Um espaço para poesia
PÍLULA LITERÁRIA
Um espaço para poesia
Foi Ferreira Gullar, escritor brasileiro, quem nos presenteou com a frase “a arte é feita porque a vida não basta”. Certo, a arte acrescenta à vida, mas…? Como assim, “a vida não basta”? O que isso quer dizer? Se nem o próprio Ferreira Gullar deu conta de explicar isso, que podemos nós, simples mortais, fazer diante dos grandes e metafóricos mistérios da poesia? Bem, talvez a questão seja que nenhuma explicação vai dar conta, nunca. E tudo bem. Na verdade, é exatamente essa a graça. Há coisas às quais só mesmo a arte parece conseguir dar voz. Notem, a arte nos atravessa de outras maneiras. Parece fazer o impossível quando, diante das nossas mais angustiantes inquietações, ela consegue dizer algo que sequer saberíamos dizer. E, assim, nos permitimos repousar, enfim. (Já que aqui estamos em um boletim para psicólogos: não há então um quê de poético nos processos terapêuticos, se pensarmos assim?) A intenção dessa pequena coluna pilúla-literária é trazer pequenos textos que possam fomentar reflexões, arejar pensamentos e, quem sabe, nos desassossegar onde for preciso. Não à toa, este primeiro vem do Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa: “Os sentimentos que mais doem, as emoções que mais pungem, sãos os que são absurdos – a ânsia de coisas impossíveis, precisamente porque são impossíveis, a saudade do que nunca houve, o desejo do que poderia ter sido, a mágoa de não ser outro, a insatisfação da existência do mundo. Todos estes meios-tons da consciência da alma criam em nós uma paisagem dolorida, um eterno sol-pôr do que somos.”