Resultados foram obtidos por meio de modelos matemáticos que gerenciam a utilização de geradores a diesel e de baterias; sistema foi validado em embarcações reais.
Pesquisadores do Centro de Pesquisa e Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), da Universidade de São Paulo (USP), foram capazes de demonstrar uma redução potencial em mais de 15% das emissões de poluentes de navios de suporte a plataformas (PSVs, na sigla em inglês) diesel-elétricos. O resultado foi possível por meio do desenvolvimento de modelos matemáticos que simulam o funcionamento do trem de potência das embarcações e das emissões geradas. Os modelos também possibilitaram otimizar a utilização dos geradores a diesel embarcado, de forma a usar o combustível de forma mais eficiente, além de gerenciar a utilização de baterias de íon de lítio.
Os PSVs são embarcações comuns na indústria de óleo e gás, utilizadas para transportar suprimentos dos portos para as plataformas. No modelo diesel-elétrico, elas funcionam à base de um conjunto de geradores que, através da combustão de óleo diesel, produzem a energia elétrica necessária para a locomoção do navio.
Por meio de dados obtidos de uma embarcação real, foram desenvolvidos dois modelos matemáticos do trem de potência de um PSV diesel-elétrico. Um utilizando o software HOMER PRO, para fazer as estimativas de todo o curso conhecido da viagem, e outro utilizando o software MATLAB, para monitorar e gerenciar o trem de potência (sem conhecimento) das condições e manobras futuras. Os resultados obtidos com simulações foram validados com dados de viagens efetuadas por uma embarcação real — o principal diferencial da pesquisa. O estudo foi publicado na revista Applied Energy.
“Os modelos para geradores dão comandos de quando acioná-los, diminuir ou aumentar a potência de acordo com as condições da viagem. Já os modelos para as baterias as ligam ou desligam com base nesses fatores e na quantidade de carga. Também analisamos qual o tamanho de bateria que deve ser instalado, uma vez que cada navio necessita de um tamanho específico para obter os melhores resultados”, explica Bruno Souza Carmo, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP, diretor do Programa de Descarbonização do RCGI e coordenador da pesquisa.
Os dados prévios das embarcações e a validação do modelo de geradores foram fruto de uma parceria com uma empresa do setor naval que compartilhou, por cinco meses, dados de telemetria — ferramenta que coleta diversas informações das embarcações em tempo real, como os níveis de emissões de gases na atmosfera, por exemplo.
Redução significativa das emissões – “No estudo, constatamos que as emissões registradas em campo eram as mesmas calculadas pelo nosso modelo, o que validou o algoritmo para o uso em geradores. Já os modelos das baterias foram validados com base em dados da literatura, pois os navios que acompanhamos ainda não utilizavam esse equipamento, que é novo no mercado”, afirma o coordenador do projeto. “Só com a otimização dos geradores, conseguimos reduzir as emissões em 10%. Ao adicionar as baterias ao modelo, conseguimos reduzir mais 5%”, complementa.
Esses resultados são a soma do volume de redução de três poluentes que compõem as emissões das embarcações. O dióxido de carbono (CO2) foi o gás com redução mais significativa. Seus níveis diminuíram entre 16% e 26%, dependendo da carga do gerador utilizada e da configuração aplicada, uma vez que foram analisadas diversas viagens. Também houve uma redução alta nas emissões de materiais particulados, que são uma mistura de diversos poluentes, sólidos ou líquidos, enviados à atmosfera. Nesse quesito, a queda variou de 25% a 65%.
Todavia, para os óxidos de nitrogênio (NOx), houve um aumento de até 20% das emissões em alguns testes, apesar de ter havido uma redução de até 6% em outras. “Isso infelizmente acontece porque, para otimizar a eficiência energética dos geradores, aumentamos a temperatura de combustão, o que favorece a formação desse gás. Porém, é possível corrigir esse problema com catalisadores — uma solução já usada na indústria automobilística e que sofre do mesmo problema”, explica Carmo.
Mudança urgente – Segundo o coordenador da pesquisa no RCGI, a aplicação das tecnologias desenvolvidas pelo seu grupo é viável para a indústria naval porque não exige grande investimento. “Existem empresas que já comercializam sistemas e baterias visando essa adequação. Isso não seria demasiadamente custoso. O maior gasto estaria na interrupção da operação do navio para fazer as adaptações e os testes de segurança, o que não é prática recorrente da indústria, que opera com os mesmos navios, sem alterações, há muitos anos”.
O setor naval é responsável por aproximadamente 3% das emissões totais de gases do efeito estufa, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas). Sendo assim, se essa indústria fosse um país, ela estaria entre os onze maiores emissores do mundo. “É um setor que emite muito porque ainda é muito dependente de combustíveis fósseis e os utiliza em grandes quantidades”, analisa Carmo.
As emissões não só são altas como tendem a aumentar. De acordo com relatório da IMO (Organização Marítima Internacional), da ONU, publicado em 2021, elas cresceram 18,1%. Além disso, pesquisadores estimam que, se nada for feito, o número tende a triplicar entre 2020 e 2050. Desta forma, a IMO estabeleceu como meta uma redução de pelo menos 40% até 2030.
“Boa parte dessas metas é algo que ainda está distante de ser alcançado, uma vez que se trata de uma indústria pouco ágil, que opera com os mesmos navios por décadas. No entanto, apenas com as sugestões que trouxemos em nossos estudos, já se consegue um grande avanço”, finaliza o diretor do Programa de Descarbonização do RCGI.