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Descanso

Daquelas palavras que ficam subitamente mais interessantes quando pensamos que, só pela grafia, não temos como saber se estamos diante de um substantivo ou de um verbo na primeira pessoa. E que carregam consigo tantas possibilidades quanto nossa experiência alcançar.

Descanso no sono, mas nem sempre, porque às vezes sofremos de sonhos. Descanso em casa depois de um dia de trabalho, mas quando a casa é o trabalho e o trabalho é em casa, às vezes nela nos pomos mesmo é a desdescansar. E aí, às vezes, é no trabalho que (há) descanso.

Experiência rara é conseguir só estar, que aí o lugar parece que pouco importa. É rara, mas é boa. E nela, descanso.

Olho pela janela o infalível pôr-do-sol. Descanso do tempo.

Olho para o outro: descanso de mim

Texto por Mariana  R. Stefani

 

Então minha própria sede guiou-me. Eram 2 horas da tarde de verão. Interrompi meu trabalho, mudei rapidamente de roupa, desci, tomei um táxi que passava e disse ao chofer: vamos ao Jardim Botânico…

Eu ia ao Jardim Botânico para quê? Só para olhar. Só para ver. Só para sentir. Só para viver. Saltei do táxi e atravessei os largos portões. A sombra logo me acolheu. Fiquei parada. Lá a vida verde era larga. Eu não via ali nenhuma avareza: tudo se dava por inteiro ao vento, no ar, à vida, tudo se erguia em direção ao céu. E mais: dava também o seu mistério.

Clarice Lispector, o ato gratuito
(sugestão de Maria da Conceição Uvaldo)