Pesquisadora do IPUSP desenvolve tese sobre o desamparo em pacientes com dor lombar crônica
Quem nunca sentiu aquela na base das costas dor nas costas depois de um longo dia de trabalho, horas no trânsito ou alguma atividade física exagerada? Agora imagine sofrer anos seguidos diariamente com desconfortos severos na região lombar – e, pior, muitas vezes ignoradas por parentes, amigos e até mesmo médicos.
Pensando em atender esses pacientes a pesquisadora Nathália Augusta de Almeida, do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP), orientada pela Profa. Elisa Maria Parahyba Campos Rodrigues, desenvolveu a tese “Desamparo em pacientes com dor lombar crônica: estudo psicanalítico e neurocientífico”. A partir de sua grande incidência e complexidade, o tema é de fato uma questão de saúde pública. […] Pelo menos 80% das pessoas têm ao menos um episódio de lombalgia ao longo da vida. Os números tendem só a crescer e existem gastos mundiais em gastos muitos muito altos em medicamento e cirurgia”, aponta a pesquisadora para a relevância do tema estudado.
Seu discurso parte de uma análise mais robusta do próprio sentimento de dor e sobre como essa interfere diretamente em acometimentos físicos: “A dor é uma experiência emocional e sensorial. Ela é sempre subjetiva e multidimensional que engloba aspectos afetivos e sensitivos. Então, não podemos descartar as repercussões psicológicas na dor crônica. Os fatores psicológicos, como no caso o desamparo, desempenham um papel de grande importância no desenvolvimento da dor na região lombar. Não adianta apenas operar ou medicar. Devemos considerar os aspectos biológicos, psicológicos e sociais”.
A psicóloga descreve situações de desamparo extremo daqueles que sofrem com tal dor crônica: “Uma das grandes questões é a verbalização da dor. Assim, muitos deles são ignorados ou menosprezados, não apenas por pessoas próximas, mas pelos próprios médicos. São pacientes muito fragilizados, com poucos recursos psicológicos para lidar com essa dor que persiste há muitos anos. Eles acabam se isolando socialmente, o que afeta o paciente de uma forma global: relacionamento familiar, trabalho, laços sociais, diminuindo as possibilidades da própria amplitude existencial do indivíduo.”
Nathália analisou um grupo de 10 homens que sofriam de dor lombar crônica e dividiu-os em dois grupos: um submetido ao hormônio ocitocina durante 28 dias e o outro atuando enquanto controle. Além disso, eles foram avaliados a partir de entrevistas de relato verbal, testes inconscientes e escalonamento visual do nível de dor sentida.
Os resultados foram animadores e demonstraram melhora do sentimento de desamparo do paciente e percepção de dor, quando submetidos a tal hormônio, comprovando que há, de fato, aspectos psicológicos associados a essa percepção. “A ocitocina é um hormônio [produzido no hipotálamo e] presente no nosso corpo, com potencial terapêutico e efeitos na sensação de bem-estar, uma vez que atua no nosso cérebro. Também está presente também no processo de empatia, motivação do desempenho sexual, do alívio de estresse, e percepção de dor”, explica a cientista.
“Esse hormônio interfere no comportamento social e na forma de ação das pessoas. Dessa maneira, eram observadas atitudes com o intuito melhorar a condição em que eles se encontravam. Buscar ajuda, lutar contra o inimigo, enfrentar obstáculos, superar barreiras eram construções narrativas muito comuns entre os pacientes”, complementa.
Entretanto, Nathália aponta para o despreparo da medicina brasileira: “Muitas vezes a dor ou acometimento são vistos apenas do ponto de vista físico e não considerando os aspectos psicológicos. Acha-se que se opera e resolve. Nós precisamos, nos hospitais públicos e privados, de equipes multidisciplinares cuidando do paciente de uma forma global. É comum do paciente quando tratado dessa forma nem precisar de cirurgia”.
Por Pedro Smith – Agência Universitária de Notícias
Publicado originalmente em Agência Universitária de Notícias