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REMA – Núcleo de Ensino, Pesquisa e Assistência na Reabilitação de Mastectomizadas Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
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15/05/2020

Barreiras e facilitadores para a reabilitação individualizada durante o tratamento de câncer de mama – um estudo em grupo focal explorando experiências de profissionais de saúde

            O câncer de mama é um dos mais comuns em mulheres. O diagnóstico e tratamento podem ajudar na diminuição da mortalidade e no aumento da vida das pacientes. Apesar disso, o tratamento do câncer de mama está relacionado a algumas complicações, como a angústia. Essa tem diferentes causas e pode influenciar no modo de lidar com o câncer, seus sintomas e seu tratamento.

            Assim, a reabilitação é essencial para pacientes com câncer de mama, pois diminui as chances de problemas físicos, psicológicos, sociais e existenciais. A atividade física faz parte da reabilitação e ajuda, por exemplo, com o linfedema, a ansiedade, a depressão, além de diminuir a mortalidade e melhorar a qualidade de vida.

            Entretanto, existem pacientes com câncer de mama que não tem suas necessidades atendidas na reabilitação. Isso aumenta o tempo e diminui as chances de recuperação.

            Pacientes que não têm suas necessidades atendidas na reabilitação relatam medo de que o câncer volte, preocupações pessoais e necessidade de ter alguém com quem conversar e de receber aconselhamento educacional, psicológico, financeiro e ocupacional.

            Sintomas ou problemas podem ser solucionados com intervenções e podem funcionar ou não, a depender de cada paciente. Assim, a reabilitação deve ser diferente para cada paciente para que suas necessidades individuais sejam atendidas.

            O estudo em questão foi realizado com profissionais da saúde, com o intuito de conhecer suas experiências atuais com a reabilitação e as barreiras e facilitadores para que a reabilitação seja individualizada.

            Esse estudo aconteceu no Departamento de Cirurgia Oncológica de um hospital universitário do sul da Suécia, onde aproximadamente 670 pacientes são diagnosticados com câncer de mama por ano.

            Na Suécia, a reabilitação é realizada em diferentes níveis, dependendo das condições dos pacientes. O nível básico de reabilitação conta com o trabalho de enfermeiros e essas unidades possuem também fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais. Alguns acompanhamentos são diferenciados, por exemplo, pacientes que tiveram seus linfonodos axilares retirados consultam um fisioterapeuta antes e após a cirurgia, a fim de prevenir o linfedema.

           Pacientes que no nível básico são identificados como tendo necessidades básicas, são encaminhados para uma unidade de reabilitação. A unidade de reabilitação avançada conta com uma equipe multiprofissional, com médicos, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas e terapeutas. Esses profissionais se concentram exclusivamente na reabilitação de pacientes com câncer.

            As experiências dos participantes foram divididas em três categorias e oito subcategorias, descrevendo a prática atual de reabilitação, bem como barreiras e facilitadores para a reabilitação individualizada. Extensa competência profissional no trabalho com pacientes com câncer de mama/reabilitação foi percebido como facilitador da reabilitação individualizada, já as barreiras à reabilitação individualizada foram identificadas como falta de estrutura, colaboração e conhecimento em relação à reabilitação individualizada no sistema de saúde.

 

Tabela 1: Visão geral esquemática das categorias e subcategorias

At

itudes variadas em relação à reabilitação

Incongruência em como identificar e atender as necessidades de reabilitação Colaboração subótima durante o tratamento do câncer
Reabilitação baseada em indicadores médicos Identificando sinais de vulnerabilidade Colaboração em equipe interprofissional
Falta de consenso sobre a abordagem para reabilitação Triagem de necessidades de reabilitação Colaboração interdisciplinar
Estabelecendo metas para a reabilitação Ações desencadeadas por sinais de vulnerabilidade

Atitudes variadas em relação à reabilitação

            As atitudes dos participantes da pesquisa em relação à reabilitação se tornaram uma barreira ao acesso dos pacientes à reabilitação. Isso ficou claro quando a reabilitação e o acompanhamento não tiveram foco em atender às necessidades individuais dos pacientes.

Reabilitação baseada em indicadores médicos

            A reabilitação estava no nível básico organizado em indicadores médicos, como risco de desenvolver linfedema ou risco de efeitos colaterais associados a tratamentos. No entanto, os participantes acreditam que as avaliações das necessidades de reabilitação dos pacientes devem ser com base em uma combinação de características pessoais, como rede social do paciente, personalidade e situação da vida. No nível avançado de reabilitação do câncer, foi adotada uma triagem de ambas necessidades e recursos como base para um plano de reabilitação.

“Eu uso a ferramenta de triagem não apenas para identificar problemas, mas também para capturar recursos. Que apoio essa pessoa tem em sua vida para lidar com sua atual situação da vida e como podemos contribuir?” (Participante em nível avançado de reabilitação, entrevista 5).

            Os participantes enfatizaram a importância de preparar os pacientes para possíveis problemas, dando informações com antecedência, como por exemplo sobre o risco de desenvolver fadiga (sensação de cansaço).

Falta de consenso sobre a abordagem para reabilitação

            A abordagem para a reabilitação variou dependendo do conhecimento individual dos participantes e interesse na reabilitação e em que nível de reabilitação os profissionais de saúde atuaram. Isso indica que a falta de conhecimento e consenso sobre prazos e estratégias de reabilitação é uma barreira. Alguns participantes acharam errado discutir a reabilitação quando o paciente está enfrentando uma doença com risco de vida. Foi enfatizado que uma abordagem que promove a reabilitação desde o início do câncer foi fundamental para a recuperação.

            “O importante é levá-los para entender o diagnóstico e apoiá-los durante o tratamento” (Participante do ensino básico nível de reabilitação, entrevista 3).

Estabelecendo metas para a reabilitação

            Às vezes, os participantes descreviam objetivos, tanto para reabilitação, quanto para estabelecer metas para cada paciente. Entretanto, no nível básico da reabilitação, estabelecer metas não era descrito como parte da rotina e pouco discutido em equipe. Alguns objetivos sobre o paciente foram destacados como importantes, como poder tocar na mama ou voltar ao trabalho, mas quase nunca foram discutidos em conjunto com o paciente. Também foi enfatizado que havia a necessidade de um plano de reabilitação individual.

Incongruência em como identificar e atender as necessidades de reabilitação

            A importância de identificar as necessidades dos pacientes ao longo da trajetória do câncer foi estressante. Ainda assim, a falta de estrutura para uma triagem contínua das necessidades de reabilitação foi descrita como uma barreira e faltava consenso sobre a importância de avaliar as necessidades dos pacientes. Os profissionais de saúde identificaram sinais de vulnerabilidade como indicadores para necessidades de reabilitação.

Identificando sinais de vulnerabilidade

            Baseados em sua experiência, os profissionais de saúde estavam atentos aos sinais de vulnerabilidade. Esses sinais variavam e podiam incluir grupos de pacientes específicos, como mulheres mais jovens com filhos, mulheres que estavam sozinhas em sua situação ou que pareciam não entender a situação. Ao identificar sinais de vulnerabilidade, os participantes ampliaram o entendimento das necessidades dos pacientes. Por exemplo, como uma mulher com crianças, informar seus filhos sobre o câncer.

            Os participantes descreveram que os enfermeiros nos níveis básicos estavam melhor posicionados para identificar sinais de vulnerabilidade. Os participantes destacaram que as necessidades dos pacientes variam muito e que os profissionais de saúde precisam estar atentos e responder às necessidades dos pacientes ao longo da trajetória do câncer.

Ações desencadeadas por sinais de vulnerabilidade

            Os participantes descreveram que, quando foram identificados sinais de vulnerabilidade e um paciente foi considerado necessitado de reabilitação prolongada, isso desencadeou várias ações. Se as necessidades eram práticas (por exemplo, questões econômicas), psicológicas (por exemplo, ansiedade) ou físicas (por exemplo, braço inchado), geralmente havia uma rotina clara de encaminhamento a um assistente social ou fisioterapeuta no nível básico de reabilitação. Por outro lado, se o gatilho se baseava em características pessoais ou comportamentos de saúde (por exemplo, inatividade, abuso de substâncias), muitas vezes falta uma estrutura para iniciar intervenções de suporte ou encaminhar pacientes para suporte estendido.

Colaboração abaixo do ideal durante o tratamento do câncer

            Ficou evidente que havia barreiras para a reabilitação em nível organizacional, em termos de falta de colaboração interprofissional (entre os profissionais de saúde do mesmo departamento) e interdisciplinar (entre os departamentos).

Colaboração em equipe interprofissional

            A “colaboração interprofissional” era dita como competências profissionais reunidas em uma unidade específica, o que significa que a colaboração da equipe estava relacionada a uma parte da trajetória do câncer. Foi enfatizado que as discussões interprofissionais sobre casos de pacientes eram importantes para se manter atualizado, aprimorar o conhecimento e garantir que as recomendações de reabilitação fossem válidas e baseadas em evidências.

Colaboração interdisciplinar

            A colaboração interdisciplinar foi dada como insatisfatória. A colaboração ineficaz foi descrita como um processo que leva a um risco de tempos de espera prolongados, comunicação ineficiente e reabilitação com pouca qualidade. Para possibilitar a reabilitação ideal, o período de recuperação deveria ser visto como um processo contínuo.

            Um exemplo da falta de colaboração entre as disciplinas foi que, apesar da competência no nível avançado de reabilitação, muitos participantes no nível básico desconheciam quando encaminhar pacientes. Os participantes disseram que trabalham em um sistema de saúde em rápida mudança em uma área que surgem novas evidências, o que dificulta estar atualizado com as evidências e os recursos de reabilitação disponíveis. Então, eles expressaram a necessidade de uma ferramenta de apoio que incluísse informações sobre quais intervenções poderiam ser eficazes para diferentes problemas e informações sobre recursos de reabilitação disponíveis localmente

            Apesar das iniciativas nacionais para incluir a reabilitação na trajetória do câncer, o estudo mostra que isso não acontece na Suécia. Existem pesquisas sobre o assunto, mas na prática, a reabilitação possui suas deficiências. Além disso, os resultados deste estudo demonstram que os profissionais atuam de forma diferente na reabilitação, prejudicando sua qualidade.

            O estudo mostra que a reabilitação é organizada com base em indicadores médicos ou relacionados ao tratamento. Necessidades não atendidas e incapacidade foram vistas como fatores importantes para identificação da necessidade de reabilitação prolongada. Profissionais de saúde enfatizam que preferências individuais, evidências e sinais de vulnerabilidade são indicadores importantes para a necessidade de reabilitação.

            Foi observada no estudo a responsabilidade de identificação de mulheres com maiores necessidades pelos profissionais de enfermagem no nível básico de reabilitação. Também foi enfatizada a necessidade de uma abordagem multidisciplinar para que seja garantida atenção às diversas necessidades dos pacientes.

            Portanto, a responsabilidade pela identificação de pacientes com necessidades de reabilitação está no nível básico, em que a reabilitação geralmente não é parte integrante. Muitas vezes, faltam estruturas para a triagem e estruturas para encaminhar pacientes para reabilitação avançada. Para permitir uma recuperação ideal e individualizada para pacientes com câncer de mama, a reabilitação precisa ser uma parte integrante da trajetória do câncer e ser executada junto com o diagnóstico e o tratamento.

Referência:

MÖLLER, Ulrika Olsson et al. Barriers and facilitators for individualized rehabilitation during breast cancer treatment–a focus group study exploring health care professionals’ experiences. BMC health services research, v. 20, n. 1, p. 1-9, 2020.

Trabalho relizado pelas alunas: Karina Sumi Fujito, Letícia Martins Gaspar e Emily Mills.

Colaboradoras: Sophia Formaggio Sanchez, Bárbara Motta P.Valente, Patricia Mikawa, Pamela Roder, Mayumi Leticia Hojo e Nathalia Luiza Matias Leite.

Orientadoras:

Enfermeira Maria Antonieta Spinoso Prado

Profa. Dra. Marislei Sanches Panobianco

Profa. Dra. Thais de Oliveira Gozzo

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