SEPULTAMENTOS – LAPA DO SANTO
Foram exumados 26 sepultamentos humanos da Lapa do Santo entre 2001 e 2009 no âmbito das escavações sob coordenação do Prof. Walter Neves. Do projeto coordenado pelo Prof. André Strauss e Dr. Rodrigo Elias de Oliveira, que teve início em 2011, foram exumados até o momento mais 14 sepultamentos. Os esqueletos exumados desde 2011 ainda não foram formalmente descritos em publicações científicas e seguem no processo de curadoria. Com relação aos sepultamentos exumados entre 2001 e 2009 todos pertencem ao período mais antigo de ocupação do sítio tendo sido datados entre ca. 10.000 e 8.000 anos atrás. Os sepultamentos da Lapa do Santo registram uma ampla diversidade de práticas funerárias incluindo o enterro direto simples, cremação, decapitação, remoção de partes anatômicas, enterro secundário de multíplos indivíduos, descarnamento e amputação de membros anatômicos.
Os 26 sepultamentos humanos da Lapa do Santo foram classificados em seis padrões funerários com base em sua cronologia e feições compartilhadas.
O Padrão Funerário da Lapa do Santo 1 (PFLS-1) está datado entre 9.700 e 10.600 anos atrás e é caracterizado por enterros primários sem sinais de manipulação do corpo, incluindo os sepultamentos 1 e 27.
O Padrão Funerário da Lapa do Santo 2 (PFLS-2) está datado entre 9.400 e 9.600 anos atrás e pode ser subdividido em três categorias: PFLS-2a (sepultamentos 21 e 26), PFLS-2b (sepultamentos 9, 14, 17, 18 e 23) e PFLS-2c (ossos isolados). O PFLS-2a é caracterizado por esqueletos parciais mas plenamente articulados com presença de marcas de descarnamento. O sepultamento 21 teve as diáfises de ambas tíbias e fíbulas removidas por corte enquanto os tecidos moles ainda estavam presentes. O sepultamento 26 é um caso de decapitação com as seis primeiras vértebras cervicais em posição anatômica e osso hióide ausente. Sobre o crânio estavam presentes as duas mãos que foram amputadas na altura do pulso. Análises das marcas de corte por microscopia eletrônica e confocal indicam que o agente cortante muito possivelmente eram lascas de pedra. O PFLS-2b é caracterizado por covas preenchidas com os ossos plenamente desarticuladas de até cinco indivíduos apresentando uma forte seleção de partes anatômicas. Alguns ossos tinham evidência de exposição ao fogo, aplicação de pigmento vermelho, descarnamento, corte e remoção intencional dos dentes. Os sepultamentos 14, 17 e 18 eram compostos por um fardo de ossos longos de um ou dois indivíduos depositado junto ao crânio e/ou mandíbula individualizados de um outro indivíduo. Fardos compostos por ossos longos de sub-adultos estavam associados com crânios de adultos, e vice-versa. Os ossos longos dos fardos comumente eram cortados de forma a individualizar a diáfise das extremidades proximais e distais. Marcas negras indicativas de queima limitadas a porção anterior da margem alveolar do maxilar indicam possível exposição ao fogo com presença de tecidos moles. A ocorrência de tais marcas em associação com sinais de descarnamento sugerem que no PFLS-2 alguma forma de canibalismo pode ter ocorrido. Nos sepultamentos 17 e 18 todos os dentes foram intencionalmente removidos e no caso desse último ambos processos coronóides da mandíbula foram perfurados. Pigmento vermelho (ocre) foi amplamente aplicado nos ossos dos sepultamentos 14 e 18. O sepultamento 23 é composto pela calota craniana de um indivíduo subadulto dentro da qual foram depositados 54 dentes permanentes e 30 dentes decíduos. Dentre esses dentes, alguns pertenciam ao crânio do sepultamento 17. O Sepultamento 9 era constituído por um crânio isolado de uma criança. Os dentes foram removidos e uma “montagem” de ossos e dentes foi encontrada a cerca de 15 cm do crânio. O PFLS-2c é caracterizado por ossos isolados que apresentam sinais de corte e queima e que não foram encontrados como parte de sepultamentos formais. Em alguns casos apresentam marcas de roedores, indicando que possivelmente ficaram expostos em superfície antes de terem sido enterrados.
O Padrão Funerário da Lapa do Santo 4 (PFLS-4) foi definido com base em apenas dois sepultamentos (seps. 2 e 3) que apresentavam um único esqueletos articulados cujos ossos dos membros estavam ausentes. No caso do Sepultamento 2, os ossos dos membros superiores estavam ausentes e, no caso do Sepultamento 3, tanto os ossos dos membros superiores como dos membros inferiores estavam ausentes. Em ambos os casos, a ausência dos membros não levou à presença de marcas de corte e estudos futuros devem investigar a possibilidade de uma origem tafonômica para essa ausência. Ambos os esqueletos pertencem a indivíduos adultos, sendo que o Sepultamento 2 foi estimado como do sexo feminino e o Sepultamento 3 foi estimado como do sexo masculino.
O Padrão Funerário da Lapa do Santo 5 (PFLS-5) foi definido com base no Sepultamento 5 no qual os ossos de um único indivíduo adulto e do sexo feminino apresentando uma profusão de marcas de descarnamento foram organizados na forma de um feixe. O Padrão Funerário da Lapa do Santo 6 (PFLS-6) foi definico a partir do Sepultamento 8 no qual foi observada a cremação total. Os ossos calcinados de um único indivíduo adulto e do sexo feminino (devido ao avançado grau de calcinação essa estimativa de sexo deve ser vista com cuidado) preenchiam uma cova circular. Dentro dela não foram encontrados carvões, indicando que a queima ocorreu em outra localidade. Trata-se de um caso muito raro na região de Lagoa Santa onde praticamente inexistem esqueletos totalmente cremados.
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