Psicologia Forense e a atuação do psicólogo

Conheça as possibilidades de atuação do psicólogo na área de Psicologia Forense

A IV Jornada de Análise do Comportamento da USP convidou a pesquisadora e professora adjunta da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP) Giovana Veloso Munhoz da Rocha para apresentar a palestra Um olhar da Análise do Comportamento sobre a Psicologia Forense.

Rocha contou que a inspiração para a criação da área teve como base a Psiquiatria Forense, e que esta, por sua vez, surgiu da Medicina Legal. No Brasil, a pesquisadora revelou que a sistematização da Psicologia Forense aconteceu somente em 2001, quando uma resolução relacionada à especialização em Psicologia Jurídica – termo hispânico para designar a Psicologia Forense – foi aprovada no Conselho Federal de Psicologia.

A palestrante disse que a maioria dos psicólogos forenses é analista do comportamento, porque os profissionais que atuam nessa área consideram os fatores do contexto social no qual as pessoas envolvidas estão inseridas. Além disso, ela explicou que a Psicologia Forense faz intersecção com qualquer área do sistema legal, e não apenas com o direito penal, como costuma-se acreditar.

A pesquisadora também elucidou que a Psicologia Forense tem sustentação na pesquisa e na ciência. Por isso, a linguagem científica se faz necessária, para que os operadores do direito possam compreender o que os psicólogos têm a dizer.

A professora defendeu que os psicólogos forenses utilizem também a linguagem do senso comum, e não só termos behavioristas, porque é preciso se aproximar do grande público. “Junto ao Direito, nós temos que matar a cobra e mostrar o pau, por meio da descrição esclarecida das contingências”, acrescenta Rocha.

Para fins didáticos, a palestrante apresentou as possibilidades de atuação de um psicólogo forense citando as seguintes áreas:

Psicologia do Crime

Trata-se da ciência dos processos comportamentais do adulto e jovem infrator, e tem o objetivo de descrever como um comportamento é adquirido, aprendido, evocado, mantido e modificado pelas consequências. Para tanto, o método científico é utilizado. São também examinadas e avaliadas a prevenção, a intervenção e suas estratégias direcionadas a reduzir o comportamento criminoso e o transtorno da personalidade antissocial. Ou seja, tenta-se compreender nos adolescentes a reiteração de comportamentos agressivos e nos adultos a reincidência de crimes cometidos.

Avaliação Forense

Esta é o cerne da Psicologia Forense, porque é calcada nos maiores instrumentos da psicologia: a entrevista e a observação. Portanto, é imprescindível que sejam identificados e descritos os padrões comportamentais, e determinada a responsabilidade do indivíduo sobre seus atos, de forma que a objetividade seja promovida e os operadores da lei sejam instrumentalizados para que a melhor decisão em um julgamento seja tomada.

Psicologia aplicada ao Sistema Correcional e Programas de Prevenção

Conforme alertava Skinner, os programas de prevenção serviriam como a solução “dos problemas da delinquência e do crime se pudéssemos modificar o ambiente primário dos agressores” através da identificação precoce e da prevenção de comportamentos antissociais.

Se isso fosse aplicado, de fato, à Educação Básica e se os psicólogos conseguissem atuar nas variáveis que estão relacionadas à criminalidade, a prevenção seria efetiva. Contudo, é somente pela pesquisa nas áreas de Psicologia Comunitária e Psicologia Forense que o conhecimento existente sobre programas de prevenção acaba sendo timidamente semeado – o que já é um início, embora ainda não seja a solução.

Psicologia Aplicada à Polícia

Recentemente, a Psicologia Forense ganhou este novo desdobramento, no qual é possível trabalhar com identificação de estresse, resiliência, perfil de grupos de elite etc. “Com ela, conseguimos compreender que a maioria dos policiais é honesta, diferentemente do que é veiculado na mídia. Em geral, só temos notícia dos maus-exemplos, porque nos salta aos olhos suas ações negativas, já que eles deveriam cuidar e proteger a sociedade”, afirma Rocha. A exemplo disso, o número de policiais com transtorno de estresse pós-traumático vem sendo investigado por meio de um teste de protocolo elaborado por uma de suas orientandas.

A pesquisadora também chamou a atenção para o grandenúmero de policiais que desenvolvem esse distúrbio da ansiedade, provavelmente por atenderem diariamente casos cruéis – como crianças e mulheres estupradas, idosos espancados, entre tantos outros – e por receberem baixos salários – em média, R$ 1.800,00.

O psicólogo forense atende quem, quando e onde?

Alguns dos lugares atendidos pelos psicólogos forenses são: presídios/centros de socioeducação, delegacias, comunidades terapêuticas, clínicas-escolas e clínicas particulares, laboratórios, programas de liberdade assistida, abrigos, Ongs etc.; e alguns dos casos comumente avaliados pela Clínica Forense são: disputa de guarda, alienação parental, responsabilidade criminal, (des)internamento de jovens, avaliação de risco, abuso sexual, físico e psicológico, assédio moral no trabalho etc.

No caso de crianças em abrigos ou instituições de acolhimento, por exemplo, o Estado é o responsável por elas. Por isso, Rocha conta que essa é uma das primeiras coisas ensinadas pelo psicólogo forense às crianças, que explica que “o responsável por elas não é o pai ou a mãe social, ou mesmo o cuidador do abrigo, mas, sim, o juiz”.

Portanto, a pesquisadora declara que quando um trabalho terapêutico é feito com essas crianças, e o assistente social responsável pela instituição informa que o Ministério Público solicitou um relatório, o psicólogo forense precisa acatar o pedido da Justiça. Também é possível que o psicólogo seja chamado para testemunho, para falar sobre o andamento da terapia da criança ou sobre a possibilidade de alta, e ele não pode se negar a dar essas informações, porque  o verdadeiro cliente do psicólogo forense é a Justiça.

Isso significa que se um juiz ou o Ministério Público enviar um encaminhamento ao terapêuta, via de regra, é solicitado a ele que emita uma declaração de comparecimento para se reportar à Justiça e revelar informações que seriam sigilosas – por exemplo, se o paciente está tendo um bom aproveitamento do processo. Essa solicitação é fora do comum em um atendimento padrão, porque o sigilo profissional existe para proteger o paciente atendido.

E Rocha reconhece que “são muitos os psicólogos que fazem parte da Psicologia Forense mas não o sabem, o que se torna muito perigoso, já que eles devem sempre prestar contas à Justiça”.

Psicologia Forense: o que é, afinal?

A palestrante reitera que a Psicologia Forense é uma ciência, que a Análise do Comportamento satisfaz às suas necessidades e que as particularidades que relacionam a Psicologia ao sistema legal criam o comprometimento de que os psicólogos saibam ao menos as leis básicas que envolvem a sua atuação: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para quem trabalha com crianças e adolescentes; o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) para quem lida com adolescentes infratores; o Direito Penal para tratar adultos infratores etc. Por isso às vezes existe a necessidade de se procurar a consultoria de advogados.

Porém, como os pacientes não procuram voluntariamente um psicólogo, já que, via de regra, eles não estão em liberdade, uma questão frequentemente emerge: como fazer psicoterapia com uma pessoa com quem não se tem um vínculo de confiança, que se vê obrigada a ir às sessões e que que costuma recusar o contato, o diagnóstico ou mesmo tratamento oferecido? Quanto a isso, a palestrante alega que “o estabelecimento de uma boa relação terapêutica consegue ser alcançado por um profissional que tenha recebido formação para isso. Não é fácil nem rápido, mas é possível”.

Assim, tomando todos esses cuidados, “as implicações de uma prática atualizada e correta poderá promover mudanças positivas tanto no atendimento a agressores como a vítimas e suas famílias, nas mais variadas áreas”, finaliza Rocha.

Por Anátale Garcia
Edição de Islaine Maciel

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