Petróleo Brasileiro S.A.
Antonio Luiz M. C. da Costa
Em consequência de uma campanha nacionalista que mobilizou o país, a prospecção, importação, exploração e o refino de petróleo no Brasil tornaram-se exclusividade do Estado, em 1953, com exceção de duas pequenas refinarias privadas já existentes antes do monopólio. Nas décadas seguintes, a questão do controle estatal do petróleo tem sido, tanto pela importância simbólica quanto pela real, o principal divisor de águas entre as correntes políticas liberais e as nacionalistas que, ao menos nessa questão, deram a última palavra.
Por volta de 1970, 70% do petróleo consumido no Brasil era importado e essa proporção cresceu para quase 85% em 1978. Com a elevação dos preços decorrente da política da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), esse item chegou a representar, em valor, cerca de metade de todas as importações do Brasil, e tornou-se, ao lado da alta dos juros da dívida externa (consequência indireta do aumento dos preços), o principal fator de estrangulamento da economia brasileira, até então uma das que mais crescia no mundo.
O governo intensificou os investimentos em exploração e produção de óleo e gás natural, implantou programas de racionalização do uso de energia e incentivou a utilização de outras fontes energéticas, principalmente a hidrelétrica, muito abundante no país, e o álcool, que substituiu a gasolina em mais de 55% dos automóveis e caminhões leves produzidos de 1980 a 1993. Esse composto também passou a ser adicionado à gasolina comum numa proporção de até 22% – experiência pioneira no mundo, com efeitos colaterais positivos no controle da poluição.
A Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) tornou-se recordista mundial na produção comercial de petróleo em águas profundas, principalmente na Bacia de Campos, ao largo do Estado do Rio de Janeiro.
A combinação de tais medidas reduziu a dependência do petróleo importado para 45% do consumo em 1985. Com a queda dos preços desse produto no fim da década de 1980 e as crescentes dificuldades financeiras do governo federal, os pesados investimentos necessários para substituir o petróleo importado tornaram-se menos prioritários. Também foram suspensos os investimentos na produção de álcool combustível e reduzidos os subsídios a seu uso. Ainda assim, a dependência das importações continuou a cair gradualmente e, em 2005, estava reduzida a praticamente zero.
Tal tecnologia, vale notar, implicou um investimento e um custo de produção relativamente altos. Justificou-se ante às necessidades do país de reduzir sua dependência externa e economizar divisas e também aos altos preços do petróleo nos anos 1970 e 1980 (e após 2003), mas jamais teria sido desenvolvida por uma transnacional privada enquanto esta tivesse possibilidade de explorar petróleo a custo bem mais baixo em outras partes do mundo. É um exemplo de aplicação bem-sucedida de uma lógica e de uma noção de eficiência diferente da neoliberal. Se o Brasil se ativesse estritamente a essa última, não teria chegado a produzir petróleo em escala significativa e passaria por restrições ainda maiores a seu crescimento.
O monopólio do petróleo foi confirmado pela Constituição de 1988 e estendido à aquisição de álcool combustível dos usineiros, mas não o do gás natural, que passou à responsabilidade de empresas estaduais e, mais tarde, privadas.
Em 1997, entretanto, foi sancionada uma lei regulamentando a flexibilização do monopólio do governo na exploração do petróleo e criando a Agência Nacional do Petróleo (ANP) para regular e fiscalizar o setor, substituir o Departamento Nacional de Combustíveis (DNC), responder pela formulação dos planos nacionais de refino e abastecimento e promover licitações para a exploração e produção. Centenas de blocos de bacias sedimentares com possíveis reservas foram licitadas, com prazo de nove anos para início da exploração, mas a Petrobras pôde participar dessas licitações e venceu muitas delas. Até 2005, ainda não havia produção privada de petróleo no Brasil. Por outro lado, a estatal foi incentivada a investir em outros países e neles atuar como uma transnacional.
Em 2004, as reservas “provadas” de petróleo da Petrobras eram estimadas em 9,9 bilhões de barris de óleo e condensado, sem contar gás natural de valor energético equivalente a 1,9 bilhão de barris de petróleo (um barril de óleo equivale a 150 m³ de gás natural). Isso corresponde a dezesseis anos de produção de petróleo e catorze de gás, pois a produção média diária era de 1,66 milhão de barris/dia de óleo (75% do mar) e 359 mil barris/dia de óleo equivalente em gás natural.
A empresa detinha, naquele ano, onze refinarias com capacidade total de 1.996.000 barris/dia (120% da capacidade de produção), além de duas grandes fábricas de fertilizantes, dez usinas termelétricas com capacidade de 1.912 MW, duas hidrelétricas com 1.685 MW e numerosos investimentos em petroquímica, em parceria com grupos privados.
A Petrobras extrai petróleo também na Argentina (114 mil barris/dia), Venezuela (51 mil), Peru (13 mil), Bolívia (7 mil) e Equador (5 mil). Detém direitos sobre reservas totais de 1,01 bilhão de barris de petróleo e 860 milhões de barris equivalentes de gás natural nesses quatro países e possui duas refinarias na Bolívia e duas na Argentina, com capacidade total de 129 mil barris/dia. Opera o trecho brasileiro do gasoduto Gasbol (Bolívia-Brasil), que atende a 30% do consumo brasileiro de gás natural.
Em 2006, Sergio Gabrielli, então presidente da Petrobras (2005-2012), anunciou a descoberta das reservas pré-sal, o que colocou a Petrobras e o Brasil em um novo patamar no cenário mundial dos combustíveis fósseis. A empresa, então, foi em busca das adaptações e estratégias necessárias para vencer o desafio de extrair petróleo em águas profundas com tecnologia própria. Lançou os programas Prosal, que desenvolve pesquisas com apoio de universidades, e o Programa de Inovação Tecnológica e Desenvolvimento Avançado em Águas Profundas e Ultraprofundas, Procap.
Os poços já instalados no pré-sal apresentaram produtividade muito acima da média mundial. A Petrobras possui reservas e tecnologia para se manter à frente do mercado por décadas. De 2010 a 2014, a média de produção diária dos reservatórios do pré-sal cresceu dez vezes, avançando de 41 mil barris diários (média em 2010) para 520 mil barris diários. Em dezembro de 2014, a produção atingiu a média de 666 mil barris de petróleo por dia (bpd), superando em 10% o recorde anterior, de 606 mil bpd. A produção total de petróleo e de gás natural, em dezembro de 2014, atingiu a média de 2 milhões, o equivalente a 863 mil barris de óleo por dia, 5,1% acima do volume de 2013.
O recorde de barris diário do pré-sal foi atingido em 11 de abril de 2015, com a marca de 800 mil bdp, oriundos de 39 poços produtores. Vinte deles estão localizados na Bacia de Santos, que responde por 64% da produção (511 mil barris por dia). Os outros 19 poços são da Bacia de Campos, que respondem por 36% da produção (291 mil barris por dia). Desde 2014, a Petrobras é a maior produtora de petróleo do mundo entre as empresas de capital aberto.
A Agência Internacional de Energia (AIE) prevê que a produção no Brasil atingirá de 6 a 7 milhões de barris por dia em 2035, e que o consumo interno será de 3,5 milhões de barris por dia, com excedente exportável de 3 milhões de barris por dia.
A descoberta do pré-sal e a consequente valorização da Petrobras despertou interesse no cenário internacional e está no centro de disputas políticas no Brasil, acirrando a luta dos neoliberalistas pela privatização da empresa, arquitetada desde o governo Fernando Henrique Cardoso. Em 2014, uma investigação da polícia federal, a Operação Lava-jato, desvendou um esquema de lavagem de dinheiro envolvendo o ex-diretor de abastecimento da Petobras, Paulo Roberto Costa, e o doleiro Alberto Youssef. Ambos assinaram um acordo de delação premiada, com o objetivo de diminuir suas penas, e deram início a uma série de depoimentos, envolvendo políticos, funcionários públicos de alto escalão e as principais empreiteiras do país numa rede de corrupção.
As investigações da Polícia Federal aconteceram em 2014, ano eleitoral em que se disputava, entre outros cargos, a presidência da República. E os vazamentos das delações de Costa e Youssef – protegidas por segredo de justiça – foram divulgados na imprensa seguindo interesses partidários, especialmente os da oposição. O processo penal ganhou a imprensa na forma de revelações sem qualquer respaldo ou confirmação, em uma manobra para mudar o rumo das eleições, que indicavam a reeleição da presidenta Dilma Rousseff. O noticiário, porém, desgastou a presidente da Petrobras, Graça Foster, que acabou substituída por Aldemir Bendine, no dia 6 de fevereiro de 2015.
Em maio de 2015, a Polícia Federal havia indiciado 22 pessoas ao Ministério Público Federal e haviam sido expedidos mais de setenta mandatos de prisão preventiva desde o início das investigações.