Há mais de dez anos, o LHC desperta a curiosidade de muitas pessoas que querem entender o que se passa nesse acelerador.
01 de julho de 2020 | 16:55
Ricardo Meloni Martins Rosado é licenciado em Física pela Universidade Federal de Itajubá e mestre em Ensino de Ciências Exatas pela Universidade Federal de São Carlos. Desde 2010, é professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) - campus Sertãozinho. Atualmente, é doutorando pelo PIEC na modalidade Ensino de Física, onde trabalha com o tema "formação de professores".
Muitos de nós já ouviram falar sobre um famoso acelerador de partículas na Europa, conhecido pela sigla LHC (Grande Colisor de Hádrons, em inglês). Quando ele iniciou suas atividades em 2008, ganhou as manchetes dos principais jornais. Especulou-se até que ele poderia gerar um buraco negro capaz de engolir a Terra, o que felizmente não era verdade! Em 2012, ele voltou aos holofotes quando anunciou a descoberta de uma nova partícula.
Mas, afinal, o que é o LHC? É possível entender o que se passa nesse gigantesco túnel sem ser um especialista em Física de Partículas? Para Fábio Kopp Nóbrega e Luiz Fernando Mackedanz, pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), a resposta é sim! Ainda que alguns assuntos sejam um pouco mais complexos, boa parte dos conceitos envolvidos na construção de um acelerador de partículas envolvem temas estudados no Ensino Médio, como Leis de Conservação, Eletromagnetismo e Termodinâmica. Então por que não levar esse assunto para as salas de aula?
Para Maurício Pietrocola, professor da Universidade de São Paulo (USP), a Física de Partículas é um assunto que desperta o interesse dos estudantes, pois está presente não só no nosso dia a dia, mas também nos filmes e séries de ficção científica, bastante populares entre os jovens. Professores da Educação Básica, portanto, devem receber formação para poder debater esses assuntos com seus alunos, despertando assim a motivação para estudar Ciência.
Por que estudar o mundo subatômico?
A primeira pergunta que fazemos quando vemos um experimento que requer investimentos de diversos países é: qual é a relevância desse tipo de estudo? Existe alguma aplicação prática para esses conceitos? Apesar da nossa ansiedade por respostas, a Ciência nem sempre é tão imediatista quanto queremos. O CERN (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear), instituição responsável pelo LHC, realiza pesquisas em Física de Partículas há mais de 50 anos. Seu trabalho possibilitou a criação de tecnologias como a world wide web e as telas touch-screen, que estão presentes no nosso cotidiano hoje, mas que jamais poderiam ter sido imaginadas no momento da sua fundação.
Vale lembrar que não são apenas a internet e os smartphones que essas pesquisas nos trouxeram. Diversas tecnologias utilizadas na área de saúde como a tomografia por emissão de pósitrons, responsável por detectar tumores e metástase em pacientes com câncer, surgiram graças à pesquisa em Física de Partículas.
Portanto, não há como sabermos de antemão qual será a aplicação das descobertas do LHC. Pode ser que as pesquisas de hoje sejam a base da tecnologia do amanhã. Colocar os nossos estudantes em contato com o que há de moderno em Ciência é, portanto, formar as pessoas encarregadas pelo nosso futuro.
O que o LHC nos revela?
Os aceleradores de partículas se propõem a responder diversas perguntas sobre a origem do nosso universo. Uma de suas descobertas que ganhou mais destaque em 2012 foi o descobrimento de uma partícula que ficou conhecida como bóson de Higgs.
Para entender o significado desta descoberta, precisamos falar um pouco sobre Cosmologia, que é a Ciência que se dedica ao estudo da origem e evolução do Universo. Segundo as teorias atuais, as partículas que conhecemos foram produzidas a partir do resfriamento de um Universo sem massa. Mas então, de onde surgiu a massa dessas partículas?
Na década de 60, um grupo de cientistas dedicou-se a responder essa pergunta, entre eles, o britânico Peter Higgs. Segundo eles, o universo seria todo permeado por um campo (posteriormente denominado campo de Higgs) e a massa das partículas seria causada por perturbações nesse campo à medida que elas o atravessam. Em outras palavras, quanto mais massivo é um corpo, mais as suas partículas interagem com o campo de Higgs. A principal diferença entre esse campo e os outros que conhecemos, como o gravitacional e o elétrico, é que o campo de Higgs é constante em qualquer ponto do Universo enquanto os demais podem variar (o campo gravitacional, da Terra, por exemplo, fica mais fraco quanto mais nos afastamos do centro da Terra).
Porém, em Ciência, não basta apenas propor teorias. É preciso também haver resultados observáveis e reproduzíveis para a validação delas. Mas como validar uma teoria que diz respeito ao surgimento do Universo? É por isso que o LHC realiza colisões de prótons a velocidades altíssimas. A energia liberada por essas colisões cria condições semelhantes àquelas nas quais o Universo se formou e, se o modelo proposto pelos cientistas na década de 60, estivesse correto, uma partícula deveria ser detectável nesse experimento. Essa partícula é o bóson de Higgs e foi observada simultaneamente em dois experimentos do LHC em 2012.
É possível levar o LHC às escolas?
Muitas pessoas pensam que só podemos ensinar conceitos científicos em ordem cronológica: para entender a Ciência do presente, precisamos dominar a Ciência do passado. Isso não é verdade! Crianças estudam o Sistema Solar muito antes de conhecerem as leis da mecânica celeste e, mesmo assim, a maior parte das crianças acha a Astronomia fascinante e quer saber mais sobre o assunto, mesmo sem compreender o conhecimento que há por trás de tantas descobertas.
Assim como a Astronomia, a Física de Partículas possui um poder motivador para os jovens estudantes que querem compreender como o nosso Universo se formou. Professores que levam esses assuntos para as suas salas de aula possuem alunos mais interessados e, consequentemente, com melhor desempenho nas disciplinas relacionadas a Ciências.
Para saber mais:
Artigos:
NOBREGA, Fábio Kopp; MACKEDANZ, Luiz Fernando. O LHC (Large Hadron Collider) e a nossa física de cada dia. Rev. Bras. Ensino Fís., São Paulo , v. 35, n. 1, p. 1-11, Mar. 2013 . Available from <https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1806-11172013000100001&script=sci_abstract&tlng=pt>. access on 20. Mai. 2020.
PESSANHA, Márion; PIETROCOLA, Maurício. O Ensino de Estrutura da Matéria e Aceleradores de Partículas: Uma Pesquisa Baseada em Design. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, v. 16, n. 2, p. 361-388, 3 set. 2016.
MAXIMO-PEREIRA, Marta. LHC: o que é, para que serve e como funciona?. A Física na Escola, v. 12, p. 37-41, 2011.