Normal De Quem?
O período era o fim da tarde e o momento era de incerteza generalizada. Momentos propícios para aquelas lembranças esquisitas sobre, sei lá eu, uma excursão para um museu de arte contemporânea com a turma da quarta série misturadas com incansáveis perguntas sobre como as coisas teriam sido se uma pequena coisa tivesse acontecido diferente há dez anos atrás. Momentos em que a gente se afoga de passado: mas eles agora nos olham, cabeça inclinada, como se não nos reconhecessem mais. Como se temessem ser, na verdade, parte de uma outra história. Outra, que não a nossa.
A ilusão de que era tudo uma quebra temporária, hiato para experienciarmos um nada entre duas pontas de realidade (o antes e o depois da pandemia) logo se mostrou exatamente isso: uma ilusão. O que, afinal, estamos querendo dizer quando falamos “quando tudo voltar ao normal, eu vou…”? Iremos ter de conhecer novas formas de abraçar. Novas formas de ler o olhar do outro, na falta de podermos ver o rosto inteiro. Novas concepções de lazer. Novas formas de trabalhar: o trabalho online é o novo futuro… para quem?
Do lado de fora, uma quarentena cada vez mais flexibilizada afrouxa com a insistência de uma realidade que não percebe que seu tempo de vigor acabou. E, do lado de fora e também dentro, o período de isolamento deixou de ser um hiato quando se encharcou de realidade. No horizonte à frente, ainda desponta a incerteza: quando tudo voltar ao normal… a qual normal voltará?
Ao normal de quem?
Que texto lindo, Mariana! Traduziu muito bem o que temos sentido e vivenciado. Parabéns!