ALFABETIZAÇÃO MIDIÁTICA

 

Resenha do Artigo “Alfabetização Midiática na era da desinformação” de Egle Müller Spinelli e Jéssica de Almeida Santos

Por Maria de Fátima Morina

 

O artigo “Alfabetização Midiática na era da desinformação” foi publicado neste ano na revista ECCOM – Educação, Cultura e Comunicação – pela jornalista, docente e doutora em ciências da comunicação Egle Müller Spinelli e pela mestra em jornalismo Jéssica de Almeida Santos no auge de volume e de impacto das “fake news”, das “deep fakes” e das pós-verdades. O objetivo das autoras foi investigar a finalidade de alfabetizar midiaticamente estudantes para compreender e produzir comunicação com base em pesquisa bibliográfica e em entrevista com especialistas em educação e jornalismo.

O artigo completo é atual e extremamente interessante não só para quem estuda Educomunicação, mas também para Professores das diversas disciplinas, pais corujas e principalmente para os poderes públicos que deveriam ser os mais engajados no desenvolvimento e no esclarecimento dos cidadãos mediante o atual consumo indiscriminado, compulsivo, desavisado e acrítico de informação.

Nesse sentido, o diálogo entre teóricos proporcionado pelas autoras é interessante a começar por Martín-Barbero que há 20 anos já previa a configuração de um ecossistema comunicativo essencial para a vida em sociedade multiconectada a misturar privado e público, local e global, e a dar a mídia um papel inevitável no aculturamento, na moralização e na sociabilização das pessoas. Tal contexto afeta a todos, mas, segundo as autoras, particularmente as crianças, a ponto de mudar radicalmente o entendimento do que é infância contemporaneamente – “uma geração que cresce na rede em rede”.

Consequentemente, as autoras alertam que tal sobrecarga de informação pode cegar ao invés de informar ou formar. Por isso, dão grande destaque para diversas pesquisas sobre o efeito dessa configuração social principalmente em crianças e adolescentes que hoje também são consumidores ávidos por notícias e atribuem mais confiabilidade às redes sociais do que aos pais e professores. Paralelamente a isso, as pesquisadoras deixam evidente que o jornalismo hoje vive uma crise de credibilidade e, ao mesmo tempo, concorre com as notícias que podem ser e são produzidas e divulgadas pelo cidadão comum por redes sociais virtuais – o que democratiza a comunicação em geral e a denúncia independente, mas também abre espaço para a propagação exponencial de boatos, que aliás já resultaram até em mortes.

Nesse contexto, a parte mais rica do artigo é a compilação crítica de diversas ações práticas de alfabetização midiática no Brasil e no mundo, variando a abrangência, o agente responsável e inclui concursos, campanhas, cursos de formação de multiplicadores, cursos de produção jornalística, cursos de graduação em pedagogia e letras que incluem a alfabetização midiática, sensibilizações para a leitura crítica das mídias, softwares de identificação de fake news, softwares que evidenciam diferenças de linha editorial e ideológica e etc.:

  • Brasil:
    • O Colégio Stokler – diversos projetos;
    • A Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo criou o projeto Imprensa Jovem;
    • O jornal A Tarde promove o concurso “Jovens Jornalistas: Um Buraco na Imprensa”;
    • Associação Nacional dos Jornais;
    • O jornal Correio Lageano em parceria com estudantes em Maratona do Conhecimento;
    • O jornal Gazeta do Povo criou cursos MOOC para professores;
    • O jornal O Joca é uma publicação on-line e impressa para jovens e crianças;
    • A agência Lupa lançou um programa com o Canal Futura e com o Google;
    • A ONG Repórter Brasil e o Facebook financiaram o curso online Vaza Falsiane (testei, recomendo);
    • O Instituto Palavra Aberta em parceria com a Nova Escola e também com a UNESCO.
  • Reino Unido:
    • Os jornais The Times e The Sunday Times em parceria com as escolas;
    • O grupo de comunicação BBC em parceria com 700 escolas e faculdades – com destaque para a BBC News, a BBC Academy, a BBC Childrens e a BBC Sport, que criaram o School Report;
    • O Center for Argument Technology da University of Dundee, juntamente com a BBC Radio, o BBC School Report e os responsáveis pelo software Moral Maze desenvolveram juntos o software Evidence Toolkit, que utiliza Inteligência Artificial;
    • A Dundee University desenvolveu o software Taster.
  • EUA:
    • O programa PBS NewsHour Student Reporting Labs, em parceria com professores e a emissora pública americana, que conecta alunos à PBS local;
    • O American Press Institute, em parceria com a World Association of Newspapers and News Publishers, reúne 130 projetos para crianças e adolescentes em 40 países;
    • O jornal The New York Times criou o programa Learning Network;
    • O jornal The Washington Post criou o programa Newspaper in Education.
  • Outros países:
    • Argentina: Press Freedom Day;
    • França: Semana Nacional de Notícias e Mídia de 2016 – Journal des Enfants;
    • Finlândia: Ilta Sanomat e os principais jovens blogueiros e estrelas do YouTube – “#Kupla”;
    • Espanha: O jornal El País programa El País de los Estudiantes.

Além desse aporte fundamental do atual estado da arte da alfabetização midiática ou “media literacy”, as autoras concluem as perspectivas de crescimento do problema nos próximos anos e os seus desdobramentos, bem como as muitas possibilidades de ação educomunicativa – embora não usem esse termo. Adorei o artigo!

 

 

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