Estes meus aprendimentos sobre o modernismo brasileiro – Telê Ancona Lopez

ESTES MEUS APRENDIMENTOS SOBRE O MODERNISMO BRASILEIRO

Telê Ancona Lopez, do IEB-USP

Nesta saudação aos participantes da Escola São Paulo de Ciência Avançada –Modernismo: disputas em torno do moderno e de projetos de nação, importantíssimo evento da FAPESP, coordenado pelo pesquisador do IEB Marcos Antonio de Moraes, quero agradecer o convite para participar desta tão necessária discussão.
E quero exprimir minha tristeza perante a minha impossibilidade de me
apresentar fisicamente aqui. Estou, ainda que temporariamente (ESPERO E DESEJO!), à mercê de uma limitação que o meu corpo me impôs. Sinto muito. E vejo que meus aprendimentos implicam, forçosa e obviamente, a aprendizagem do vulnerável e do precário nas minhas decisões. O título que dei ao que seria a minha conversa de hoje, na vontade de estar em uma sala de aula, não implicaria um balanço pois que a riqueza dos estudos suscitados pelos 100 anos do modernismo brasileiro estoura qualquer balanço ou avaliação circunstanciada. Essa conversa não acalentaria apenas os aspectos de oposição e complemento nos conceitos de moderno e modernista traçados pelo filósofo Henri Lefebrve, para quem a modernidade é a própria dúvida, a tarefa de se questionar é uma das mais prementes da sociedade.
Nos meus aprendimentos – brinco neste título, como se vê, com o “Manifesto Pau-Brasil” de Oswald de Andrade –, eu levaria em conta, é claro, a conquista declarada por Mário de Andrade: “O que caracteriza esta realidade que o movimento modernista impôs, é, a meu ver, a fusão de três princípios fundamentais: o direito permanente à pesquisa estética; a atualização da inteligência artística brasileira; e a estabilização de uma consciência criadora nacional.” Mas, me inclinando sobre este sentido do tempo, declarado em T. S. Eliot, logo no início da primeira parte do primeiro dos quatro “Quartetos”, o que tem como mote ou epígrafe o fragmento 60 de Heráclito de Éfeso: “O caminho que sobe e o caminho que desce são um único e o mesmo.”. Tomo a tradução de Ivan Junqueira. São estes os versos do poeta que se alimentou de Beethoven: “O tempo presente e o tempo passado “Time present and time past Estão ambos talvez presentes no tempo futuro Are both perhaps present in time future E o tempo futuro contido no tempo passado. And time future contained in time past. Se todo tempo é eternamente presente, If all time is eternally present Todo tempo é irredimível.” All time is unredeemable.” 1

O sentido do tempo completa-se, para mim, no verso 96 da segunda parte:
“Somente através do tempo é o tempo reconquistado.” “Only through time time is conquered.” 2

Pensaríamos juntos que o modernismo brasileiro, na chave da modernidade pede reflexões atentas ao singular, ao particular e ao universal, considerando a Vida e a História do homem, a liberdade. E a interdisciplinaridade, a multidisciplinaridade nos distanciamentos e aproximações, usando aqui palavras do Mário de Andrade. Essa investigação, para ser verdadeira e atual, deve conter, simultânea, a investigação do nosso desejo. Assim, o avançar das descobertas das nossas pesquisas e das nossas cogitações, respeitará o distanciamento histórico, sem incorrer em anacronismos, sem se desfigurar no entusiasmo das nossas projeções, no wishful thinking que nos precipita no decreto e no dogma, em comportamentos incompatíveis com o século XXI, como regular leituras ou tirar livros das bibliotecas, ao modo dos nazistas.
Pensaríamos igualmente na conquista, em cada um de nós, a conquista do estilo próprio, buscando a clareza, a coerência semântica no que falamos ou escrevemos, professores ou críticos e historiadores conscientes dos maneirismos da escrita acadêmica, do carimbo vocabular que nos reassegura, porém nos banaliza no rebanho.
Pensaríamos na lição de escrever que nos dão aqueles que aliam a substância à liberdade, leitura que nos acrescenta e nos livra da chatice.
Vejo que o título desta minha fala já não me serve mais. Melhor teria sido reiterar que o nosso conhecimento nada é perante tudo o que desconhecemos. Agora eu a chamaria “Cogitações singelas diante de uma comemoração”.

Muito obrigada!

1 ELIOT, T. S. Obra completa: Poesia. Tradução, introdução e notas de Ivan Junqueira. São Paulo: Arx,
2004, p. 332-333.
2 IDEM, ibidem, p. 337.