Lobos, 1895 – Buenos Aires (Argentina), 1974
Por María Seoane
Juan Domingo Perón nasceu em 8 de outubro de 1895 em Lobos, no Estado de Buenos Aires. Foi o segundo filho de Juana Sosa Toledo e Mario Tomás Perón, um pequeno estancieiro. Após passar alguns anos com sua família na Patagônia, viveu com a avó paterna, Dominga Dutey, na cidade de Buenos Aires. Em 1907, ingressou no Colégio Politécnico, e em 1911, no Colégio Militar. Integrou, como cadete, a equipe de esgrima do exército. Durante a primeira presidência do radical Hipólito Yrigoyen (1916-1922), atuou na repressão a mobilizações operárias. Em 1918, foi enviado a Santa Fé, na região do Chaco, para observar a situação da greve de trabalhadores da La Forestal, uma companhia dedicada à exploração da baraúna. No ano seguinte, participou da “Semana Trágica”: a repressão a uma greve de trabalhadores metalúrgicos em Buenos Aires, que deixou vários mortos e centenas de detidos. Em 1920, foi transferido para a Escola de Suboficiais do Campo de Maio, na qual já tinha fama de caudilho. Paralelamente, deu aulas de educação física na Associação Cristã de Moços. Entre 1926 e 1928, estudou na Escola Superior de Guerra, onde anos depois seria professor. Em 1929, conheceu Aurelia Tizón (“Potota”), uma jovem de classe média treze anos mais nova que ele, com quem se casou.
Em 1930, participou do primeiro golpe militar da história argentina, encabeçado pelo general José Félix Uriburu, que derrubou Yrigoyen. Obteve seu primeiro cargo político: secretário do ministro da Guerra. Em 1936, foi adido militar da embaixada da Argentina no Chile. Sua gestão quase causou um escândalo diplomático, pela suposta compra de segredos militares chilenos. Em 1938, sua esposa morreu de câncer. Um ano mais tarde, Perón viajou à Europa em missão militar, para fazer um curso de capacitação de infantaria de montanha na Itália. Simpatizou com os regimes fascistas em ascensão na Itália e na Alemanha.
Quando eclodiu a Segunda Guerra Mundial, regressou à Argentina. Depois de ocupar diversos cargos, no início de 1942, o já coronel Perón integrou o Grupo de Oficiais Unidos, que desempenhou um papel fundamental em sua ascensão política. O processo de formação do peronismo começou com o golpe militar de junho de 1943, que derrubou o governo conservador de Ramón Castillo e guindou à presidência o general Pedro Pablo Ramírez. Perón assumiu a Direção Nacional do Trabalho, que, no mês seguinte, elevou a Secretaria do Trabalho e Previdência. Durante sua gestão, intercedeu em diversos conflitos a favor dos operários, estabeleceu as férias remuneradas e o Estatuto do Peão Rural, e ampliou as bases do sistema previdenciário.
Em 1944, por ocasião das tarefas de reconstrução decorrentes do terremoto de San Juan, conheceu Eva Duarte, com quem se casou em 1945. Nessa época, acumulava um poder considerável no governo: era vice-presidente da Nação, ministro da Guerra e secretário de Trabalho e Previdência. Por outro lado, havia uma forte oposição à sua liderança, encabeçada, no plano internacional, pelos Estados Unidos, cujo embaixador, Spruille Braden, acusava o governo de pró-nazista; e, no plano interno, pela União Democrática, uma coalizão de radicais, conservadores, socialistas, universitários, intelectuais e membros da oligarquia. Por pressão desse bloco opositor, o governo militar decidiu despojar Perón de seus cargos, afastá-lo do poder e encarcerá-lo. Produziu-se, então, o marco fundacional do peronismo e a consagração de Perón como figura-chave da vida nacional argentina.
Em 13 de outubro de 1945, o coronel foi detido e confinado na ilha Martín García. Imediatamente, a Confederação Geral do Trabalho (CGT) convocou uma greve para o dia 18, porém, um dia antes, os trabalhadores saíram às ruas e se dirigiram à Praça de Maio, de onde exigiram a libertação de Perón. A multidão não abandonou a praça até que Perón fosse libertado e se dirigisse ao povo do terraço da Casa Rosada. O governo, então, convocou eleições.
Em fevereiro do ano seguinte, Perón foi eleito presidente, com mais de 52% dos votos, e assumiu no dia 4 de junho. Começava assim um ciclo de dez anos nos quais se sucederiam as duas primeiras presidências do já general Perón (1946-1952 e 1952-1955), marcado pelas três bandeiras do peronismo – justiça social, soberania política e independência econômica –, mas também por alguns traços autoritários que irritaram a oposição, como a concentração de poder, a exaltação de sua figura e da de Evita e a perseguição de opositores. Eva cumpriu um papel fundamental na consolidação de Perón como líder de massas. Em seus dez anos de governo, o peronismo buscou – e em boa medida conseguiu – aplicar uma versão criolla do Estado de bem-estar social. Nacionalizou os sistemas bancário e ferroviário, impulsionou fortemente as obras públicas e elevou a cláusulas constitucionais os direitos do trabalhador, da terceira idade e da infância. Sua política econômica materializou-se em dois planos quinquenais: o primeiro previsto para 1947-1952, e o segundo, para o período seguinte, que não pôde terminar de aplicar. Deposto em 1955, Perón exilou-se primeiro em Assunção, no Paraguai, depois no Panamá, onde conheceu María Estela Martínez (Isabel), com quem se casaria em 1962, e de onde chamou a “resistência civil” para combater a Revolução Libertadora; exilou-se ainda em Caracas, na Venezuela – entre agosto de 1956 e janeiro de 1958 –, na República Dominicana, onde permaneceu com Isabel até 1960, e finalmente em Madri. No exílio, Perón manteve-se em estreito contato com seus seguidores, organizou a resistência peronista e orientou o voto em cada eleição.
O peronismo estava proscrito, mas continuava sendo a força política mais importante do país. Na Espanha, o ditador Francisco Franco o recebeu com todas as honrarias. Perón instalou-se primeiro em Madri e depois em Puerta de Hierro. Dali continuou sendo o principal líder do peronismo e da oposição tanto política como sindical. E começou a dialogar com seus antigos opositores, como o radical Ricardo Balbín, o que resultou, em 1970, no acordo conhecido como “A hora do povo” (La hora del pueblo). Simultaneamente, ele acenava para os grupos peronistas que promoviam a luta armada, como os Montoneros. Entre 1971 e 1972, o velho líder recebeu visitas de políticos, sindicalistas, empresários e militares. Seu secretário particular, José López Rega, cuidava de sua agenda. Em 17 de novembro de 1972, depois de dezessete anos de exílio e após uma queda de braço política com o presidente militar Alejandro Lanusse, Perón voltou à Argentina, onde permaneceu quase um mês e costurou acordos políticos com diferentes setores. Pouco depois, anunciou a chapa presidencial da Frente Justicialista de Libertação, composta por Héctor Cámpora e Vicente Solano Lima, que conquistaria a vitória. O retorno definitivo de Perón à Argentina ocorreu em 20 de junho de 1973, em meio à luta interna entre a esquerda e a direita peronistas, que culminou no Massacre de Ezeiza – um enfrentamento armado entre as duas facções, nos arredores do aeroporto internacional. Para conseguir a unidade do movimento, Perón candidatou-se às eleições de setembro de 1973, e a chapa que compôs com sua esposa obteve 62% dos votos.
Ele assumiu a presidência no mês seguinte. Em seus últimos meses de vida, o governo foi gradativamente se inclinando para posições mais ortodoxas. No 1º de maio de 1974, num ato na Praça de Maio pelo dia do trabalhador, Perón insultou os Montoneros, que questionavam a presença de figuras de direita no governo, e produziu-se uma ruptura entre a juventude e o líder. Dois meses depois, velho e doente, Perón morreu e a presidência ficou nas mãos de Isabel e de López Rega, que fundou a organização terrorista de direita conhecida como Triple A (AAA). Em 1987, seu túmulo no cemitério de La Chacarita foi profanado: cortaram as mãos do cadáver. Os culpados jamais foram identificados.