Internação compulsória é realmente a solução?

Cracolândia (Crédito: Rovena Rosa/ Agência Brasil)

No início deste ano, a discussão sobre internação compulsória voltou a nortear a vida política e social no Estado de São Paulo. Na capital paulista, por exemplo, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) defendeu a medida para indivíduos que fazem o uso de drogas há mais de cinco anos na região central, conhecida como “Cracolândia”. Segundo ele, “o que a gente não pode é ter as pessoas jogadas na rua, se consumindo com o crack“.

Ainda no mesmo mês, em São José do Rio Preto, interior de São Paulo, vereadores aprovaram por 16 votos a 1, a criação do Programa de Internação Involuntária de Dependentes Químicos. A iniciativa foi alvo de protestos por membros do Centro Acadêmico de Psicologia (Capsi) da Faculdade de Medicina de Rio Preto (Famerp), que chegaram a ler uma carta de repúdio durante audiência pública.

Dentre as denúncias relacionadas aos maus-tratos, tratamento desumano e degradante, encontramos a insuficiência e a má qualidade de alimentação e água potável; banho frio e banheiros sem porta; indícios de apropriação indevida de recursos financeiros das pessoas internadas, entre outros“, consta o comunicado.

Segundo o psicanalista e professor do Instituto de Psicologia da USP, Christian Dunker, a ação é considerada extremamente arcaica e ineficiente quando comparada com a internação consentida. Ele explica que a alternativa é mais segura pelo fato da pessoa conseguir, de forma assistida, se integrar ao processo, e entender o período de desintoxicação e de redução de uso.

As internações compulsórias são conhecidas pelos seus efeitos iatrogênicos, ou seja, elas causam uma indisposição com a ideia de tratar-se, porque ela fica associada com violência, com coerção. Dali em diante, a atitude de confrontação e violência potencial aumenta”, diz. O especialista aponta que um dos efeitos de tal medida é a volta do uso da substância depois de um período de desintoxicação.

Christian explica que, se tal política for de fato instituída, a probabilidade de haver um aumento da população em situação de rua é maior. “Essa prática produz uma falsa sensação de limpeza social, de que as ruas não estão mais ocupadas por aquelas pessoas”, complementa.

Vamos deixar a internação compulsória lá no século XVII, lá atrás, onde a gente acreditava que realmente a violência é o melhor caminho para transformar as pessoas”, finaliza.

Por: Laura Slobodeicov, para o Perfil, 09/02/2023