Fundamentos
Os resíduos, os recursos naturais e a lógica produtiva
A economia e sistemas produtivos adotados pela maioria dos países em nosso planeta se baseiam numa lógica linear de extração, transformação, produção, utilização e descarte dos recursos naturais, renováveis ou não, ameaçando sua disponibilidade. Além disso, espaços são ocupados sem a adequada avaliação prévia da compatibilidade do uso do solo com suas características e ainda, extrapolando sua capacidade de assimilar a poluição gerada pela atividade planejada. Os impactos ambientais e sociais desse modelo de desenvolvimento se tornam ainda mais graves em decorrência do crescimento demográfico. Alguns estudos afirmam que o consumo dos recursos naturais hoje já atinge 1,5x mais do que o planeta consegue produzir ou se regenerar ao ano.
O que são resíduos arbóreos?

De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, Resíduo é “todo material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade”. O descarte desse resíduo não significa que ele não tem mais valor, mas sim, que não é mais necessário para quem o descartou. Contudo, existem grandes chances desse resíduo ainda ser útil para outras pessoas, em sua forma original ou transformado.
A partir desta concepção, também os resíduos arbóreos, resultantes das atividades de poda e supressão de árvores urbanas, possuem valor, desde que se conheça suas características, propriedades e aplicações compatíveis, se identifique demandas potenciais locais, assim como a capacidade existente para transformação desses resíduos em matéria-prima e, por fim, em produtos e componentes que supram as necessidades identificadas.
Dentro desta perspectiva, a Urban Wood Network – rede norte-americana que reúne indivíduos e instituições com a finalidade de demonstrar aplicações dos resíduos de madeira proveniente da arborização urbana, e de promover negócios na área – recomenda a seguinte hierarquia de uso, onde o melhor aproveitamento se encontra no topo da pirâmide:

O que é Economia Circular?
Como alternativa a este modelo, visando uma relação mais equilibrada e harmônica entre as sociedades e o planeta, respeitando todas as formas de vida, assim como sua capacidade regenerativa, surge a proposta da Economia Circular, pautada em três princípios (Ellen MacArthur Foundation, 2013):
- eliminar o conceito de lixo;
- manter os materiais no ciclo produtivo;
- regenerar o ecossistema natural.

Em uma economia circular, a atividade econômica contribui para a saúde geral do sistema. O conceito reconhece a importância de que a economia funcione em qualquer escala – para grandes e pequenos negócios, para organizações e indivíduos, global e localmente. A transição para uma economia circular não se limita a ajustes visando reduzir os impactos negativos da economia linear. Ela representa uma mudança sistêmica que constrói resiliência em longo prazo, gera oportunidades econômicas e de negócios, e proporciona benefícios ambientais e sociais. O modelo faz uma distinção entre ciclos técnicos e biológicos. (Ellen MacArthur Foundation, 2017)
Imagem: Royal HaskoningDHV
Estes três princípios consolidam o pensamento sustentável:
- enxergam o lixo como uma matéria-prima em potencial;
- aperfeiçoam o sistema econômico atual por meio de um novo relacionamento com os materiais e a sua utilização pela sociedade;
- e propõem uma nova forma de projetar, produzir e comercializar produtos, para garantir o uso e a recuperação inteligentes dos recursos naturais.
Assim, a reciclagem, dentro da Economia Circular, é vista não como uma solução de um passivo ambiental, mas como a criação de cadeias de valor, a partir de materiais desvalorizados.
A Economia Circular define novos ciclos para utilização de materiais e novos modelos de negócio, baseados numa pirâmide de valor, que dialoga com a hierarquia de aproveitamento dos resíduos arbóreos da Urban Wood Network:
Uso de recursos em cascata
Para viabilizar a pirâmide de valor, na economia circular, recomenda-se o princípio do uso de recursos em cascata “cascade use principle”, que corresponde ao uso sequencial e consecutivo de recursos, privilegiando-se sempre:
- o emprego mais valorizado dos recursos naturais
- o menor consumo de insumos e energia na sua transformação em produtos
- o menor desperdício possível de material durante as diversas fases de produção e uso
- a maior durabilidade possível dos recursos, de modo a retardar sua degradação.

Adaptação de infográfico disponível em: https://media.springernature.com/full/springer-static/image/art%3A10.1007%2Fs40725-017-0067-y/MediaObjects/40725_2017_67_Fig6_HTML.gif?as=webp
Transpondo esta abordagem para a madeira e, em especial, para os resíduos da arborização urbana, procura-se evitar ao máximo o “downcycling”, ou seja, opções que desvalorizem e encurtem o ciclo de vida do material, como se observa no gráfico a seguir:

Adaptação de infográfico disponível em: https://ars.els-cdn.com/content/image/1-s2.0-S2590289X20300098-gr2.jpg
Como a ideia se aplica ao manejo dos resíduos arbóreos urbanos?
No planejamento da poda a partir do levantamento prévio:
- das melhores potencialidades de uso dos resíduos,
- da demanda local existente para absorver tais usos,
- da cadeia produtiva local para processamento
- na estruturação dos melhores procedimentos de poda, equipamentos e instalações para permitir os usos pré-definidos;
- na classificação e identificação dos resíduos, no local de poda (por espécie, segmento da árvore, dimensões e condições fitossanitárias), de acordo as melhores potencialidades de uso de cada categoria
- na definição de formas de processamento e formatos do material serrado (rotas tecnológicas) que gerem menos resíduo e que contemplem usos secundários para os resíduos gerados no processo;
- no fortalecimento e integração da cadeia produtiva local, para articular os processos e o aproveitamento dos materiais em cascata, de modo complementar.
A nossa proposta
O projeto PodaLab visa estimular a transformação de resíduos em recursos, incentivando a produtividade e retorno do investimento através da implementação de rotas tecnológicas capazes de estruturar novas cadeias de valor – parcerias estratégicas, novas relações comerciais e negócios – com o objetivo de desenvolver materiais, componentes e produtos inovadores, além de gerar emprego e renda. A nossa proposta é utilizar os resíduos – antes descartados ou transformados em composto orgânico, lenha ou briquete – para a produção de novos produtos, tais como: objetos utilitários e decorativos, mobiliários, acessórios, componentes construtivos, entre outros. Materiais antes desprezados na poda e supressão de árvores podem ser reprocessados a fim de serem inseridos em novos ciclos produtivos.
O papel das instituições responsáveis
Com apoio do setor privado e da sociedade, Planos de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS), podem ser elaborados a fim de:
- dar o exemplo e atender às expectativas da sociedade;
- promover maior controle de todos os processos por meio de indicadores;
- continuar e aperfeiçoar a coleta seletiva;
- reduzir os custos operacionais de cada processo;
- mitigar os impactos ambientais;
- diminuir a desigualdade social;
- promover a conscientização da população.
Para saber mais
Iniciativas Brasileiras Inspiradoras
Que tal conhecer alguns deles? Clica no link ao lado e saiba mais!
Curso:
https://online.sp.senai.br/curso/90950/483/economia-circular