Desde criança até a vida adulta somos levados por diversos fatores a colocar em prática habilidades cognitivas. Elas são representadas pelas funções executivas do cérebro: foco da atenção, planejamento, memória do trabalho, flexibilização mental, controle de impulsividade, entre outras. O desenvolvimento dessas atividades pode se dar com a prática, por exemplo, de jogos de tabuleiro e leitura de livros.
Passados mais de 100 dias do início das aulas remotas, devido à suspensão das aulas presenciais em todo o País, as aulas e atividades on-line trouxeram à tona a importância das habilidades cognitivas no aprendizado. Suas funções, neste momento de confinamento, necessitam ser estimuladas para que não haja prejuízo no intelecto tanto das crianças quanto dos adolescentes e adultos. Foi a necessidade global de improviso, gerada pela crise sanitária, que tornou este momento atípico e diversificado.
Após três meses de aulas on-line, a rotina repetitiva exige um cuidado ainda maior com essas habilidades que estão em constante atividade (ou deveriam estar). “A motivação é um fator essencial para manter as habilidades cognitivas. O cansaço está predominante”, aponta Betânia Dell Agli, professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano (PSA) do Instituto de Psicologia (IP) da USP.
A adaptação
Na sala de aula, os professores tinham um contato maior com os alunos e podiam observar seus desenvolvimentos e dificuldades. A adaptação para o on-line inibiu esse contato mais próximo, exigindo das habilidades cognitivas, que sempre estiveram presentes na nossa vida, um cuidado maior.
No geral, são muitos os agentes que ajudam a manter as funções aprimoradas e, por isso, a cognição não deve ser restrita à aprendizagem escolar, explica Betânia. Principalmente agora, quando levado em consideração que “há uma sobrecarga no ensino remoto [especialmente] para essas habilidades”, aponta Maria Thereza Coelho de Souza, professora do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do IP-USP. Essa sobrecarga acontece quando, por exemplo, há um desequilíbrio recorrente na ordem de aulas, em que um dia tudo ocorre bem e no outro a internet cai, podendo causar ansiedade no aluno.
De forma resumida, a professora especialista em Neuropsicologia explica que o nosso tronco encefálico é responsável pela ativação da manutenção do estado de alerta e vigília do corpo, fazendo o córtex cerebral ficar vigilante, mais “ligado” para prestar atenção em determinada tarefa executada, como assistir às aulas e resolução de exercícios. Ao mesmo tempo, há uma grande participação do lobo frontal, que regula e monitora o quanto de atenção precisamos ter em certa atividade. “Isso envolve questões de ordem emocional, valores, interesses e complexidade da tarefa.”
Para as crianças e adolescentes, as distrações se fazem muito necessárias ao enfrentar longas aulas ao vivo ou listas de exercícios. Essa alternância de tarefas, principalmente na rotina repetitiva das aulas na quarentena, acontece, pois é natural que não se fique muito tempo em uma mesma atividade nem que se consiga executar duas delas simultaneamente.
É possível aprimorar as habilidades?
Apesar da possibilidade de intervenção clínica, as habilidades podem ser mantidas por simples execuções de tarefas. “Ter uma rotina e interesses são essenciais”, recomenda Maria Thereza. De acordo com a professora, estresse, ansiedade, falta de regularidade e instabilidades de dias e horários de estudos podem, aos poucos, “relaxar as funções”, como se elas não entendessem se é para funcionarem ou não. “Elas têm um substrato cerebral e nosso cérebro funciona com regularidades.”
Por isso, é preciso combater a ansiedade e estresse neste contexto de pandemia. Mas como fazer isso além das individualidades? A resposta das entrevistadas está em manter uma boa qualidade de sono, além da própria rotina e interesses ativos, mesmo que não seja por coisas relacionadas à escola. “Você gosta de música? Ler sobre ficção? Escute e leia, mesmo que não tenha ligação com [o conteúdo que você aprende], pois você vai exercitar a memória, deixando-a ativa para quando a quarentena acabar”, indica.
Por Caio Santana