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Cataratas de Kaieteur, no Parque Nacional de Kaieteur, região central da Guiana (Soren Riise/Creative Commons)

Guiana

Rodrigo Nobile (texto original da versão impressa)

Mônica Rodrigues (texto de atualização do verbete, 2006-2015)

Nome oficial Cooperative Republic of Guyana
Localização Norte da América do Sul, banhada pelo oceano Atlântico ao Norte, fronteira à leste com o Suriname e a oeste com a Venezuela
Estado e Governo República presidencialista
Idiomas¹ Inglês (oficial), crioulo, línguas ameríndias, chinês e línguas indianas (incluindo o hindustani caribenho, dialeto do hindi)
Moeda¹ Dólar da Guiana
Capital¹ Georgetown
(124 mil hab. em 2014)
Superfície¹ 214.969 km²
População² 786.126 hab (2010)
Densidade
demográfica²
3,7 hab./km² (2010)
Distribuição
da população³
Urbana (28,24%) e
rural (71,76%) (2010)
Analfabetismo³ 11,5%, (2015)
Composição étnica¹ Indianos do leste (43,5%), negros (30,2%), mestiços (16,7%), amerindios (9,1%), outros (0,5%, inclui portugueses, chineses, brancos) (2002)
Religiões¹ Protestantes (30,5%), hindu (24,8%), católica romana (8,1%), islâmica (7,2%), testemunhas de Jeová (1,1%), outras cristãs (17,7%), outras (1,9%), nenhuma (4,3%), não especificadas (0,9%) (2002)
PIB (a preços constantes de 2010)⁴ US$ 26,27 bilhões (2013)
PIB per capita
(a preços
constantes
de 2010)⁴
US$ 3.285,6 (2013)
Dívida
Externa Pública⁴
US$ 1,247 bilhões (2013)
IDH⁵ 0,638 (2013)
IDH no mundo
e na AL⁵
121° e 27°
Eleições¹ Presidente eleito por voto popular como líder do partido mais votado nas eleições parlamentares, que ocorrem a cada 5 anos. Primeiro-Ministro e Gabinete Ministerial nomeados pelo Presidente. Legislativo unicameral de 65 membros eleitos direta e proporcionalmente, com 25 em 10 distritos eleitorais plurinominais e 40 num distrito único nacional, cumprindo mandato de 5 anos.
Fontes:
¹ CIA. World Factbook
² ONU. World Population Prospects: The 2012 Revision Database
³ ONU. World Urbanizations Prospects, the 2014 Revision
⁴ CEPALSTAT
⁵ ONU/PNUD. Human Development Report, 2014

 

Situada no norte da América do Sul, a Guiana tem uma história marcada por intensos fluxos migratórios e lutas sociais. Africanos, chineses, indianos, portugueses e colonizadores europeus (ingleses, holandeses e franceses) chegaram em grande número e se dedicaram a distintas atividades. Apenas para dimensionar esse fluxo, estimativas apontam que cerca de 43% da população guianense é descendente de indianos do leste, fato único em um país do continente. A Guiana é um dos países etnicamente mais diversificados da região. É o único país anglófono da América do Sul, e na área continental latino-americana compartilha essa peculiaridade somente com Belize, da América Central. Nela fala-se também o hindu, o urdu e várias línguas ameríndias.

Outra peculiaridade pouco conhecida do país foram as disputas de cunho ideológico, ligadas à adoção de políticas socialistas. Entre fins da década de 1960 e de 1980, houve um intenso processo de estatizações e planejamento econômico, que culminaram com o controle de cerca de 75% da atividade econômica por parte do Estado. As diversidades raciais, culturais e ideológicas não foram administradas de forma pacífica, combinando episódios de repressão e de intervencionismo por parte das potências e dos exílios forçados.

A Guiana divide-se em dez regiões administrativas e, segundo dados da CEPAL, apresenta um PIB per capita – a preços constantes de 2010 – de US$ 3,285. É um dos países menos povoados, com 3,7 habitantes por km²; 70% da população vive em regiões interioranas. É, também, o país-sede da Secretaria do Mercado Comum e Comunidade do Caribe (Caricom).

 

Dos espanhóis ao domínio inglês

A Guiana ocupa uma região que vai do mar do Caribe até a Amazônia. Nela, viviam várias tribos indígenas, entre as quais os aruaques, que chamavam a área de Guianaque, que significa “terra das águas”. Como não dispunha de reservas minerais e pelo fato de seu litoral ser coberto por mangues, a Guiana não despertou o interesse dos colonizadores europeus.

Os primeiros colonizadores a chegar à região foram os espanhóis, em 1499. Logo, eles tiveram de enfrentar a concorrência dos holandeses, que lá chegaram no século XVI. Nessa época, acreditava-se que “El Dorado” ficava na região e, por esse motivo, foram organizadas muitas expedições ao interior para encontrá-lo. Em 1616, os holandeses construíram seu primeiro forte, na província de Essequibo, que serviria também de entreposto comercial, administrado pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais. Nesse período, a produção local era predominantemente de tabaco e açúcar, ambos para exportação. Em 1657, começaram a chegar escravos africanos para as lavouras de cana-de-açúcar.

Em meados do século XVIII, os holandeses empenharam-se em construir sistemas de drenagem na costa, fato que possibilitou a expansão da área cultivável, atraindo colonos ingleses das ilhas caribenhas vizinhas, principalmente de Barbados. Na época, ocorreram as primeiras grandes revoltas de escravos. Em 1763, o africano Cuffy liderou mais de 2.500 escravos na rebelião que foi rápida e violentamente reprimida. Assassinado, Cuffy se tornou um herói nacional. No fim do século XVIII, a população de origem britânica já era maior que a holandesa, quando a Holanda foi invadida pelos franceses, após a Revolução de 1789. Os holandeses, em 1795, pediram aos ingleses que administrassem as suas colônias na região, pois temiam perdê-las para os franceses.

No período de 1796 a 1814, o controle colonial da Guiana mudou quatro vezes de mãos. Em 1814, as colônias de Essequibo, Demarara e Berbice foram oficialmente cedidas à Inglaterra pelo tratado anglo-holandês assinado na Convenção de Londres. Em 1931, o território passou a se chamar Guianas Britânicas.

Cataratas de Kaieteur, no Parque Nacional de Kaieteur, região central da Guiana (Soren Riise/Creative Commons)

Diversidade étnica e início da participação popular

Os anos 1920 e 1930 do século XIX foram marcados pelo declínio do ciclo da economia colonial baseada nas culturas de tabaco e cana-de-açúcar e na exploração do trabalho escravo. A abolição da escravidão aconteceu em 1834. A exemplo de outros países da região, como Belize e Suriname, a abolição foi seguida pela chegada de imigrantes europeus. Os portugueses vieram na década de 1880 para trabalhar na agricultura, mas estabeleceram-se nas cidades, onde desenvolviam atividades ligadas ao comércio. Os imigrantes do leste indiano chegaram entre 1840 e 1917, totalizando 240 mil. Dedicaram-se ao cultivo de cana e arroz. Depois deles chegaram os chineses, em menor número, somando apenas 14 mil, que também se fixaram nas cidades. Ao todo, a Guiana recebeu cerca de 300 mil imigrantes.

Os negros, por sua vez, se agruparam em comunidades semi-independentes constituídas em antigas lavouras de cana, no interior, e trabalharam também na mineração da bauxita. Em 1862, houve uma tentativa de “importação” de mão de obra negra dos Estados Unidos, que não foi bem-sucedida.

No início do século XX, houve a migração interna da população rural para as cidades, principalmente escravos libertos. Os brancos latifundiários de origem europeia continuaram hegemônicos, mas, em 1905, tiveram de enfrentar a primeira grande manifestação operária. A seguir rebelaram-se também os soldados de origem afro-guianense que serviram nas fileiras inglesas durante a Primeira Guerra Mundial. Juntamente com seus companheiros belizenhos, eles reivindicavam melhores condições de subsistência e reconhecimento. Outro movimento relevante foi a formação, em 1917, da União Trabalhista da Guiana Inglesa, órgão dos trabalhadores portuários. O caldo de cultura dos primeiros vinte anos do século resultou na emergência do que nos anos seguintes se chamaria de movimento anticolonialista, unindo os descendentes de negros e indianos.

Carregamento de cana de açúcar, em Skeldon, na Guiana (KennardP/Creative Commons)

Formação de partidos e emancipação

As manifestações se intensificaram e, em 1943, a Guiana Inglesa conquistou o estatuto de “Colônia da Coroa”, início do processo de emancipação política. Todavia, por causa da Segunda Guerra Mundial, as eleições foram postergadas (Adelaide-Merlande, 2002). Em 1946, foi criado o Comitê de Assuntos Políticos, liderado por Cheddi Berret Jagan, descendente de indianos, o primeiro órgão político não branco, núcleo do futuro Partido Progressista do Povo (PPP).

O PPP foi fundado em janeiro de 1950, tendo como seu primeiro presidente Linden Forbes Sampson Burnham, afro-guianense educado na Inglaterra, e como líderes Cheddi Jagan, indo-guianense educado nos Estados Unidos, e Janet Rosalie Jagan, norte-americana e companheira de Cheddi Jagan. Desta forma, reuniram-se no partido as principais etnias da Guiana, excluindo os descendentes indígenas. A estrutura do partido e o programa de governo eram inspirados no jamaicano Partido Popular Nacional (PPN), liderado por Norman Manley. O partido tinha duas diretrizes básicas: a independência da Inglaterra e a formação de uma sociedade socialista. Para o PPP, o socialismo era a única forma de interromper o ciclo da dominação colonial.

Em 1953, foram realizadas eleições com a “permissão” da metrópole. O PPP conquistou 18 das 24 cadeiras em disputa e Cheddi Jagan tornou-se primeiro-ministro. Nesse mesmo ano, foi aprovada uma nova Constituição, instituindo o sufrágio universal e um sistema ministerial, comandado em sua maioria por simpatizantes dos regimes socialistas. Em outubro, porém, os ingleses suspenderam a Constituição, enviaram tropas, dissolveram o PPP e prenderam Cheddi Jagan, sob a alegação de que ele pretendia transformar a Guiana em um Estado comunista. Somente em 1957 foram realizadas novas eleições, mais uma vez vencidas por Cheddi Jagan, que reassumiu o governo debaixo de severo controle dos britânicos. Apesar disso, ele implantou um plano de desenvolvimento de cinco anos, nos moldes dos planos quinquenais dos países socialistas, além de flertar com esses países, em busca de maiores benefícios. Essas iniciativas foram consideradas uma afronta pelo governo dos Estados Unidos, que via com preocupação a crescente insubordinação na região.

Dr. Cheddi Jagan se reúne com presidente dos Estados Unidos John F. Kennedy, em outubro de 1961, na Casa Branca, em Whashington (Abbie Rowe/White House/John F. Kennedy Presidential Library and Museum)

 

Cheddi Jagan venceu de novo em 1961, defendendo abertamente a descolonização. Em carta reservada às autoridades inglesas, o oficial norte-americano encarregado da região afirmou que seria intolerável a independência sob o governo de Cheddi Jagan e pediu aos britânicos que tomassem uma providência. Estes, contudo, não viam como destituir um governo democraticamente eleito. Além disso, a Guiana passara a representar um peso para o orçamento inglês. Os Estados Unidos tampouco se dipuseram a invadi-la, pois são altos os custos de uma invasão, tanto em termos financeiros como em efetivos, e a sua atenção estava voltada à crise dos mísseis de Cuba, em 1962 (Parekh, 1999).

Os conflitos raciais e as disputas de poder entre descendentes de negros e indianos, fomentados pelas potências, terminaram por causar uma divisão interna no PPP. Os afro-guianenses, em sua maioria citadinos e tendo como líder Linden Burnham, criaram então o Congresso Nacional do Povo (CNP). Já os descendentes de indianos, em sua maioria camponeses, continuaram fiéis a Cheddi Jagan e ao PPP.

Em 1963, a Inglaterra “permitiu” novas eleições, mas impôs como condição a “proporcionalidade representativa”, que na verdade era um artifício para impedir a nova reeleição do socialista Cheddi Jagan. No pleito de dezembro do ano seguinte, o PPP obteve 45,8%, o CNP, 40,5%, e a conservadora Força Unida (FU), formada por descendentes de portugueses, 12,4%. O CNP e a FU formaram uma aliança no Legislativo que levou a oposição ao poder. Linden Burnham, que até então se dizia um “socialista ao estilo escandinavo”, chegou ao governo em dezembro de 1964. A Grã-Bretanha finalmente reconheceria a independência da Guiana em 26 de maio de 1966, incorporando o país à Commonwealth.

Apesar do discurso inicial menos conflitante com Estados Unidos e Inglaterra, Linden Burnham adotou uma política francamente hostil às duas potências, proclamando, em 23 de fevereiro de 1970 – a data do aniversário da rebelião liderada por Cuffy –, a República Cooperativa da Guiana. Criticando a economia de mercado, defendia a planificação e o chamado “socialismo cooperativo”. Ele nacionalizou a bauxita e as indústrias madeireira e açucareira. Com isso, o Estado passou a controlar aproximadamente 75% da produção do país, obteve a autossuficiência agrícola e desenvolveu a exploração de petróleo. Na política externa, Linden Burnham procurou minimizar a influência das potências aderindo a organizações como Caricom , Sela e Frota Mercante do Caribe e, no início dos anos 1970, estabeleceu alianças com vários países socialistas, entre eles, Cuba.

A guinada à esquerda com Linden Burnham foi possível porque as atenções das potências estavam mais voltadas para a Ásia do que para os países mais pobres da América Latina. Nas eleições de 1973 para o Legislativo, o CNP conseguiu folgada maioria, mas o PPP alegou fraude e uso da repressão. Recusou-se a ocupar suas cadeiras no Parlamento, só retornando ao cenário político três anos mais tarde.

 

Frente anti-imperialista

Após uma fase de tensões fronteiriças com o Brasil, ainda sob regime militar, Cheddi Jagan proclamou a necessidade da unidade nacional anti-imperialista e, em 1976, anunciou a formação de uma milícia para defender a Revolução. Linden Burnham concordou com a proposta e os representantes do PPP reassumiram suas cadeiras no Legislativo; o PPP se retiraria novamente do Parlamento para protestar contra o adiamento das eleições.

No final da década de 1970, depois da permissão da prática de cultos religiosos estrangeiros, um fato chocou a comunidade internacional: em 1978, em Jonestown, aconteceu o suicídio-assassinato coletivo de novecentos fiéis do reverendo norte-americano James Warren (“Jim”) Jones. Sob uma grande instabilidade socioeconômica adotou-se uma Constituição Socialista, em abril de 1980, que provocou protestos da oposição e culminou com o assassinato de dois militantes importantes, o jesuíta e jornalista Bernard Darke, em julho de 1979, e do historiador de renome internacional Walter Rodney, líder da opositora Aliança dos Trabalhadores, em junho de 1980. A morte de Rodney decorreu de um atentado a bomba e foi seguida de denúncias de censura à imprensa. A situação política se agravou com a deterioração do cenário econômico, seguida de manifestações de trabalhadores dirigidas pelos sindicatos.

Vista aérea dos corpos das vítimas da tragédia de Jonestown, em novembro de 1978, na Guiana (US Army)

 

Linden Burnham, que governava a Guiana desde 1964, faleceu em agosto de 1985, deixando o cargo de primeiro-ministro para Hugh Desmond Hoyte. No mesmo ano, seu sucessor convocou eleições, vencidas pelo CNP com 85% dos votos. Reeleito, Desmond Hoyte passou a sofrer denúncias de fraude eleitoral.

Nesse período, no plano internacional, a Guiana condenou a invasão de Granada pelos Estados Unidos, fato que deteriorou ainda mais as relações entre os dois países, e surgiu o contencioso com a Venezuela, que alegava que o território de Essequibo lhe fora tomado ilegalmente pela Inglaterra no período colonial. A pendência foi parcialmente solucionada em 1985, com a mediação das Nações Unidas, por meio da concessão de uma saída venezuelana para o mar do Caribe.

 

Crise econômica e cenário pós-Burnham

Desmond Hoyte iniciou seu governo mudando radicalmente as políticas de Linden Burnham, com a aplicação do Programa de Recuperação Econômica, sob tutela do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Essas políticas se baseavam no incentivo ao investimento estrangeiro, na renegociação com credores internacionais, no ajuste fiscal, nas privatizações, nas concessões de exploração de bauxita a empresas norte-americanas e do ouro a duas empresas canadenses, iniciando, assim, a transição de um intenso controle estatal para uma economia de mercado.

Em 1986, formou-se uma coalizão de seis partidos de oposição, entre eles o PPP e a FU, denominada Coalizão Patriótica pela Democracia, que boicotou as eleições e, posteriormente, abandonou suas cadeiras no Parlamento, alegando fraude e deixando o CNP como único partido com representação no Legislativo. Em reposta aos protestos, Desmond Hoyte anunciou que voltaria a aplicar a política de cooperativas.

Durante a década de 1980, o PIB do país caiu, em parte graças à deterioração das condições externas, como o choque do petróleo e a queda da exportação de commodities, como bauxita e açúcar.

Variação no PIB total I (em %)

1980-85 1985-1990 1980-1990
–3,3 –2,5 –2,9

Fontes: CEPAL e IICA, 2001.

O ambiente externo altamente desfavorável e a aplicação de reformas neoliberais de cunho recessivo causaram o rápido aumento do desemprego e da pobreza, que chegou a atingir 80% da população, provocando o êxodo de 212 mil guianenses entre 1989 e 1992. A maioria dos exilados econômicos era composta por profissionais qualificados (EMC, 2002). A crise contribuiu também para o aumento do endividamento, que atingiria um montante seis vezes maior que o PIB e incluiria o país no triste status internacional dos Países Altamente Endividados.

Sob intensa insatisfação, foram realizadas eleições livres em 5 de outubro de 1992. O PPP ganhou com 53,5% dos votos, pondo fim à longa hegemonia do CNP, que ficou com 42,3%. De volta ao poder, Cheddi Jagan, líder do PPP, permitiu o treinamento de tropas norte-americanas no país e sua colaboração no combate ao narcotráfico, retomando também as negociações com o FMI para flexibilizar os programas de ajuste. Pouco depois, Cheddi Jagan expulsaria o embaixador norte-americano, em 1994, alegando sua participação em atividades subversivas no último ano da administração colonial britânica.

O ano de 1996 foi marcado pela conquista do perdão de US$ 500 milhões da dívida externa, equivalentes a 25% do montante da época, e pelas denúncias de violações dos direitos humanos pela Anistia Internacional. Em março de 1997, Cheddi Jagan faleceu e Samuel Hinds assumiu a presidência, nomeando a viúva Janet Jagan para o cargo de primeira-ministra. Em novas eleições realizadas em dezembro de 1997, Janet Jagan foi eleita com 55% dos votos. Desde o início, seu governo enfrentou graves problemas econômicos e políticos, causados pela seca e por fortes protestos promovidos por Desmond Hoyte. Ela deixou o cargo em agosto de 1999, alegando problemas de saúde.

Bharrat Jagdeo, que era ministro da fazenda, descendente de indianos, assumiu o cargo, em meio a críticas, pois não teria sido respeitada a ordem sucessória prevista pela Constituição. O CNP, de maioria negra, criticou a transmissão de poder. Em março de 2001, foi convocada nova eleição e Jagdeo conseguiu ampla maioria de votos. No governo, ele passou a implantar as políticas de livre mercado. Ainda em 2001, por pertencer à categoria de “Países Altamente Endividados”, por meio do acordo do Clube de Paris, a Guiana conseguiu uma nova e substancial redução do montante da sua dívida.

Diferentemente do que acontecera nos anos 1980, nos anos 1990 o cenário econômico tornou-se mais favorável, com o crescimento do PIB.

1990-1995 1995-2000 1990-2000
8,6 4,7 6,7

Fontes: CEPAL e IICA, 2001.

Apesar do forte desemprego e da pobreza, o crescimento econômico provocado principalmente pela retomada das exportações e da valorização das commodities conseguiu arrefecer os protestos. Aumentou principalmente a produção agrícola. O cultivo de arroz cresceu, passando a ocupar, em 2000, 72,6% das terras cultiváveis. Juntamente com as propriedades de cana-de-açúcar, 23% do total, as terras produtivas totalizaram 95,6% das terras agricultáveis (CEPAL e IICA, 2001).

Em que pese o alívio interno, o fronte externo chegou ao fim do século XX agravado por dois novos contenciosos. A Venezuela, em 2000, com Hugo Chávez, reiteraria o pedido de posse sobre a região de Essequibo, criticando também o anúncio da construção de uma base de foguetes por companhia norte-americana na área disputada, nos moldes da base de Kourou, na Guiana Francesa. E o Suriname começaria a reivindicar parte da plataforma oceânica guianense supostamente rica em petróleo.

 

Perspectivas para o século XXI

A Guiana virou o século marcada por fortes contrastes. A taxa de mortalidade infantil também está entre as mais altas da região: 72 por mil nascidos vivos, superada apenas pelo Haiti (123 por mil). Vale ressaltar que a média latino-americana é de apenas 34 por mil. Por outro lado, o analfabetismo é praticamente inexistente, somente 1%, superando países notoriamente letrados como Uruguai (2,0%) e Cuba (2,7%).

No plano econômico, após o crescimento dos anos 1990, houve nova estagnação, causada pela deterioração do preço das commodities e valorização do petróleo. Com isso, as atividades agrícolas, principalmente em função do arroz e da cana-de-açúcar, continuam a representar cerca de 35,4% da composição do PIB. A mineração representa aproximadamente 10,9%, graças à bauxita, que continua nacionalizada, e à produção de ouro e diamantes (CEPAL, 2002). 

 

(atualização) 2005 – 2015

por Mônica Rodrigues

Em 2015, o Partido Progressista do Povo (PPP) somava vinte anos ininterruptos no poder. A legenda desfruta de grande popularidade na comunidade hindu, que exerce grande influência cultural e política na Guiana e compõe a maior parte da população. Assim, Bharrat Jagdeo, de ascendência indiana, foi eleito em 1999, reeleito em 2006 e governou até 2011, quando entregou a faixa presidencial a Donald Ramotar, secretário-geral do PPP desde 1997.

A Guiana é um dos países mais pobres da América Latina. Seu Ingresso Nacional Bruto (INB) per capita é de US$ 3,750 e a expectativa de vida gira em torno dos 66 anos (Dados Banco Mundial, 2013). Isso explica atitudes como a do presidente Jadgeo, que, em 2007, enviou uma carta ao primeiro-ministro inglês propondo que a Inglaterra assumisse a guarda das florestas da Guiana – 50 milhões de acres de floresta amazônica – em troca de financiamento para o desenvolvimento do país. A oferta chegou a ser discutida no Parlamento, mas não houve uma resposta oficial. 

Já as relações entre o Brasil e a Guiana cresceram a partir de 2009 com a inauguração da ponte sobre o rio Takatu, construída com apoio do governo brasileiro, sendo a primeira ligação rodoviária direta entre os dois países. Assim, o comércio bilateral chegou a US$ 28,36 milhões em 2010, aumentando 45,6% em relação a 2009. Em 2010, o Brasil aprovou unilateralmente a concessão de alíquota zero para os produtos guianenses.

Além disso, o governo da Guiana negocia dois grandes projetos com o Brasil. Um deles envolve a pavimentação de 450 quilômetros de estrada ligando Manaus ao Porto de Georgetown. O segundo é a construção de um porto de águas profundas em New Amsterdam, a 150 quilômetros de Georgetown. O governo brasileiro estuda também a construção de duas hidrelétricas em território guianense, ambas no rio Mazzaroni. As usinas vão gerar 4.500 MW conjuntamente e a energia será comprada pelo Brasil a fim de abastecer Roraima e o Amazonas.

Em seguida, o processo eleitoral de 2011 que deu a vitória a Donald Ramotar foi acompanhado por uma comissão da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), organismo do qual a Guiana faz parte desde 2010, atendendo solicitação dos candidatos para garantir a transparência do processo. O governo Ramotar reduziu a dívida externa pela metade e aumentou as reservas internacionais. Por fim, em 2013, o país se tornou membro associado do Mercosul.

Além disso, alvo de disputa entre a Venezuela e a Guiana desde o século XIX, a região de Esequibo, rica em recursos minerais e que representa dois terços do território guianense, foi novamente reivindicada, desta vez pelo presidente Nicolas Maduro. Os dois países mantêm convênios de cooperação bilateral e a questão não comprometeu as boas relações entre os presidentes. Eles esperam pela posição da ONU para decidir sobre a disputa territorial.

O presidente Bharrat Jagdeo fala durante a cerimônia de abertura do Continuing Promise de 2010, na Guiana (US Embassy Guyana)

 

Bibliografia

ADELAIDE-MERLAND, Jacques. Historie contemporaine de la Caribe et des Guyanes: de 1945 à nos jours. Paris: Éditions Karthala, 2002.

APPIAH, Kwame A.; GATES, Henry L. Africana: the encyclopedia of the african and african american experience. New York: Civitas Books, 1999.

CEPAL. Globalización y desarrollo. Santiago do Chile: 2002.

__________. Anuário estadístico: 2004. Santiago do Chile: 2005.

__________ e IICA. Panorama de la agricultura de América Latina y el Caribe. Santiago do Chile: 2001.

ENCICLOPÉDIA DO MUNDO CONTEMPORÂNEO. Rio de Janeiro/São Paulo: Terceiro Milênio/Publifolha, 2002.

PAREKH, Hector J. Subversion in British Guiana: why and how the Kennedy administration got rid of a democratic governmen. Revista Monthly Review. v. 51. Outubro, 1999.

STEIF, Willian. From Chicago to Guyana: Janet Rosenberg Jagan takes over as president. Revista The Progressive. v. 62. Fevereiro, 1998.

Quadros Estatísticos

Indicadores demográficos da Guiana

1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020*
População 
(em mil habitantes)
407 560 721 777 725 744 786 825 
• Sexo masculino (%) 49,62 49,83 49,74 49,57 49,13 50,00 50,76 … 
• Sexo feminino (%) 50,38 50,17 50,26 50,43 50,87 50,00 49,24 … 
Densidade demográfica 
(hab./km²)
2 3 3 4 3 3 4
Taxa bruta de natalidade 
(por mil habitantes)**
41,53 36,26 34,22 24,68 23,23 21,83 20,3* 18,8 
Taxa de crescimento 
populacional**
3,46 2,68 0,76 -0,66 0,09 0,44 0,54* 0,38 
Expectativa de vida 
(anos)**
57,23 58,52 59,75 60,90 62,40 63,72 66,2* 67,6 
População entre 
0 e 14 anos (%)
39,89 46,27 48,73 42,51 34,44 35,35 37,56 29,6
População com mais 
de 65 anos (%)
4,06 3,35 3,42 3,81 5,01 4,49 3,25 4,1 
População urbana (%)¹ 28,02 29,01 29,43 30,49 29,58 28,69 28,24 29,25 
População rural (%)¹ 71,98 70,99 70,57 69,51 70,42 71,31 71,76 70,75 
Participação na população 
latino-americana (%)***
0,24 0,25 0,25 0,21 0,16 0,14 0,13 0,12 
Participação na população 
mundial (%)
0,016 0,019 0,020 0,017 0,014 0,012 0,011 0,011 
Fontes: ONU. World Population Prospects: The 2012 Revision Database 
¹ Dados sobre a população urbana e rural retirados de ONU. World Urbanization Prospects, the 2014 Revision 
* Projeção. | ** Estimativas por quinquênios. | *** Inclui o Caribe.
Obs.: Informações sobre fontes primárias e metodologia de apuração (incluindo eventuais mudanças) são encontradas na base de dados indicada.

Indicadores socioeconômicos da Guiana

1960 1970 1980 1990 2000 2010
PIB (em milhões de US$ a 
preços constantes de 2010)
1.106,7 1.795,4 2.259,3
• Participação no PIB 
latino-americano (%)
0,042 0,050 0,045
PIB per capita (em US$ a 
preços constantes de 2010)
1.526,4 2.411,7 2.874,0
Exportações anuais 
(em milhões de US$)
388,9 502,9 885,0
Importações anuais 
(em milhões de US$)
386,4 550,1 1.419,1
Exportações-importações 
(em milhões de US$)
2,4 -47,2 -534,1
Dívida externa pública 
(em milhões de US$)
834,5 1.820,0 1.193,2 1.042,9
População Economicamente 
Ativa (PEA) (mil)¹
174,7 177,2 239,3
• PEA do sexo 
masculino (%)¹
77,16 80,42 75,26
• PEA do sexo 
feminino (%)¹
22,84 19,58 24,74
Matrículas no 
ciclo primário²
132.075 108.909 99.241
Matrículas no 
ciclo secundário²
80.676
Matrículas no 
ciclo terciário²
2.491 4.665
 
7.939
Professores 8.549
Médicos³ 145 85 282
Índice de Desenvolvimento 
Humano (IDH)⁴
0,516 0,505 0,570 0,626
Fontes: CEPALSTAT
¹ A fonte é LABORSTA
² UNESCO Institute for Statistics
³ O ano de 1980 refere-se somente aos dados do Ministério da Saúde
  Fonte: UNDP. Countries Profiles

* Projeções.

Obs.: Informações sobre fontes primárias e metodologia de apuração (incluindo eventuais mudanças) são encontradas na base de dados ou no documento indicados.

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