Recife (Brasil), 1900 – 1987
Por Carlos Eduardo Martins
Um dos principais escritores e ensaístas brasileiros, Gilberto Freyre nasceu no Recife, Pernambuco, de uma família tradicional, proprietária de engenhos de cana-de-açúcar. Seu pai, Alfredo Freyre, era juiz de direto e catedrático de economia política da Faculdade de Direito do Recife. Matriculado com oito anos no jardim de infância do Colégio Americano, teve, inicialmente, dificuldades para ler e escrever. Aprendeu inglês antes da língua materna, e, posteriormente, latim com o pai, organizando a sociedade literária e o jornal de seu colégio, O Lábaro, no qual publicou seus primeiros artigos. Aos quinze anos, começou a estudar francês e leu os clássicos da literatura em francês, latim, espanhol, inglês e português.
Em 1920, formou-se bacharel em artes na Baylor University e, em 1922, concluiu mestrado em Ciências Sociais na Universidade de Columbia, Nova York, apresentando a dissertação Social life in Brazil in the middle of the nineteenth century [Vida social no Brasil em meados do século XIX]. Foi aluno do grande antropólogo norte-americano Franz Boas, com quem aprendeu a isolar o conceito de cultura das influências biológicas e raciais. Boas, junto com Manuel de Oliveira Lima, historiador de d. João VI, foi sua principal influência, entre outras expressões do pensamento norte-americano, como Franklin Giddins, John Dewey e Alfred Zimmern.
Seus escritos em inglês impressionaram Joseph Armstrong, seu professor na Baylor University, que lhe sugeriu naturalizar-se para se beneficiar de uma disputada bolsa de estudos em Oxford. Mas Freyre se recusou e se propôs então a ser escritor em português. Em 1922, foi à Europa, passando por Paris, Berlim, Munique, Nuremberg, Londres, Oxford e Lisboa. Regressou ao Brasil em 1923 e, no ano seguinte, organizou o Centro Regionalista do Nordeste, em defesa dos valores locais contra a ofensiva modernista. Opondo-se à revolução de 1930, deslocou-se para Lisboa.
Em Portugal, começou a trabalhar no que viria a ser sua contribuição mais importante à cultura brasileira: a história da sociedade patriarcal do país. O primeiro volume da empreitada foi Casa-grande & senzala, terminado em 1933, no Recife. Continuou com Sobrados e mucambos e Ordem e progresso. Não chegou a escrever Jazigos e covas rasas, como pretendia.
Elegeu-se deputado federal constituinte em 1946, pela União Democrática Nacional (UDN), e criou o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas. Em 1950, tornou-se diretor do Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife e defendeu uma política educacional atenta às diversidades regionais. Em 1951, foi convidado pelo governo português de Antônio Salazar a realizar viagem a Cabo Verde, Guiné, Goa, Moçambique, Angola e São Tomé, a partir do que desenvolveu o conceito de luso-tropicalismo, já implícito em escritos como Casa-grande & senzala, mas posteriormente elaborado em obras como Aventura e rotina e O luso e o trópico.
O luso e o trópico exaltou a obra colonial portuguesa, capaz de criar uma identidade sem fronteiras que atravessou os mares e se adaptou aos trópicos, constituindo diversidades que formariam um só Portugal. O luso-tropicalismo teria sobrevivido, entretanto, à queda do império colonial português, sendo reivindicado em movimentos como o da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Em 1964, apoiou o golpe militar. Fez parte do Conselho Federal de Cultura, desde sua origem, em 1967, no governo do marechal Castelo Branco. Morreu em 1987, deixando vasta obra, incluindo 67 livros e centenas de outros documentos.