Pesquisa
ARQUEOGENÉTICA DO BRASIL PRÉ-COLONIAL
Pesquisador responsável: Prof. Dr. André Strauss [info]
Tipo de pesquisa: Projetos Multidisciplinares
Dinâmicas populacionais, relações de ancestralidade, organização social e traços fenotípicos são aspectos bio-culturais do passado indígena que podem ser estudados através da arqueologia. No presente projeto serão geradas informações sobre esses temas através de duas novas disciplinas que se complementam mutuamente: a antropologia virtual e arqueogenômica. A partir desses métodos serão investigadas as seguintes questões da arqueologia brasileira: homogeneidade dos grupos produtores da cerâmica da Tradição Borda Incisa e da Tradição Aratu e sua relação com os grupos indígenas pós-coloniais, origem demográfica dos cacicados não-agrícolas Marajoara, presença de sinal australo-asiático (i.e. população Y) entre grupos sambaquieiros fluviais da região do Guaporé em Rondônia, estruturação populacional entre sambaquis costeiros do Sul e do Sudeste, relação dos sambaquis da costa com os sambaquis fluviais do médio Vale do Ribeira, implicações dêmicas da chegada dos grupos ceramistas à costa, consanguinidade dos grupos de afinidade descritos para sambaquis de Santa Catarina e relação de ancestralidade entre Paleoamericanos e Ameríndios atuais. Já foi obtida autorização de acesso para todas as coleções pertinentes.
A antropologia virtual conjuga o uso de modelos tridimensionais com análises de geometria morfométrica de alta resolução. Além de seu caráter estritamente analítico apresenta-se como nova ferramenta de gestão do patrimônio arqueológico.
Crânios, pars petrosa do temporal e dentes serão virtualizados com tomografias computadorizadas a partir das quais modelos tridimensionais serão extraídos. Análises de morfometria geométrica de alta densidade serão implementadas para avaliar as afinidades morfológicas do crânio e do labirinto ósseo. O crânio é uma estrutura anatômica complexa justificando testar se os vastos estudos feitos com medidas lineares são confirmados com uma abordagem tridimensional de alta resolução. Reconstruções faciais incorporando informações fenotípicas obtidas através da arqueogenômica serão geradas virtualmente a partir de modelos tridimensionais retrodeformados para remoção de deformação plástica.
O padrão de variabilidade anatômica do labirinto ósseo também contém informação microevolutiva e como ele é resistente à passagem do tempo apresenta-se como alternativa para contextos de fragmentação intensa. Todas essas análises são inéditas no Brasil. A arqueogenômica constituí um campo de interface entre as ciências humanas e biológicas que se dedica ao estudo de uma categoria específica do registro arqueológico: o ácido desoxirribonucleico (DNA). Permite qualificar de forma precisa a constituição genética de grupos pré-coloniais, estimar parâmetros demográficos, datar eventos de coalescência, identificar relações consanguíneas e estimar traços fenotípicos. O mtDNA antigo será extraído no primeiro laboratório exclusivamente dedicado à arqueogenômica no país a ser estabelecido no LAAAE-USP com acompanhamento do Instituto Max Planck, na Alemanha.
Análises de isótopos de estrôncio de esmalte dentário informam sobre proveniência geográfica e padrões de mobilidade e irão complementar a caracterização das dinâmicas populacionais pretéritas. Todas as análises dependem de um contexto cronológico robusto que será obtido através do modelamento bayesiano de datações radiocarbônicas de colágeno filtrado para contaminantes. Escavações enfatizando o registro espacial, documentação tridimensional e exumação detalhada serão realizadas no único sambaqui de grande porte do Espírito Santo, estado onde inexistem esqueletos humanos de origem arqueológica com contexto associado, e em Pains, região onde existem esqueletos diretamente datados em mais de 9000 anos.
Os dois sítios serão estudados sob uma ótica geoarqueológica microcontextual. Será feita uma etnografia arqueológica para identificar a melhor forma com que o projeto poderá contribuir com as comunidades locais.