Ascensão na carreira docente

A ascensão na carreira docente na primeira metade do século XX em São Paulo

O objetivo deste verbete é esboçar alguns elementos da ascensão na carreira docente em São Paulo, na primeira metade do século XX. São diversas as perspectivas de ascensão na carreira que podem ser abordadas. Na delimitação aqui feita, ascensão na carreira significa a remoção para escolas mais bem estruturadas, o aprimoramento da formação pela participação em cursos de especialização, ou ainda, a ocupação de cargos mais elevados na hierarquia do magistério. Na primeira metade do século XX, via de regra, o ingresso na carreira para as professoras normalistas se dava em escolas rurais ou escolas mais distantes das zonas centrais da cidade. A promoção para atuar em escolas urbanas, não raro, condicionava-se menos a critérios objetivos de tempo de carreira e mais a questões subjetivas como relacionamentos com políticos e autoridades locais que pudessem conseguir a remoção da professora.

Conforme o Código de Educação de 1933, para efeito de primeira nomeação e promoção de professores havia quatro tipos diferentes de escolas primárias no Estado de São Paulo: as de primeiro estágio – localizadas em pontos de difícil acesso que, por isso, exigiam a residência do professor no próprio lugar da escola; as de segundo estágio – localizadas em pontos de fácil acesso, mas que exigiam a residência do professor no próprio lugar da escola; as de terceiro estágio – são as de cidades populosas que permitem ao professor residir em outro lugar, viajando diariamente para dar aulas; e, por último, as de quarto estágio – são as da Capital e arredores e permitem ao professor residir na Capital (Código de Educação, 1933, p. 336).

Ainda em 1933, pelo Decreto n. 6.197 de 9 de dezembro, outras mudanças são introduzidas no magistério público primário. Dentre essas, uma nova classificação das escolas, a partir de então, divididas em cinco estágios. Eram do primeiro estágio as escolas ou classes localizadas em fazendas, centros agrícolas, bairros, distritos e povoados de difícil acesso à sede do município e que, por isso, exigiam a residência do professor no próprio local da escola ou classe e, além dessas, as escolas ou classes de sede de município de dificílimo acesso à Capital. As de segundo estágio eram localizadas em fazendas, centros agrícolas, bairros, distritos ou povoados de difícil acesso à sede do município e que, por isso, exigiam a residência do professor no próprio local da escola ou classe, devido à falta de meios de condução regulares, destinados a servir o público com horários convenientes ao ensino. De terceiro eram as escolas ou classes localizadas em fazendas, centros agrícolas, bairros, distritos e povoados de fácil acesso à sede do município, que permitiam ao professor viajar diariamente com pequeno dispêndio e sem nenhum prejuízo para o regular funcionamento da escola, podendo, portanto, residir na sede; são também escolas de fácil acesso à Capital. No quarto estágio estavam as escolas ou classes localizadas em cidades que, pela sua importância e situação, se tornassem centro de convergência das populações da zona, e, por isso, fossem preferidas pelos professores da mesma zona; ainda estavam incluídas aí, escolas localizadas nas sedes de município que ficavam a uma hora de viagem da Capital por estrada de ferro. Por fim, eram do estágio especial as escolas primárias anexas às escolas normais oficiais do interior e as classes ou escolas do município da Capital.

No geral, a primeira escola, era de primeiro estágio, mais conhecida como Escola Isolada Rural. Localizadas em pontos de difícil acesso, o trabalho nessas escolas obrigava a professora a enfrentar dificuldades que iam além da mudança de cidade e separação da família. Os trabalhos de Zeila Demartini (1984) e Wiara Alcântara (2008) são férteis no sentido de evidenciar as lutas da professora iniciante na carreira para conseguir nomeação em escolas mais bem localizadas. Ambos trazem relatos de professoras do período que demonstram como a ascensão na carreira estava condicionada às interferências políticas ou pedidos às autoridades escolares. Mesmo quando eram realizados concursos, a escolha de uma professora dentre as inscritas para uma cadeira dependia de questões políticas e pessoais.

Quanto à ocupação de postos administrativos, pesquisas (ALCÂNTARA, 2008) têm mostrado que esta poderia ser uma realidade que acontecia antes para os jovens professores. Somente após longos anos de atuação na sala de aula é que as professoras conseguiam galgar os postos administrativos e publicar em revistas especializadas da área.  É o que relata a professora Botyra Camorim em sua autobiografia acerca de um professor recém-formado que já era diretor de escola.

O Diretor das Escolas Reunidas de Vila Poranga era um jovem professor, recém-formado, dono de um dos três caminhões que existiam no lugar. Além de professor, ele explorava o negocio de carretos. Transportava o algodão dos bairros distantes para as cidades. Nas reuniões, ele não titubeava em criticar e até as professoras que eram quatro do seu grupo e cinco de escolas isoladas, inclusive eu (CAMORIM, 1962, p. 44).

Nota-se que, no período em destaque, em qualquer das formas de ascensão na carreira aqui delimitadas, as relações familiares, as interferências de autoridades políticas e escolares, as relações interpessoais, as redes de amizade eram elementos fundamentais para que, tanto professores, quanto professoras conseguissem nomeação para escolas urbanas e mais estruturadas. Quanto à ocupação dos postos administrativos do magistério, era uma alternativa que, via de regra, algumas professoras conseguiam gozar no final da carreira.

Palavras-chaves: ascensão na carreira – carreira docente – mulheres no magistério.

Referências bibliográficas

ALCÂNTARA, Wiara Rosa Rios. Uma vida no magistério: fios e meadas da história de uma professora paulista. 2008. Dissertação de Mestrado – Universidade de São Paulo (USP). Faculdade de Educação. São Paulo.

CAMORIM, Botyra. Uma vida no magistério. São Paulo: Saraiva, 1962.

DEMARTINI, Zeila de Brito (Coord.). Velhos mestres das novas escolas: um estudo das memórias de professores da Primeira República em São Paulo. Sao Paulo: Centro de Estudos Rurais e Urbanos, 1984.

SÃO PAULO (Estado). Secretária da Educação e da Saúde Pública. Decreto n. 5.884 de 21 de abril de 1933. Institui o Código de Educação do Estado de São Paulo. Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo. 3ª ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado. Tomo XLIII, p. 278-449.

SÃO PAULO (Estado). Decreto n. 6.947 de 6 de fevereiro de 1935. Consolida disposições anteriores e introduz modificações na carreira do magistério primário, instituída pelo Decreto n. 5.884 de 21 de abril de 1933, e alterada pelo Decreto n. 6.197, de 9 de dezembro de 1933. Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo. 2ª ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado. Tomo XLV, p. 54-63.

Autoria: Wiara Rosa Rios Alcântara