Na pele do subordinado

Pesquisa do IP sobre invisibilidade pública e cegueira social ganha desdobramentos em atividade formativa de juízes

Por Anátale Garcia e Islaine Maciel
Indicação de pauta: Gustavo Massola

Foto: Agência Brasil

 

A Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região do Rio de Janeiro (EJ1) abriu inscrições para a atividade “Vivendo o trabalho subalterno”, oferecendo 11 vagas para que os magistrados exerçam atividades de trabalhadores subordinados por um dia e de forma anônima. Trata-se de um projeto de pesquisa que será conduzido pelo psicólogo social Fernando Braga da Costa, baseado na metodologia utilizada em sua trajetória acadêmica.

Segundo o edital, o objetivo é “contribuir para que o magistrado possa utilizar argumentos coerentes e contextualizados em posição de autoridade e humildade na atuação profissional”. Como parte do exercício, os juízes selecionados receberão do pesquisador Braga da Costa treinamento para que se submetam às condições de trabalho idênticas às de jardineiros, copeiros, auxiliares de limpeza, cobradores de ônibus e operadores de caixa de supermercado. O projeto proíbe que a identidade do juiz seja revelada.

Invisibilidade pública e cegueira social: a pesquisa no IPUSP

Em 1994, durante o curso de graduação em Psicologia no IPUSP, Braga da Costa realizou um trabalho de Psicologia Social proposto pelo professor doutor José Moura Gonçalves Filho, que sugeria aos alunos o engajamento em uma profissão que não exigisse qualificação técnica e/ou acadêmica por um dia, com a finalidade de se de investigar a humilhação social.

O experimento, entretanto, ganhou vigor e se estendeu por 10 anos. Fernando Braga da Costa pôde, então, realizar sua pesquisa etnográfica como observador participante ao cumprir tarefas da profissão de gari nas ruas da USP, trabalhando por meio-período durante um ou dois dias por semana, sem receber salário.

Segundo conta, a principal função dessa pesquisa era “compreender e analisar a condição de trabalho deles (os garis), e a maneira como eles estão inseridos na cena pública. Ou seja, estudar a condição moral e psicológica à qual eles estão sujeitos dentro da sociedade”. Como resultado, Braga da Costa desenvolveu a dissertação de mestrado “Garis – um estudo de psicologia sobre reificação no trabalho e humilhação social” (2002) que, por sua vez, gerou o livro “Homens invisíveis: relato de uma humilhação social” (2004). Na sequência, o psicólogo escreveu sua tese de doutorado “Moisés e Nilce: retratos biográficos de dois garis. Um estudo de psicologia social a partir de observação participante e entrevistas” (2008).

As descobertas provocadas pelos trabalhos promoveram a constatação de dois problemas psicossociais: a invisibilidade pública de profissionais que exercem funções de baixa-remuneração e não são “vistos” pela sociedade, e a cegueira social, que humilha e subtrai a humanidade dos sujeitos que executam essas tarefas.

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