A importância da pesquisa acadêmica na profissão docente sob a ótica de uma estudante de pós-graduação

A pesquisa na formação continuada de professores é essencial para a construção do conhecimento dos alunos. Mesmo obtendo informações por outros meios, a escola ainda é a principal fonte de conhecimento, o que requer professores atualizados. Créditos: pch.vector Fonte: freepik.com

Além da produção de conhecimento no meio acadêmico, a pesquisa é essencial para a atividade docente em diversos aspectos. Mas, o quanto estamos valorizando a pesquisa na vida de professores e professoras?

Eliani Jordana
Licenciada em Química pelo IFRN (Campus Apodi), com conclusão no ano de 2014. Concluiu o Mestrado Acadêmico em Ensino em 2019 pelo POSENSINO, uma associação ampla entre a Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), a Universidade do Estado do Rio Grande (UERN) e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN). Atuou como professora de Ciências no Ensino Fundamental II, período em que participou de olimpíadas nacionais de ciências como a Olimpíada Brasileira de Saúde e Meio Ambiente (OBSMA) e a Olimpíada Nacional de Ciências (ONC), nas quais obteve premiação. Também atuou como voluntária em alguns projetos voltados à educação, dentre estes, o projeto Inovação Pedagógica para a Formação de Professores e Qualidade do Ensino Médio. Tem experiência em pesquisas na área de Ensino de Química; Formação de Professores e Aprendizagem Significativa. No que diz respeito aos gostos pessoais, gosta do contato com a natureza, e é amante de filmes e viagens. 

03 de outubro de 2022 | 10:00

Atualmente, sabemos que ensinar vai muito além da mera transmissão do conhecimento abordado em uma sala de aula de forma restrita à dois atores (aluno e professor) e com a centralidade no docente. E como tenho ciência disso? Devido às inúmeras pesquisas acadêmicas que foram e continuam sendo desenvolvidas nessa área profissional. Graças a essas pesquisas, hoje, podemos comparar e analisar o ensino desenvolvido antigamente e o ensino atual, identificando os pontos que demandam aperfeiçoamento, o que nos permite traçar e planejar formas e alternativas para preencher as lacunas e corrigir as falhas, de modo a não repeti-las. 

Ao longo da minha trajetória acadêmica, da graduação ao mestrado, fui descobrindo aos poucos a importância e a necessidade de um estudo mais robusto acerca daquilo que me propunha a desenvolver no meio educacional. Atividades de ensino que desenvolvo, que vão desde um simples jogo pedagógico à uma pesquisa mais profunda envolvendo a percepção de pessoas sobre o processo educacional, por exemplo, requerem não apenas o meu trabalho de aplicação e obtenção de dados, mas também a percepção de estudiosos consagrados na área, os quais validam e enriquecem o trabalho. Ser uma pesquisadora da área de educação e ensino tem ampliado minha visão enquanto docente em sala de aula, ao passo que, ao desenvolver uma atividade um pouco mais elaborada, traço objetivos e possíveis resultados esperados sobre os quais consigo me debruçar teoricamente, o que significa que não cumpro uma “receita de bolo”. Isto permite comparar as minhas expectativas e pontos de vista com as de outros pesquisadores, agregando ou refutando ideias. 

Sabemos que as áreas da educação e do ensino são um tanto amplas e complexas e que trabalhar com elas não é fácil ou simples, dadas as inúmeras dificuldades e os obstáculos que precisam ser enfrentados no que diz respeito ao trabalho docente nas escolas, como a desvalorização profissional da categoria que recebe salários baixos e as más condições de trabalho. É exatamente visando superar esses desafios que o professor necessita se especializar em sua área de formação. Um dos caminhos possíveis é através da pesquisa. Ao pesquisar, o docente passa a ter conhecimento sobre dificuldades que ele nem imaginava que existiam e muito menos que seria possível superá-las ou amenizá-las, o que não se restringe a somente isso. A pesquisa como atividade docente, por assim apresentar, ao tornar-se um hábito, parte essencial e indispensável ao seu trabalho, além de agregar efetivamente ao conhecimento, possibilita uma troca riquíssima de ideias e experiências entre aqueles que atuam na área, ampliando o leque de possibilidades educacionais. Assim, é por meio da pesquisa que o docente não se permite cair na mesmice e permanecer no ultrapassado, sempre buscando novas metodologias de ensino que agreguem de forma positiva e efetiva ao seu trabalho. A sociedade se transforma e com isso, a educação também precisa se transformar, tendo em vista a disputa por um projeto de sociedade. 

Além do conhecimento adquirido e a troca de experiências, a pesquisa na educação e no ensino permite também a comunicação entre as diferentes áreas, promovendo o desenvolvimento de propostas educativas interdisciplinares em sala de aula, ampliando o leque de possibilidades pedagógicas. Assim, o professor pode diversificar suas formas de trabalhar os conteúdos e ampliar seu currículo, o que pode proporcionar uma atividade educativa mais prazerosa e instigante aos estudantes. Dessa forma, todos ganham. 

Um dos autores que nos ajuda a entender melhor a importância da pesquisa sobre a própria prática docente é Lawrence Stenhouse, professor e pesquisador inglês. Para Stenhouse (1975), o professor pesquisador é um profissional que busca as melhores alternativas de alcançar o aluno durante o processo de ensino e aprendizado, por meio do uso de diferentes materiais adequados ao seu objetivo. Para isso, é importante que o professor investigue sobre o contexto escolar em que desenvolve a atividade docente, por exemplo, se apropriando criticamente do currículo da instituição com o objetivo de contribuir para a sua contínua construção. 

É importante destacar também que, conhecendo a realidade da maioria das instituições de ensino públicas brasileiras, ser um professor pesquisador nem sempre depende exclusivamente do interesse e força de vontade do docente. A falta de suporte material e humano, a baixa infraestrutura e a grande quantidade de aulas por dia, resultado da carga horária exacerbada que muitos professores precisam acolher, são problemas que fazem parte da rotina de muitos desses profissionais e que, por vezes, acabam dificultando ou impossibilitando desenvolver a pesquisa atrelada ao ensino. 

Tendo em vista algumas possibilidades de superação dessas limitações, ressalto aqui a "Carta aos Candidatos à Presidência da República do Brasil", um documento aprovado na Assembleia do XV ENEQ (Encontro Nacional de Ensino de Química), promovido pela Sociedade Brasileira de Química (SBQ), Divisão de Ensino de Química, em 24 de julho de 2010 e publicado na Revista Química Nova na Escola em agosto do mesmo ano. O documento se baseia em dados obtidos em levantamentos nacionais e internacionais por órgãos como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura (UNESCO), a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Escritório Regional de Educação para América Latina e Caribe (OREALC), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e a Conferência Nacional de Educação (CONAE).

No que se refere à aprendizagem dos alunos, tais dados assinalam que países com escolas bem estruturadas e alunos em sala de aula em tempo integral refletem melhores resultados. Já no que diz respeito à carreira docente, enfatiza aspectos relacionados às condições de trabalho e à valorização do professor. O documento aponta ainda, algumas sugestões de medidas consideradas fundamentais para a melhoria da educação, com propostas que compreendem a valorização das escolas, do magistério e da formação de professores nas licenciaturas. 

Com relação à valorização das escolas, o documento apresenta a necessidade do aprimoramento de aspectos relativos à estrutura física e equipamentos, presença de profissionais de apoio à prática docente, dentre outros. Quanto à valorização do magistério, aspectos como o estabelecimento de um piso salarial, plano de carreira e melhores condições de trabalho são considerados fundamentais para a manutenção de uma atuação docente de qualidade, bem como para manter os professores em sala de aula. Já no que se refere à valorização dos cursos de licenciatura, de suma importância para a efetiva melhoria da educação básica no país, o documento menciona aspectos relacionados à qualidade, condições de realização e valorização das instituições formadoras, assinalando a formação consistente e ampla dos futuros professores, quanto a qualidade conceitual e pedagógica, maior aproximação dos cursos de formação e seus profissionais com a educação básica, valorização do Estágio e da Supervisão do Estágio, valorização e ampliação da pesquisa em educação, dentre outros. Vale ressaltar que há mais de uma década tudo isso vem sendo reivindicado na área, mas desde então, o que foi feito em termos de ações concretas e políticas públicas?

Percebe-se que a melhoria da educação é um processo que necessita de planejamento, investimento e estudo e que não há mudança de um dia para o outro. É por meio de um esforço conjunto (cidadãos, escola e sociedade) que o país consegue avançar em termos de progresso educacional, assim, é preciso unir esforços na luta pela melhoria da educação brasileira. 

REFERÊNCIAS

Stenhouse, L. An introduction to curriculum research and development. Londres: Heinemann, 1975.

CARTA AOS CANDIDATOS À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA DO BRASIL. Química Nova na Escola, Vol. 32, n. 3, agosto de 2010. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br/edicao.php?idEdicao=13 Acesso em 23 set. 2022.