Abraços têm feito bastante falta: como lidar com essa redução de contato

 

O abraço, quando está proibido, faz falta. É possível que você já esteja sentido isso na pele com o isolamento social. Por isso o VivaBem ouviu especialistas que nos ajudam a entender por que o toque físico é tão importante e o que podemos fazer em momentos como o de isolamento social, em que somos impedidos de tocar em muitas das pessoas que amamos.

Tanto por fatores biológicos como psicológicos, a privação do abraço pode reforçar estados de depressão e de ansiedade, o que tende a afetar negativamente o nosso sono e a nossa alimentação, de acordo com Leila Tardivo, professora de psicologia clínica da USP (Universidade de São Paulo).

Do ponto de vista biológico, o abraço está associado à produção de hormônios que nos causam sensação de bem-estar, como a ocitocina. “A ocitocina é o hormônio do amor, ele melhora a confiança, a empatia e a generosidade”, afirma a psicóloga Lina Sue, professora voluntária do Instituto de Psiquiatria da USP.

Uma necessidade antiga

Há evidências que nos permitem pensar que o toque físico foi importante para os nossos ancestrais muito antes de o ser humano existir, segundo a primatóloga Patrícia Izar, professora do Instituto de Psicologia da USP.

Em outros primatas o toque mais comum não é o abraço, e sim a chamada “catação”, em que um macaco parece estar retirando piolhos do pelo do outro. O tempo que os macacos passam fazendo catação, conta Izar, é muito maior do que o que seria necessário se o objetivo fosse simplesmente higienizar o companheiro.

O que as pesquisas mostram, diz a primatóloga, é que, assim como o abraço, a catação também está associada a um aumento do nível de ocitocina. Portanto, também provoca uma sensação agradável. E por ser agradável, aumenta o vínculo entre os indivíduos envolvidos nessa atividade.

Esse é um dos motivos pelos quais diversos pesquisadores, segundo Izar, afirmam que o toque físico pode ajudar a aumentar a coesão social em outros primatas. Mas ao longo da evolução humana, os grupos foram ficando muito numerosos, de modo que manter o contato físico regular entre todos os indivíduos ficou mais difícil. Então, a linguagem oral se tornou mais importante do que o toque, para a coesão social. Hoje, falamos e escrevemos muito mais do que nos tocamos.

Mas ainda há os momentos em que a palavra não substitui o toque. “Nas situações mais difíceis, quando é tão terrível o que a pessoa que está diante de nós viveu, o que as pessoas fazem muitas vezes? Abraçam, põem a mão no ombro. Não têm mais nada a dizer”, exemplifica Gilberto Safra, professor titular de psicologia da USP.

“A nossa comunicação [em momentos como esse] é corpórea. E pelo fato de ser corpórea, nós retiramos essa pessoa da solidão em que ela se encontrava diante daquela experiência”, completa Safra.

O abraço e outras formas de toque, portanto, têm significado. Não se trata apenas de aumentar o nível de ocitocina. A psicóloga Lina Sue lembra que experimentos mostraram que elevar a ocitocina de forma artificial (por exemplo, por meio de um spray nasal) não traz o mesmo resultado que um abraço.

Como lidar com a falta de abraço?

Hoje, enquanto vivemos uma fase de distanciamento social por conta da pandemia do novo coronavírus, “precisamos aprender a substituir o abraço por outros modos de comunicar afeto”, propõe a psicóloga Leila Tardivo. De acordo com ela, o abraço tem diversas funções, como manifestar apoio, amizade e solidariedade. A psicóloga conta que seus netos, por exemplo, fizeram desenhos para ela, o que foi um modo de eles expressarem o que sentiam.

Tardivo observa que ler histórias para crianças, ouvir a voz dos amigos e cantar parabéns nos aniversários, ainda que pela internet, também são exemplos de demonstração de afeto, que ajudam na falta de um abraço.

Outra coisa que ajuda, segundo ela, é nos lembrarmos de que o distanciamento social é uma situação passageira. Mas por enquanto, na impossibilidade do toque físico, diz ela, o que temos a fazer é sermos criativos e inventar outras formas de abraçar.

Por Silvio Crespo