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Colón, Willie

Nova York (Estados Unidos), 1949

Por Ángel G. Quintero Rivera

Antes de começar uma carreira plena de êxito como solista e produtor, William Anthony Colón foi o cérebro musical dos dois mais famosos duos da história da salsa. Tendo se iniciado como trombonista aos catorze anos, em um grupo nova-iorquino-latino de jazz latino, organizou sua primeira orquestra de salsa aos dezessete anos, com o porto-riquenho Hector Lavoe como cantor. O caráter de espontânea inovação de uma formação que buscava estilos que marcassem sua própria identidade em um universo musical povoado de grandes instrumentistas, cantores e orquestras estabelecidas, tornou-os rapidamente populares entre a juventude latina de Nova York, para quem o espetáculo das big bands latinas representava uma realidade que escapava do duro cotidiano dos guetos. Diante da depurada sonoridade das orquestras de Tito Puente Tito Rodríguez, estes “rapazes desafiantes” foram consolidando um som mais áspero e agressivo, mais afinado com a estrutura sentimental juvenil do Bronx; imagem que, além disso, também enfatizavam nas capas e nos títulos de suas produções, que parodiavam o estereótipo de “malandro” com o qual – desde West Side story – os anglos visualizavam os spiks (modo depreciativo de referir-se aos imigrantes porto-riquenhos pelo seu sotaque marcado ao falar inglês).

Irreverência

O primeiro disco de Colón e Lavoe intitulou-se El Malo (1967), ao qual se seguiram, nos oito anos seguintes, The hustler, Guisando (Doing a job), Cosa nuetra (parodiando a Cosa nostra da máfia), La gran fuga, El juicio, Lo mato The good, the bad and the ugly . Depois do terceiro e do sétimo álbuns, foram intercalados dois discos de Natal intitulados Asalto Navideño (1 e 2) jogando com o duplo sentido da palavra, pois além de roubo, a palavra asalto, em Porto Rico, refere-se a uma antiga tradição de serenata que visita de surpresa os amigos, despertando-os no meio da noite com uma oferenda musical.

Lavoe e Colón compuseram a maior parte de seus sucessos (com algumas canções famosas que compôs para eles o carteiro porto-riquenho Catalino “Tite” Curet Alonso). Foram talvez os grandes responsáveis pela consolidação da salsa como novidade na maneira de se fazer música com ingredientes tradicionais pan-americanos; ou seja, como fusão variada e livre de muitos e diversos gêneros afro-americanos anteriores. A irreverência agressiva se manifestava, entre outros aspectos, em uma prática de “faltar com o respeito aos gêneros”, transgredindo – com as livres fusões – algumas de suas características definidoras. Por esse motivo, receberam duras críticas de alguns tradicionalistas da música “tropical”, a quem pareciam disparatadas suas irreverências, quando na realidade consolidava-se nestas uma nova maneira – muito mais livre – de fazer música latina. A música deles foi irreverente e inovadora também por relegar ao segundo plano, na livre combinação salsera, os gêneros cubanos, até então hegemônicos na sonoridade latina. Eles enfatizaram os gêneros tradicionais porto-riquenhos (como a bomba, a plena e o aguinaldo) e o jazz, salpicando essas fusões com gêneros brasileiros, panamenhos, dominicanos, colombianos, anglo-caribenhos, cubanos e, de maneira inovadora, diretamente africanos também.

Super-heróis latinos

Em 1975, Lavoe se lançou como solista e Colón se manteve como produtor de seus discos, já que seu temperamento impulsivo e sua dependência das drogas impossibilitavam-no de se fazer completamente autônomo. O caráter experimental de Colón já o impulsionava na direção de novos caminhos. Nesse mesmo ano recrutou o mais importante trombonista porto-riquenho da geração anterior, Mon Rivera, que acabara de cumprir uma sentença carcerária por drogas, para realizarem juntos a mais importante produção salsera sobre a base dos gêneros porto-riquenhos da bomba e da plena, nos quais Mon tinha se destacado. Em seu característico estilo de irreverente crítica social, a capa mostrava a irrupção da dupla porto-riquenha de Mon e Willie em uma Nova York povoada de super-heróis – Batman e Robin, Super-Homem, a Mulher Maravilha etc. O título, There goes the neighborhood , tinha logo abaixo a versão espanhola, Se chavó el vecindario (Detonou-se a vizinhança). Era a frase exasperada que os anglos costumavam exclamar quando algum porto-riquenho se mudava para sua área de residência.

Em 1977, Colón produziu a música para um balé televisivo “Baquiné de los angelitos negros”, um disco de sucesso com a cubana Celia Cruz e, finalmente, seu primeiro disco com o cantor e compositor panamenho Rubén Blades como solista – Metiendo mano!. O sucesso imediato dessa produção preparou o caminho para o lançamento, em 1978, de Siembra, o disco de maior êxito da história da salsa.

Mais tarde o duo se desfez e por algum tempo Colón e Blades seguiram rumos distanciados. No entanto, apararam as arestas e nos anos 1990 produziram juntos Tras la tormenta que dedicaram a Lavoe. Trata-se do único disco de salsa, que se tenha notícia, cujos protagonistas nunca se juntaram fisicamente na produção: tudo foi combinado em estúdio, com faixas que cada um enviou ao outro por correio. Depois participaram amistosa e solidariamente de vários concertos ao vivo.

Ambos seguiram carreiras de sucesso como solistas e realizaram excelentes produções posteriores – muitas, inclusive, tendo ganhado Grammys e outros prêmios da indústria de discos. No entanto, nenhuma alcançou o impacto e o sucesso daquelas que configuraram juntos.