Banco Mundial: só conhecimento gera desenvolvimento
Após o Fim da Guerra Fria, o Diretor-adjunto da equipe de planejamento de políticas do Departamento de Estado dos EUA, Francis Fukuyama, exortou aos sete ventos que havia chegado o “Fim da História”.
Ele vislumbrou no colapso da União Soviética não apenas o fim da guerra fria entre o Bem e o Mal mas a vitória do capitalismo contra o comunismo, uma vitória triunfal dos EUA bem como de seu modo de compreender e organizar o mundo.
Essa perspectiva estava atrelada a uma outra forma de compreender o período, denominada pelo pesquisador sênior do “Insitute for International Economics” em Washington, John Williamson, comoo “Consenso de Washington”.
Embora muito mais humilde que Fukuyama, Williamson compreendia que era necessário estabelecer um conjunto básico de requisitos, uma agenda mínima de responsabilidades associadas ao livre funcionamento das forças de mercado. Para o chamado “Consenso de Washington”, é a construção da agenda comum que pode superar as crises geradas por colapsos sociais e econômicos que tradicionalmente, em especial na América Latina, levaram ao uso do aparato militar para orientar o modelo econômico para o pagamento da dívida externa ou como forma de constrangimento financeiro ao Estado devedor.
Havia naquele consenso um cenário de liberalismo sustentável e sustentado pelas melhores práticas alinhadas ao que na economia política se conhece como o modelo ortodoxo. Ideias como equilíbrio orçamentário de longo prazo, prioridade na contenção da inflação, liberalização da taxa de câmbio e limites ao endividamento público tornaram-se as regras de ouro da boa governança dos países alinhados ao “Consenso de Washington”.
Novos Consensos
Muitos anos de passaram desde aquele consenso liberal e no sistema de organismos financeiros multilaterais surgiram ao longo dos últimos anos inúmeras fissuras, heterodoxias (inclusive no campo das políticas cambiais e de liberalização dos fluxos de capitais de curto prazo), ampliação da dimensão institucional da economia política para dar à própria macroeconomia a devida dimensão simbólica ou de “soft power”.
O mais recente vislumbre de uma nova onda de revisão conceitual e formulação de políticas públicas, eventualmente de novos “Consensos de Washington”, tem seu epicentro na atuação do mais novo Economista-Chefe do Banco Mundial, Paul Romer.
O desafio é erradicar a pobreza até 2030, mas suas iniciativas dizem respeito a mudança na linguagem que o Banco utiliza para fazer chegar seus projetos à sociedade. Sim, o Banco Mundial reconhece que sem a comunicação adequada, sem o capital intelectual, social e cultural “corretos”, alinhados ou compreendidos ao ponto do engajamento pelos cidadãos, os modelos que acertam apenas na econometria podem dar, literalmente, com os burros n´água.
Alfabetização Financeira gera inclusão, empreendedorismo e criatividade
Para Romer a linguagem do Banco mudou drasticamente e suas publicações acabaram por abranger apenas os economistas ou estudiosos, não contemplando outros setores da sociedade.
Afirmou ainda que a instituição utilizou muita matemática, econometria, tanto para convencer como para enganar e que seria melhor investir em pesquisas de cunho prático, relevância social e sentido comum.
O desafio lançado pelo principal economista do Banco Mundial é inédito: para Romer, é preciso reinventar todo o sistema universitário para criar os modelos de desenvolvimento. Ou seja, definitivamente os rumos do desenvolvimento dependem da inteligência coletiva das nações e nesse contexto as universidades poderão desempenhar um papel importante se, e somente se, tanto o Banco Mundial, quanto a academia e todos os envolvidos em projetos de desenvolvimento alcançarem as competências comunicacionais e criativas adequadas.
Desafios para destravar os nós do desenvolvimento sempre foram lançados a governantes, políticos, lideranças sociais populares e mesmo (ou sobretudo, nos últimos anos) às castas tecnocráticas que suportam nas costas o difícil desafio de manter viva a esfera pública global. O Banco Mundial talvez tenha finalmente assumido a lição de tantas décadas de financiamento ao desenvolvimento: nem Estado, nem mercado, o que o desenvolvimento na era do conhecimento requer é uma reinvenção da governança a partir do conhecimento, da inteligência e da síntese criativa a partir das nuvens de dados que se multiplicam além de todas as fronteiras, numa globalização que apenas se acentua a cada crise cíclica. Reinvenção a partir do conhecimento, da informação e da comunicação: esse é um desafio para as universidades.
Romer pede um novo sistema universitário para os países em desenvolvimento, afirmando que esses países “deveriam copiar o sistema anterior à Segunda Guerra Mundial”. Propõe criar uma Universidade do Banco Mundial que pudesse ser replicada nos países emergentes, apontando como uma saída viável para o desenvolvimento endógeno.
O terceiro ponto, não menos importante: o Banco Mundial crê que uma saída possível para o desenvolvimento é a superação da exclusão financeira, em outras palavras, o desenvolvimento depende da reinvenção midiática e informacional dos sistemas de crédito e investimento. A era do conhecimento exige uma “FinTech” adaptada aos desafios do desenvolvimento, da inclusão social e da emancipação digital.
É certo que o Banco Mundial possui um enormidade de obstáculos a enfrentar e mais erros a cometer. No entanto, a iniciativa da nova equipe que lidera a formulação política estrutural do Banco aponta para novos caminhos que passam pela alfabetização midiática e informacional, sobretudo a literacia financeira como condição de vida, aliando tecnologia, empreendedorismo e inovação.
Saiba Mais
https://paulromer.net/
http://oglobo.globo.com/economia/paul-romer-sera-novo-economista-chefe-do-banco-mundial-19734715
https://paulromer.net/about-paul-romer/
http://www.bancomundial.org/
http://www.worldbank.org/pt/country/brazil
Gilson Schwartz, Professor Livre Docente de Economia do Audiovisual do Departamento de Cinema, Rádio e TV da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Mateus de Sá Barreto Barros, Doutorando do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar Diversitas, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo