Cinco anos de vigência do “Novo Código Florestal”
Luís Gustavo Santos Lazzarini
A Lei 12.651/2012 completa cinco anos nesta quinta-feira (25/5). A Lei de Proteção da Vegetação Nativa substituiu o Código Florestal (Lei nº. 4.771/1965) e trouxe mudanças significativas no regime jurídico de seus principais institutos de uso da terra e proteção florestal, como a Área de Preservação Permanente (APP) e a Reserva Legal (RL). Além disso, dispõe sobre mecanismos de estímulo à regularização de passivo florestal, como o Cadastro Ambiental (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental (PRA). Para tanto, prevê a possibilidade de utilização de instrumentos econômicos de política ambiental, tais como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e as Cotas de Reserva Ambiental (CRA).
Durante a tramitação dos projetos de lei que resultaram na Lei 12.651/2012, as discussões sobre a atualização da legislação florestal foram intensas e polêmicas, sobretudo a partir de 2010, com a apresentação do parecer pelo relator, o Deputado Aldo Rebello. Neste contexto, uma das principais críticas foi a pouca participação da comunidade científica no debate sobre as consequências da flexibilização sobre os instrumentos de proteção ambiental, como a redução das APPs e alterações no regime da Reserva Legal. Por outro lado, a sistematização de instrumentos normativos para mapeamento e regularização de passivo florestal, como o CAR e o PRA, teve aceitação pela maior parte dos setores envolvidos.
A despeito dos pontos criticáveis e acertos da nova lei florestal, um balanço preliminar de seus resultados nestes cinco anos indica um cenário de incertezas sobre seu conteúdo, de dúvidas sobre seus instrumentos e de morosidade quanto à sua implementação.
Para impugnar mudanças no regime de proteção florestal, a Procuradoria-Geral da República ingressou com três Ações Diretas de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, em janeiro de 2013. Estas ações questionam a constitucionalidade de alguns dispositivos que implicam retrocesso ambiental, como a anistia aos proprietários que desmataram irregularmente áreas florestadas e as flexibilizações no regime jurídico da Reserva Legal e das APPs. Em abril de 2016, por solicitação do relator destas ações, o Ministro Luiz Fux, foi realizada audiência pública para discutir questões técnicas sobre a aplicação da legislação florestal e suas consequências econômicas e ambientais. Entretanto, as ações ainda não foram julgadas, deixando dúvidas se as modificações da nova lei serão (ou não) mantidas.
Quanto aos mecanismos de regularização ambiental, a dificuldade é operacional. O Cadastro Ambiental Rural e o Programa de Regularização Ambiental são dois importantes instrumentos de mapeamento ambiental e de fomento à regularização ambiental. O CAR é um registro eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, destinado a integrar informações ambientais. O PRA, por sua vez, é programa de adesão voluntária para que o interessado, após inscrição no CAR, regularize o passivo florestal de seu imóvel rural, dentro de condições e prazos pré-estabelecidos. A Lei nº. 12.651/2012 estabeleceu diretrizes gerais sobre o PRA, mas atribuiu aos Estados a competência para sua regulamentação, execução e fiscalização.
Porém, se a lei tinha a intenção de estimular a regularização ambiental por meio da inscrição no CAR e adesão ao PRA, o alcance de resultados esbarra na dificuldade de implementação destes mecanismos. O prazo final de inscrição no CAR já foi prorrogado por duas vezes – atualmente o prazo final é dezembro/2017 e pode ser prorrogado até dezembro/2018. A atuação em conjunto de diversos órgãos, como Prefeituras, Casas de Agricultura, sindicatos rurais e entidades de extensão rural, permitiu o cadastro da maioria dos imóveis rurais no País. Porém, problemas relativos a imprecisões nos cadastros, como a sobreposição de áreas, podem prejudicar um mapeamento preciso das áreas ambientais nos imóveis rurais.
A situação do PRA é mais incerta. Há Estados que sequer regulamentaram seus PRAs, o que dificulta a regularização florestal pelos proprietários rurais. E, em alguns Estados que já regulamentaram o PRA, há ações judiciais questionando dispositivos contrários à lei federal. No Estado de São Paulo, por exemplo, o PRA está suspenso por força de decisão judicial desde maio de 2016.
Há, ainda, a falta de regulamentação, em âmbito federal, de instrumentos econômicos previstos para contribuir para a efetividade da Lei de Proteção de Vegetação Nativa, como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e as Cotas de Reserva Ambiental (CRA). Embora atualmente existam alguns programas estaduais e municipais de PSAs, sua utilização como instrumento da Lei nº 12.651/2012 ainda não foi regulamentada em nível federal. As CRAs também passam pela mesma dificuldade: não há regras em âmbito nacional quanto ao procedimento e negociação de ativos ambientais, dentro do contexto da legislação florestal federal.
As dúvidas quanto ao resultado do julgamento das ações pelo Supremo Tribunal Federal e as incertezas quanto ao funcionamento do PRA e dos instrumentos econômicos prejudicam um balanço preciso dos resultados que poderiam ser esperados após cinco anos de vigência da Lei de Proteção das Vegetações Nativas. E esta insegurança implica questionamentos sobre a aplicação da legislação federal atual, que buscou corrigir déficits de efetividade da legislação anterior. Vale lembrar, ainda, que a Lei nº. 12.651/2012 é instrumento chave para o cumprimento das metas de redução de emissões assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris, em 2015.
Por isso, após cinco anos, o grande desafio é implementar os instrumentos de regularização dos imóveis rurais, principalmente por meio de ações para viabilizar o funcionamento do PRA. Nesta linha, é importante que os Estados estabeleçam programas de regularização consoante as diretrizes gerais fixadas pela lei federal, para evitar questionamentos judiciais. Por fim, com relação às ações que aguardam julgamento no STF e aquelas que impugnam programas de regularização em âmbito estadual, também é necessário que sejam apreciadas e julgadas em tempo razoável pelo Poder Judiciário. Talvez, em 2022, seja possível avaliar de forma mais precisa o funcionamento e resultados da Lei 12.651/2012.
Publicado originalmente em: https://jota.info/artigos/cinco-anos-de-vigencia-do-novo-codigo-florestal-25052017