Pré-aquecimento do ar antes de sua entrada na câmara de combustão permite combustão mais homogênea a temperaturas mais baixas, o que torna as emissões de NOx quase desprezíveis.
Politécnicos ligados ao Centro de Pesquisa para Inovação em Gás Natural (“Research Centre for Gas Innovation” – RCGI na sigla em inglês) estão estudando modificações no processo de combustão de gás natural para diminuir as emissões de óxidos de nitrogênio (NOx), considerados poluentes atmosféricos. A ideia da combustão “sem chama” está associada, neste caso, a um processo mais homogêneo de queima do combustível, a temperaturas mais baixas, o que evitaria a formação dos NOx.
[custom_blockquote style=”green”] “A gente vê a chama porque, numa queima convencional, há regiões em que as reações são mais intensas: regiões de espessura fina e de temperatura muito alta. E no entorno dessas regiões, não há a mesma intensidade de ocorrência de reações. Então, nós só vemos a chama porque o ambiente em que se dá a combustão não é homogêneo. Acontece que os NOx são formados exponencialmente em temperaturas elevadas. Portanto, a queda da temperatura também reduz de forma exponencial a formação deles”, explica Guenther C. Krieger Filho, que coordena o projeto Development of an Advanced Natural Gas Burner using the Flamless Oxidation Concept. [/custom_blockquote]
O objetivo de Krieger e sua equipe (mais dois engenheiros envolvidos no projeto) é, além de construir dois protótipos de queimadores sem chama, gerar, por meio deles, dados que poderão posteriormente alimentar modelos computacionais para projetar novos queimadores e novas câmaras de combustão. “Para realizar a combustão em temperaturas mais baixas é necessário pré-aquecer o ar antes dele entrar na câmara de combustão e promover, dentro da câmara de combustão, recirculações dos gases, de forma que toda a câmara se torne uma grande região de reação a baixas temperaturas. Ou seja: em vez de uma região na qual as reações se concentram, todo o conteúdo da câmara reage de maneira igual, permitindo uma combustão homogênea, e em temperaturas mais baixas, o que faz com que as emissões de NOx sejam praticamente desprezíveis.”
O engenheiro elenca mais uma vantagem da combustão sem chama: ela evita o escape de outros gases poluentes para a atmosfera, como o próprio metano, contido no gás natural. “No caso da combustão convencional, um poluente que passou pela região da chama, a região mais intensa, e não reagiu por algum motivo, em geral associado à turbulência, ele não vai queimar mais: vai ser emitido para a atmosfera. Ao passo que se conseguirmos garantir uma combustão mais homogênea, reduzimos muito essa possibilidade.”
A equipe quer aplicar a técnica em turbinas a gás. “Nós vamos construir um queimador demonstrador, em nível laboratorial, e vou tentar montá-lo na microturbina a gás que fizemos aqui no nosso laboratório aqui no Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP. Mas a ideia não é só obter o queimador, e sim saber como ele funciona para poder inclusive, se for o caso, projetar um maior.”
Krieger adianta que, apesar de não existirem fabricantes de turbinas a gás no Brasil, é importante contribuir para o estudo do tema. “Eu noto que há demanda pela investigação de processos de combustão inovadores, especialmente interessantes para o setor de geração de energia (termelétricas) – um mercado regulamentado e que tem de reduzir emissões. Se estudarmos esses processos, vai haver interesse e é possível que surjam parcerias.”
O primeiro protótipo será entregue em um ano. “Trata-se de um modelo sem acesso ótico (janelas de quartzo), que servirá para nos certificarmos de que realmente conseguiremos operar esse tipo de queimador.” Entre o segundo e o terceiro ano, será montado um outro protótipo, com janelas de quartzo ou safira que permitam a penetração de feixes de laser para medir o que acontece durante a combustão.
Toda a parte experimental será desenvolvida no Laboratório de Diagnóstico Avançado para Combustão, cuja montagem é o objetivo de um dos projetos executados no âmbito do RCGI. “O laboratório será um centro multiusuário, ou seja: grupos de pesquisa que tiverem demanda para usar poderão fazê-lo, mesmo não sendo do RCGI nem da Poli, desde que apresentem sua proposta e ela também seja interessante para nós. Queremos que mais gente use, que as demandas apareçam”. O laboratório está sendo equipado com diversos tipos de diagnósticos a laser, que permitem análises acuradas dos processos de combustão estudados.