1. Identificar os mecanismos moleculares que reduzem a citotoxicidade de células imunes em neoplasias mieloides
O foco da pesquisa é a variabilidade molecular das células citotóxicas e seus mecanismos de evasão imunológica na fisiopatologia das neoplasias mieloides. Pretende-se realizar mapeamento transcricional e imunofenotípico de células imunes presentes em modelos de neoplasias mieloproliferativas (NMP) e leucemia mieloide aguda (LMA) por meio de sequenciamento de RNA (single-cell RNA-seq) e citometria de fluxo multiparamétrica de pacientes com neoplasias mieloides e células primárias de modelos murinos leucêmicos quiméricos. Esperamos que a caracterização robusta das células imunes inatas revele as vias de sinalização envolvidas na interação NK:LIC e contribua para o desenvolvimento de estratégias capazes de restabelecer o efeito imune antitumoral em neoplasias mieloides.
2. Avaliar o impacto da citotoxicidade imune na resposta ao tratamento de neoplasias mieloides
Será realizada a correlação da frequência, maturação e função NK com o estado de doença residual mensurável (DRM) em pacientes com leucemia mieloide crônica (LMC) tratados com inibidores de tirosina quinase (ITQ) e pacientes com LMA submetidos à indução/consolidação. Na LMC, embora a vigilância imunológica mediada por NK tenha sido relatada como preditor de sucesso da remissão livre de tratamento, não é conhecida a relação entre a cinética de quantificação do BCR::ABL1 e a caracterização fenotípica e funcional destas células. Portanto, propomos investigar perfis citotóxicos diferenciais de pacientes com diferentes respostas aos ITQ. Na LMA, temos dados preliminares mostrando frequência reduzida de células NK citotóxicas, sendo que a correlação entre ativação, inibição e função de células imunes citotóxicas e a estratificação de risco genética bem como com a presença de DRM será avaliada.
3. Identificar mecanismos funcionais e alvos do efeito do microambiente leucêmico que levam à disfunção imune nas neoplasias mieloides
A compreensão das disfunções das subpopulações citotóxicas nas neoplasias mieloides requer investigar se o ambiente leucêmico impede diretamente a maturação das células imunes citotóxicas, resultando em diminuição da atividade antileucêmica. Essa hipótese é apoiada por dados preliminares gerados pelo grupo de Robert Welner (UAB, EUA) em sua análise do perfil de expressão gênica proveniente de dados públicos (GSE109125) para comparar a assinatura IL-6/STAT3 entre diferentes estágios de maturação NK em células humanas e murinas. Curiosamente, verificou-se que a assinatura da transcrição de IL6/STAT3 é enriquecida no subconjunto NK produtor de citocinas imaturas em ambas as espécies, sugerindo que a ativação desse eixo na leucemia pode conduzir ao desvio funcional. Em concordância, o conjunto de dados de RNA-seq de célula única (GSE116256) na medula óssea de pacientes com LMA e voluntários saudáveis mostrou regulação negativa de genes associados à maturação e citotoxicidade das células NK. Por meio da geração de modelos leucêmicos quiméricos de LMC, NMP e LMA (Bcr:Abl1, Jak2V617F e Flt-3/Tet2, respectivamente), ou seja, modelos que preservem parcialmente o sistema imune dos receptores de células leucêmicas, observaremos as modificações de células citotóxicas T e NK após a exposição à leucemia por meio de caracterização fenotípica de frequência, maturação, receptores, citotoxicidade bem como citocinas do meio leucêmico (como IL-1β, IL-6, IL-10, TNFα). De posse desses dados, e, em conjunto com as vias de sinalização identificadas por análises de célula única, a identificação de potenciais moléculas capazes de neutralizar o efeito prejudicial sobre o microambiente consiste em um objetivo sequencial.
A leucemia mieloide crônica (LMC) é uma neoplasia mieloproliferativa tratada atualmente com inibidores de tirosinoquinase (ITQ), drogas de alto custo fornecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A introdução dos ITQs mudou a história natural da doença, diminuindo drasticamente as taxas de transformação para fase blástica, aumentando a sobrevida dos pacientes, de uma taxa histórica de 10-20% para acima de 80%, resultando numa expectativa de vida atual semelhante à da população normal. Por outro lado, o consequente aumento da prevalência da LMC gera um aumento progressivo do impacto econômico sobre o SUS. Além disso, o uso prolongado dos ITQ está associado a eventos adversos crônicos associados a redução da qualidade de vida destes pacientes. Estudos recentes mostram que o tratamento com ITQ pode ser descontinuado em uma parcela significativa de pacientes que obtêm resposta molecular profunda sustentada, o que representa uma oportunidade para redução da toxicidade a longo prazo e do impacto econômico deste tratamento para o SUS. Entretanto, a remissão livre de tratamento a longo prazo ainda é uma realidade para uma minoria dos pacientes, e não há até o momento definição clara de biomarcadores que permitam predizer a chance de manutenção ou perda da resposta molecular após a suspensão do ITQ. Assim, esta proposta consiste em estudo de iniciativa dos investigadores, multicêntrico, aberto, prospectivo, não randomizado, de único braço para avaliação da efetividade e eficiência de um protocolo de descontinuação de ITQs no SUS, por meio da análise de: (1) varáveis clínicas como tempo de remissão livre de terapia, cinética da resposta molecular do BCR-ABL1, segurança desta estratégia, qualidade de vida e custo-efetividade para os participantes bem como (2) da avaliação de biomarcadores possivelmente associados à manutenção da resposta molecular maior sustentada tais como expressão de microRNAs e fenótipo de células citotóxicas T e Natural Killer (NK).