Bebês usam mãos direita e esquerda induzidos pelo ambiente

Tarefas com crianças mostraram que preferência manual para algumas atividades pode ser influenciada.

Tarefas com crianças mostraram que preferência manual para algumas atividades pode ser influenciada

Por Paula Thiemy, da Agência Universitária de Notícias (AUN/USP)

A crença de que as pessoas nascem para ser destras ou canhotas é comum, mas ao contrário do que muitos pensam, a preferência manual pode ser influenciada pelo uso. Em um estudo desenvolvido na Escola de Educação Física e Esporte da USP, o professor Luis Teixeira e a colaboradora Juliana Garcia investigaram a lateralidade em crianças.

Em 2014, foi publicado um primeiro trabalho desenvolvido com bebês. Nele, os pesquisadores observaram que, a partir dos cinco meses, se um objeto fosse colocado do lado direito, o bebê o alcançava com seu braço direito. Se o mesmo fosse feito para o lado esquerdo, o braço utilizado era o esquerdo. Ou seja, não havia uma preferência manual definida e era possível induzir o uso de uma das mãos. Sabendo que era possível enviesar o ambiente, a próxima ideia foi descobrir se a preferência manual poderia ou não ser alterada.

Tarefas de alcançar, agarrar e encaixar foram testadas com seis crianças, de 4 e 5 anos. Todas eram destras, baseadas na mão utilizada para pintura. Primeiro foi feita uma tarefa probatória, de teste da manualidade, que é bastante utilizada. Nela, alvos são colocados em diferentes pontos do espaço, desde a extrema direita até a extrema esquerda, e o uso das mãos é avaliado. Segundo Luis, até a região mediana e uma posição depois, o uso da mão direita era mais frequente. Depois, a mão não preferida começou a ser utilizada, em função da proximidade até o alvo. A prática, então, começou de fato.

“Testamos a ideia em crianças, usando a estratégia de induzir a preferência manual, tentando criar um ambiente com validade ecológica. Fizemos a avaliação com cartas. Elas ficavam encaixadas em suportes, de forma que a estratégia era colocá-las em diferentes pontos do espaço e a criança era livre para escolher a mão que queria para pegar a carta e colocar em um orifício. Precisava alcançar, agarrar e fazer o encaixe. Elas foram expostas durante cinco sessões de 20 minutos. Nesse tempo, a colaboradora propunha várias tarefas em que a criança tinha uma mesa em formato semicircular e todo o equipamento era colocado no lado esquerdo. Então, o ambiente foi enviesado para a esquerda, mas nada foi dito”, contou Luis.

Foram feitas avaliações antes da prática, imediatamente depois e duas semanas depois. Foi observada uma mudança da preferência manual, não apenas em uma tarefa específica, mas em outras que envolviam movimentos parecidos de alcance e apreensão. A explicação dos pesquisadores é baseada na similaridade das tarefas motoras.

“A preferência manual muda para a tarefa que foi praticada e muda para outras semelhantes, relacionadas as que elas fizeram. É uma mudança que tem certa generalidade. Mostramos que a lateralidade é algo maleável, se você pratica melhora, chegando a desempenhar melhor do que com a mão preferida”, refletiu o professor.

O resultado, porém, não se estendeu a outras duas tarefas. As crianças precisaram contornar o desenho de uma estrela e rosquear a tampa em um pote, mas continuaram escolhendo a mão preferida. A situação, no entanto, não invalida o estudo e mostra que, por ser um componente maleável, a preferência manual pode ser moldada através da prática. Se uma pessoa começa a usar a mão esquerda para algo, desenvolverá confiança para utilizá-la em outras tarefas, e a partir daí poderá desenvolver preferências específicas.

“Não excluímos algumas vantagens genéticas. Existe uma série de estudos que investigam o desempenho motor da mão direita ou esquerda, mas o histórico de uso é capaz de superar uma vantagem inata em algumas tarefas”, finalizou Luis Teixeira.

Publicação original em AUN/USP