Projeto – Plasticidade comportamental e regulação social em macacos-prego

 

Plasticidade fenotípica é um conceito que se refere à capacidade de um mesmo genótipo produzir diferentes fenótipos, comportamentais, fisiológicos ou morfológicos, em resposta a diferentes contextos ambientais (contexto físico e social), mantendo seu sucesso reprodutivo (DeWitt et al., 1998; Foster, 2013). Dentre os primatas não humanos, os macacos-prego (gênero Sapajus) constituem modelo ideal para investigar hipóteses sobre plasticidade comportamental (MacKinnon, 2013). Plasticidade comportamental também está relacionada a variáveis do ambiente social e à variação individual (temperamento e personalidade). Estudos recentes vêm avaliando a variabilidade dos padrões comportamentais dos indivíduos em diferentes modelos animais (Fernandes- Bolaños, 2020; Fukimoto et al., 2019). No entanto, ainda pouco se sabe sobre o desenvolvimento do temperamento e sobre seu papel na regulação de mecanismos sociais.

O objetivo deste projeto é investigar a plasticidade comportamental por meio da análise de duas dimensões de reatividade emocional: ativação positiva e ativação negativa. Além disso, iremos avaliar mecanismos de regulação social, tomando como foco os comportamentos de lipsmacking e as oportunidades de contato visual entre macacos-prego infantes e adultos. Testaremos as seguintes hipóteses: (i) é possível identificar padrões de temperamento em infantes de macaco-prego; (ii) esses padrões não estão cristalizados ao nascimento, mas passam por um processo de desenvolvimento ao longo dos 36 primeiros meses de vida; (iii) o temperamento é influenciado por característica ecológicas e sociodemográficas, havendo, então, diferenças entre indivíduos de populações distintas (i.e. Rebio Una e FBV). Vídeos foram coletados durante os 36 primeiros meses de vida de cada filhote, semanalmente, do início da manhã ao final da tarde, pelo esforço de diversos pesquisadores de 2015 a 2018. Cada indivíduo (infante) foi gravado desde o nascimento, possibilitando, então, a precisão quanto à idade de cada um dos infantes. Cerca de 12 indivíduos da população da FBV e da Rebio Una foram filmados duas vezes por semana (uma vez no período da manhã e outra vez no período da tarde) pela técnica de amostragem animal focal. Essa metodologia possibilita o acesso a informações mais refinadas do comportamento desses infantes e o acompanhamento de seu desenvolvimento

Estudo 1 – Temperamento. O temperamento dos animais será avaliado em termos de reatividade emocional, levando em consideração as duas grandes dimensões da responsividade afetiva: ativação positiva e ativação negativa, que não são dimensões opostas, são independentes. Avaliaremos as respostas dos indivíduos a diversos estímulos, analisando seu comportamento agonístico/afiliativo, aversivo/prazeroso, de ansiedade/satisfação, de ter medo/gostar. Comportamentos para investigar ativação positiva em macacos-prego: nível de atividade, engajamento em atividades solitárias e sociais, aproximação a indivíduos e a outros estímulos, excitação, comportamentos afiliativos como catação, lipsmacking, etc. Comportamentos para investigar ativação negativa em macacos-prego: ansiedade, medo, isolamento, evitação social ou a determinados estímulos não sociais, auto-catação, self-scratching, etc. Realizaremos observações em cinco recortes de desenvolvimento: 3º , 6 º, 12 º, 18 º, 24 º e 36 º meses, cada um consistindo de quatro semanas.

Estudo 2 – Contato Visual. Tem como objetivo identificar e codificar as oportunidades de contato facial que os filhotes possuem com outros indivíduos (mãe, filhotes, juvenis e adultos) para uma avaliação quadro-a-quadro da experiência dos filhotes com faces e expressões faciais, levando em consideração posição hierárquica da mãe e dos indivíduos que interagem com o filhote, idade e sexo do filhote e dos outros animais que participam das interações, etc. Um etograma específico, que já foi elaborado pela equipe, será utilizado. As codificações serão realizadas no programa Observer Noldus, utilizando velocidade normal e quadro a quadro. Utilizaremos diferentes recortes: 1º, 2º e 3º mês (período “colo”), 6º mês, 9º mês (período “dependência”), 12º mês, 18º mês (período “independência”) [fase da vida: infante], 24º mês, 30º mês, 36º mês [fase da vida: juvenil]. As comparações serão feitas entre períodos e entre fases de vida. As codificações serão feitas de todos os eventos de filhote com outro indivíduo. Ou seja, todos os eventos de oportunidade de contato ou de não oportunidade de contato serão codificados. Enquanto o filhote estiver nas costas da mãe, os eventos serão levados em conta quando a mãe estiver parada. A partir dessa codificação, os eventos serão sorteados (aleatorização) para balancear o número de eventos a serem analisados para cada indivíduo. Isto será feito para controlar o fato de que em muitas situações, não é possível ver o filhote em detalhes (e.g. atrás de folhagem). Uma oportunidade de contato visual consiste na aproximação e/ou na direcionalidade da cabeça dos indivíduos envolvidos na interação (um deles sendo necessariamente o filhote), de maneira que haja a possibilidade de haver contato visual. As medidas para avaliar comportamento social futuro consistirão em busca ativa por contato visual, iniciativa e estabelecimento de contato físico, lipsmacking, aproximação espacial, catação, etc.

Estudo 3 – Lipsmacking. Tem como objetivo central identificar os eventos de lipsmacking e realizar uma codificação quadro-a-quadro do comportamento, do que o precede e do que o sucede. Um etograma específico, elaborado pela equipe durante este projeto, será utilizado. As codificações serão realizadas no programa Observer Noldus, utilizando velocidade normal e quadro a quadro. Utilizaremos um recorte diferente, tendo como foco os primeiros seis meses de vida; ou seja, codificaremos e analisaremos o comportamento de lipsmacking direcionado aos infantes em todas as primeiras 24 semanas de vida dos mesmos. Além disso, levaremos em consideração a identidade do indivíduo emissor (mãe, outro aparentado, outro não aparentado), sexo do emissor (machos ou fêmeas), idade do emissor e do receptor, identidade, sexo e temperamento do infante receptor e a população na qual o infante está inserido. Essas variáveis serão inseridas como efeitos principais nos modelos de análise inferencial.

Bolsista pós-doutorado FAPESP

Bolsista de Iniciação Científica FAPESP.

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