RACISMO ALGORÍTMICO: O racismo estrutural

Por Léo Vitor Utida

 

O ano de 2020 está sendo marcado por diversas convulsões sociais e levantes populares no mundo, tendo os protestos do movimento Black Lives Matter um de seus pontos altos. As mobilizações iniciadas na cidade estadunidense Minneapolis, respostas ao assassinato de George Floyd por um policial branco, se espalharam pelo mundo todo e levaram ao debate público uma série de discussões acerca da violência policial e, sobretudo, da questão racial no Ocidente. A busca pela compreensão da condição dos racializados no Brasil pôde ser notada pela alta nas vendas de autores como Djamila Ribeiro, Silvio Almeida e Frantz Fanon (1).

E é neste contexto que a discussão acerca do racismo algorítmico também ganhou destaque nas redes, após um programador notar que o algoritmo do Twitter privilegiava pessoas brancas no recorte automático de imagens (2). Por mais que o debate não seja exatamente novidade, sobretudo na academia, ainda é embrionário entre o público geral,  tendo o contexto contribuindo para que aquele florescesse. Deve-se notar, por exemplo, que o assunto ganhou repercussão num espaço ainda limitado, o Twitter, e não teve grande destaque em veículos de imprensa que circulam fora do meio virtual.

Para contribuir para o debate, faremos uma série de posts divididas em três partes: este primeiro post explicará o conceito de racismo estrutural. O segundo falará sobre a lógica por trás dos algoritmos e o terceiro a respeito do racismo algorítmico em si.

 

O QUE É RACISMO ESTRUTURAL?

Ao se falar de racismo estrutural, o filósofo Silvio Almeida (3) é uma referência no assunto no Brasil. O autor define racismo como “uma forma sistemática de discriminação que tem a raça como fundamento, e que se manifesta por meio de práticas conscientes ou inconscientes que culminam em desvantagens ou privilégios para indivíduos, a depender do grupo racial ao qual pertençam.” (ALMEIDA, 2018, p. 25). Desta definição, duas coisas devem ser destacadas: o racismo se materializa por meio de práticas — que o autor define como discriminação racial — e, mais importante, estas podem ocorrer de forma inconsciente e, portanto, não intencional. Isso indica que não se trata da intenção do discurso ou da ação de quem o faz, mas das consequências que isso causa, não isentando aqueles que alegavam desconhecer as implicações de suas ações. Segundo Almeida (2018), tais práticas levariam a longo prazo à estratificação social de certos grupos raciais, dificultando as chances de ascensão social e reconhecimento na sociedade.

No entanto, se por um lado a ignorância de quem comete uma prática discriminatória não o isenta de suas consequências, tampouco o filósofo acredita que centrar a visão do problema nos indivíduos ou nas instituições que os formam seja suficiente. É neste sentido que é apresentada a concepção estrutural do racismo:

As instituições são apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de socialização que tem o racismo como um de seus componentes orgânicos. Dito de modo mais direto: as instituições são racistas porque a sociedade é racista. (…) Não é algo criado pela instituição, mas é por ela reproduzido. (ALMEIDA, 2018, p. 36)

Entender o racismo enquanto um fenômeno estrutural, isto é, que constitui as bases das sociedades Ocidentais, implica compreender que práticas de discriminação raciais cometidas por um indivíduo ou reforçadas pelas escolas, imprensa e até mesmo tecnologias, como os próprios algoritmos, não são uma anomalia social. Muito pelo contrário, esta concepção entende que “o racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo ‘normal’ com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional.” (p. 38). É  dessa compreensão, portanto, que se entende que não é possível adotar uma postura de neutralidade e da necessidade de ações efetivamente antirracistas para não reproduzi-lo.

Mas afinal, o que significa na prática isso quando se fala de algoritmos? Como podem máquinas e uma ciência exata tomar lado nessa discussão? Nos próximos textos iremos investigar o funcionamento dos algoritmos e como o racismo pode sim estar presente nas máquinas.

 

 

 

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(1) https://blog.estantevirtual.com.br/2020/07/30/livros-de-djamila-ribeiro-e-silvio-almeida-estao-entre-os- mais-vendidos-de-julho/

(2) https://twitter.com/bascule/status/1307440596668182528

(3) https://www.youtube.com/watch?v=L15AkiNm0Iw

REFERÊNCIAS:

ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural?. Belo Horizonte (MG): Letramento, 2018.

 

 

 

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