.
Figura 5 – Lapa do Santo. Sepultamento 9. Região parietal do crânio. O crânio como um todo apresenta coloração avermelhada e em algumas regiões havia uma fina camada de pó vermelho recobrindo o osso.
Figura 7 – Lapa do Santo. Sepultamento 9. Essa montagem de diáfises cortadas e dentes foi encontrado no nível 10 da quadra G12 (PN-2253) e, muito provavelmente, está associado ao Sepultamento 9. A identificação dos dentes, feita com o auxílio de Rodrigo Elias de Oliveira, segue nomenclatura internacional sendo RM1 o primeiro molar superior direito permanente, Rdm1 o primeiro molar superior direito decíduo, Ldm1 o primeiro molar superior esquerdo decíduo, Rdm1 o primeiro molar inferior direito decíduo. As setas vermelhas apontam um dente que foi dividido ao meio e cada uma das metades estava localizada numa parte distinta da estrutura. Esse dente é um primeiro molar permanente, não tendo sido possível uma identificação mais precisa.
[1] A identificação dos dentes foi auxiliada por Rodrigo Elias.
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