Diversidade cultural – proteção e dever institucional dos BRICS

Por Cassio Eduardo Zen

Muito se fala desde a reunião de Joanesburgo a respeito da ampliação do grupo, em especial destacando os importantes dados da cada vez mais fortalecida economia dos BRICS. Por outro lado, tambêm se fala de uma nova configuração geopolítica e de segurança global como resultado da mesma ampliação. Porém, estes dois pilares dos BRICS seriam essencialmente os tijolos que compõem o grupo. O terceiro pilar por sua vez, focado no intercâmbio entre pessoas, seria o cimento que une os diferentes tijolos.

Assim como durante a Revolução Francesa, enquanto havia uma clara definição dos integrantes dos dois primeiros estamentos e Sieyés, de modo célebre, perguntava que seria o terceiro, na esfera internacional, não há dificuldade de identificar que países integram a União Europeia, quais são os laços que unem os países para além de aspectos econômicos. Agora quem seriam os BRICS? Seriam eles, assim como o terceiro estamento, um grupo de países que querem ser algo? Talvez seja possível considerar este um ponto de partida. Cinco/Onze países que então questionam a ordem global que lhes é desfavorável, apesar da inegável importância econômica-política-militar dos mesmos.

Agora, seria possível falar em laços culturais entre os países dos BRICS? Indubitavelmente, os países dos BRICS sofreram, cada um à sua maneira, com efeitos de políticas similares, tratados como “não integrados à civilização ocidental” (até mesmo a Rússia, cujos centros políticos se localizam tecnicamente na Europa, por vezes é tratada como periférica). Ao contrário do que os detratores dos BRICS poderiam dizer, a diversidade cultural imensa entre os países do grupo não é uma desvantagem. Pelo contrário, nossa diversidade permite que tenhamos diferentes visões de mundo e através dessa apresentemos diferentes soluções ao mundo.

Sem a construção de fortes laços entre pessoas dentro de Brasil, Rússia, India, China, África do Sul, Argentina, Arábia Saudita, Irã, Emirados Árabes Unidos, Egito e Etiópia, estaremos diante de um bloco artificial. Este desafio de estabelecer laços entre os países pode, por vezes, ser difícil e tende a piorar conforme o grupo for expandindo. Enquanto o Brasil e a Argentina possuem laços antigos, por exemplo, o mesmo não pode ser dito entre outras partes dos BRICS, por vezes históricos rivais (como é o caso do Irã e da Arábia Saudita)
Seriam estas rivalidades um problema para os BRICS? Por um lado, há quem questione se estas seriam um elemento corrosivo para a parede de tijolos. Porém, por outro lado, fortalecendo-se a qualidade do terceiro pilar (justamente o “cimento” dos BRICS) tem-se a possibilidade de tornar os BRICS um foro adequado para resolução de problemas difíceis nas Relações Internacionais. Um foro no qual se debate entre iguais, através do consenso, baseados no forte intercâmbio entre os povos.

Nossos países são referências importantes na educação. O Brasil e a Argentina possuem universidades que são referências, a China atualmente lidera uma série de rankings globais de publicações, a Índia possui tradição milenar, desde os remotos tempos da Universidade Nalanda, a Arábia Saudita possui uma das universidades com maior quantidade de recursos do mundo (Universidade Rei Abdullah), o Egito possui a notória Biblioteca de Alexandria (em sua reencarnação) e por milênios foi o local de peregrinação acadêmico-científica (inclusive dos tão celebrados filósofos gregos). Sem mencionar a importância científica e cultural de Rússia, Irã, África do Sul, Etiópia e Emirados Árabes Unidos, países em crescente desenvolvimento e referências em uma série de assuntos científicos e acadêmicos.

É passada a hora de abandonarmos a “síndrome de vira-lata” e passarmos a compreender que a cultura e sabedoria dos países dos BRICS é milenar e que estudar integra nosso “DNA” dos BRICS. Nossos países foram e são referências e através do fortalecimento destes vínculos culturais, através do intercâmbio entre instituições acadêmicas e pessoas nos diferentes países, poderemos, enfim, esclarecer a pergunta “neo-Sieyética” sobre quem são os BRICS. Resta apenas um espinhoso e complexo problema a resolver para o fortalecimento do intercâmbio entre pessoas: o desenvolvimento de mecanismos de proteção de minorias, essencialmente a base de qualquer construção cultural humana, sem as quais não haverá intercâmbio entre pessoas, mas entre “modelos estatais autorizados” de culturas. Porém, isto é assunto para um outro artigo de opinião.