Terapia para AIDS pode causar doenças cardiovasculares

Estudo comprovou que porcentagem de gordura aumenta nos pacientes acometidos pelo efeito colateral da má distribuição de gordura no corpo.

Estudo comprovou que porcentagem de gordura aumenta nos pacientes acometidos pelo efeito colateral da má distribuição de gordura no corpo.

Por Isabella Vitoria Galante Amaral, da Agência Universitária de Notícias (AUN/USP)

Um grupo, do Núcleo de Apoio à Pesquisa em Retrovírus, publicou uma pesquisa em 2015 que mostra que o tratamento antiretroviral, chamado de Haart (Highly Active Antiretroviral Therapy), tem grande eficiência em controlar o espalhamento do vírus e evitar infecções fatais, mas seus efeitos colaterais são fortes e causam, muitas vezes, resistência ao uso dos medicamentos. As reações adversas podem ser diarreia, vômitos, manchas avermelhadas pelo corpo, insônia, danos no fígado, entre outras. Para o estudo em questão, foi avaliado a sequela da síndrome da lipodistrofia (LDS), ou seja, a mudança na distribuição de gordura pelo corpo.

Apesar da inicial perda de peso pela falta de apetite e em razão das doenças oportunistas que causam debilidade, os enfermos que adotam a medicação mostraram uma prevalência de sobrepeso e obesidade abdominal. Isso se deve à má distribuição dos lipídeos no corpo.

Esse evento adverso afeta a autoestima e interfere na aderência ao tratamento. Um estudo anterior constatou que 33% dos soropositivos investigados não teriam começado a terapia se soubessem da sua aparência futura, mesmo conhecendo os riscos à saúde.

A LDS ocorre de forma a acumular adiposidade no abdômen, pescoço e mamas, que se expandem, e há perda do tecido subcutâneo na região do rosto, pernas e braços. Os indivíduos tendem a apresentar os efeitos de maneira isolada, porque sua combinação é pouco comum. As alterações mais graves têm correção por cirurgias plásticas, podendo ser a lipoaspiração ou o preenchimento. Elas são oferecidas gratuitamente em várias unidades da rede pública de saúde do País.

A lipodistrofia na face é o tipo mais comum. A foto acima exibe o antes e depois de pacientes que passaram pela cirurgia de preenchimento. Créditos: agenciaaids.com.br

Antes e depois da cirurgia de preenchimento na face. Créditos: agenciaaids.com.br

Os pesquisadores analisaram 227 pessoas contaminadas pelo HIV. Dentre elas, estabeleceram uma comparação dos que estavam usando a Haart e notaram a lipodistrofia, os que não a constataram, e os que não tomavam medicamentos antiretrovirais. Observou-se que os grupos sob intervenção terapêutica apresentaram significativa perda de tecido adiposo em relação aos que não passavam pelo mesmo procedimento. “Assim como os pacientes que reportaram a LDS tinham um risco maior de desenvolverem doenças cardiovasculares”, afirma Jorge Casseb, coordenador do NAP.

As mudanças corporais foram observadas entre 20 e 80% dos indivíduos que aderem ao Haart. Elas acontecem, aproximadamente, entre seis e 24 meses após o início da terapia. Devido ao acúmulo de gordura, os enfermos ganham peso (constatado pelo alto IMC, que deve ser acompanhado por outras medições), e consequentemente a obesidade abdominal influencia nos problemas cardiovasculares. Esses resultados têm uma prevalência de forma mais impactante nas mulheres.

Não há um consenso sobre a prevenção da LDS. Contudo, a Organização Mundial da Saúde indica que a nutrição e a boa dieta alimentar façam parte do tratamento do HIV para que ele seja mais efetivo (sua importância já foi atestada em reportagem da AUN/USP). Além disso, tem que estar acompanhada por exercícios físicos, amenizando, assim, a acumulação de gordura.

Existem cerca de 734 mil pessoas vivendo com a AIDS no Brasil. Ainda que as sequelas da medicação sejam desconfortáveis, nem todas sofrem a lipodistrofia. O medicamento é imprescindível para assegurar a vida do paciente e estabilizar sua carga viral. Ademais, a identificação precoce das mudanças corporais pode ajudar a estabelecer as intervenções adequadas para o tratamento dessas reações, proporcionando melhor qualidade de vida.

Publicação original em AUN/USP