
Núcleo de Estudos em Tribunais Internacionais
Faculdade de Direito
Universidade de São Paulo
Largo de São Francisco, 95
Sé – São Paulo, SP
01006-020
A Organização Mundial do Comércio (OMC) executa um papel fundamental no avanço dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, integrando o avanço de uma política sustentável em sua estrutura comercial. Desde a sua criação, a OMC evoluiu para abordar questões além do comércio exterior-tradicional, enfatizando a urgência de um equilíbrio entre crescimento econômico, conservação ambiental e bem-estar social (Sampson, 2005) (Lydgate, 2012).
A OMC promove o apoio mútuo entre a liberalização do comércio e o desenvolvimento sustentável, defendendo políticas domésticas que se alinhem com essas metas (Lydgate, 2012). Por outro lado, a lenta adoção de estratégias de sustentabilidade por empresas multinacionais (MNEs) impediu o progresso em direção aos ODS, levando a ONU a convocar uma “Década de Ação” para acelerar os esforços (Tulder et al., 2021). Discussões recentes dentro da OMC destacam a importância da cooperação entre várias partes interessadas, incluindo governos e ONGs, para implementar efetivamente práticas sustentáveis no comércio (Gehring & Segger, 2004). Assim, o compromisso da OMC com o desenvolvimento sustentável é essencial para alcançar os ODS até 2030.
Na última semana foi divulgado o relatório do Fórum Político de Alto Nível da OMC, o Fórum organizado pela OMC analisará o progresso nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, ao passo que, serão analisados, concomitante, a contribuição do comércio internacional e do sistema multilateral de comércio para alcançar essas metas. Destarte, dentro dos liames de revisão por parte da OMC, enquadram-se os seguintes ODS: ODS-1: “Erradicação da Pobreza”; ODS-2: “Fome Zero”; ODS-13: “Ação Contra a Mudança Global do Clima”; ODS-16: “Paz, Justiça e Instituições Eficazes”; ODS-17: “Parcerias e Meios de Implementação.” A OMC e outras organizações que fazem parte da ONU trabalham em prol para uma cooperação internacional mais inclusivo, sendo esta por meio da coordenação multilateral das regras comerciais, da abertura do comércio de serviços e comércio eletrônico, da abertura do comércio agrícola e do apoio aos PMDs na construção de capacidade para integração no comércio internacional. As políticas domésticas também desempenham um papel importante (OMC, 2024).
O documento produzido pela Organização Mundial do Comércio (OMC) destaca a necessidade da cooperação internacional no âmbito do comércio exterior ser mais ampla para que possa garantir uma integração com fins de seguir as metas previstas dos ODS. No âmbito do comércio e segurança alimentar – ODS-2: “Fome Zero”, o documento enfatiza o papel essencial do comércio na obtenção da segurança alimentar, sobretudo na transformação das políticas comerciais, as quais são necessárias para o enfrentamento dos desafios do sistema alimentar e garantir, ao mesmo tempo, que os sistemas alimentares possam se adaptar às crises, sejam as causadas por conflitos ou crises econômicas.
Cumpre ainda salientar que o relatório apresenta uma análise detalhada sobre a descarbonização e a adoção de novas tecnologias, as quais possuem um significativo potencial para alterar o cenário das exportações de energia, especialmente no que se refere aos combustíveis fósseis. Essas mudanças representam um avanço para a implementação de políticas comerciais sustentáveis voltadas ao enfrentamento das mudanças climáticas, visto que a redução da dependência de combustíveis fósseis é uma meta essencial, em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a transição para energias renováveis.
Ademais, o destaque recai sobre o comércio digital, que simultaneamente oferece novas oportunidades na gestão de empregos formais. O documento assinala que tratar dessas questões pode contribuir para a superação de barreiras históricas de acesso à tecnologia, promovendo um acesso mais democrático. O anexo ainda reforça o papel do comércio como um mecanismo de desenvolvimento, com metas claras para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), tais como o ODS-1: “Erradicação da pobreza”, o ODS-8: “Trabalho decente e crescimento econômico” e o ODS-10: “Redução das desigualdades”. O incentivo à inclusão e à participação de economias emergentes e em desenvolvimento – Sul global, pode ser fundamental para o enfrentamento de desafios sistêmicos.
Nesse sentido, tratar-se de uma abordagem sobre a redução da pobreza e o acesso de modo igualitário a recursos que antes eram vistos como algo inimaginável, é realizar uma referência direta aos mercados abertos. Assim, o relatório destaca a importância de nova visão de mercado, sendo esta, uma visão mais ampla e previsível, sobretudo na agricultura e nos serviços ofertados por ela, considerando que desempenham um papel fundamental na redução da pobreza.
Entre os resultados apresentados no documento, estudos indicam que os países observam um aumento médio de 2,5% no crescimento econômico durante os cinco anos subsequentes à sua adesão ao GATT-OMC. Ademais, essa adesão gera um incremento permanente na produção de aproximadamente 20%, evidenciando os benefícios de longo prazo proporcionados pela integração ao sistema de comércio internacional.
No âmbito agrícola, o anexo destaca possíveis reformas estruturais no comércio agrícola, que representam uma oportunidade para a ampliação da oferta de trabalho. As análises apresentadas evidenciam que tais reformas nas políticas comerciais agrícolas podem contribuir para a redução da pobreza, ao aumentar as oportunidades de emprego e elevar os salários nos setores competitivos de exportação agrícola. Por exemplo, simulações realizadas para o Brasil indicam que essas reformas resultariam em uma redução significativa da pobreza, devido às melhores perspectivas de emprego. Os resultados sugerem, ainda, que mercados agrícolas e de serviços mais abertos e previsíveis podem facilitar a expansão internacional de micro, pequenas e médias empresas (MPMEs).
Esse aspecto é particularmente relevante, visto que as MPMEs frequentemente enfrentam barreiras que limitam seu crescimento em mercados internacionais. O documento discute a importância de decisões recentes da OMC, como a isenção das compras de alimentos realizadas pelo Programa Alimentar Mundial (PAM) das restrições à exportação. Tal decisão integra esforços mais amplos para enfrentar a insegurança alimentar e assegurar que as necessidades humanitárias sejam atendidas em tempos de crises econômicas.
Finalmente, surge o questionamento acerca da relação entre o sistema de solução de controvérsias da OMC e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Em uma análise preliminar, pode-se afirmar que há, de fato, uma relação significativa entre ambos. O relatório ressalta que a OMC, ao facilitar a resolução de disputas comerciais, contribui para a criação de um ambiente de comércio mais previsível e estável, o que é imprescindível para o progresso em direção a diversos ODS, em particular o ODS-16: “Paz, Justiça e Instituições Eficazes”. A promoção de um comércio justo e a resolução pacífica de conflitos comerciais são pilares fundamentais para o alcance desses objetivos.
É importante salientar que o sistema de resolução de controvérsias da OMC também reflete uma preocupação com o impacto negativo que os conflitos podem exercer sobre o comércio global. O documento destaca a necessidade de compreender melhor essa relação para que a OMC possa lidar adequadamente com as implicações dos conflitos no sistema do comércio internacional. Tal compreensão é fundamental para garantir que as economias em desenvolvimento – Sul global, possam beneficiar-se do comércio internacional, mesmo diante de contextos desafiadores.
Não por acaso, a adesão à OMC envolve reformas profundas, que alinham as economias aos padrões internacionais de comércio, melhorando a governança e a estabilidade e, assim, contribuindo para a paz e o desenvolvimento. É assim que se espera, em uma sociedade globalizada, tanto sob uma perspectiva comercial quanto sob uma perspectiva mais ampla, que abrange as relações pessoais que ultrapassam fronteiras.
A adesão à OMC e a implementação de suas regras têm o potencial de contribuir diretamente para a realização do ODS-16, pois promovem boas práticas de governança e fortalecem as instituições. Esse aspecto é particularmente relevante em regiões afetadas por conflitos, onde a estabilidade econômica pode desempenhar um papel vital na construção de uma paz duradoura. Por fim, o sistema de resolução de controvérsias da OMC pode ser uma ferramenta essencial para a promoção da paz e da estabilidade no comércio internacional, sendo sua eficácia diretamente vinculada ao avanço dos ODS, especialmente no que tange à construção de instituições eficazes e à promoção da justiça.
A conclusão do relatório também destaca o potencial do comércio digital em proporcionar novas oportunidades para populações vulnerabilizadas, permitindo-lhes acessar mercados em todo o mundo e superar barreiras históricas. Em síntese, os resultados apresentados no documento ressaltam o papel fundamental das políticas e reformas comerciais na promoção do crescimento econômico, na redução da pobreza e no cumprimento das metas de desenvolvimento sustentável, especialmente na esfera de desafios em todo o mundo, como a insegurança alimentar e a desigualdade econômica.
References
GEHRING, Markus W.; CORDONIER SEGGER, Marie-Claire (ed.). Sustainable development in world trade law. Alphen aan den Rijn: Kluwer Law International, 2005. (Global Trade & Finance).
LYDGATE, Emily B. Sustainable development in the WTO: from mutual supportiveness to balancing. World Trade Review, v. 11, n. 4, p. 621-639, 2012. DOI: 10.1017/S1474745612000341. Acesso em: 5 set. 2024.
SAMPSON, Gary P. The WTO and sustainable development. 1. ed. Londres: United Nations University Press, 2005. Edição em inglês. Disponível em: https://archive.unu.edu/unupress/2005/wto.html. Acesso em: 5 set. 2024.
UNITED NATIONS DEPARTMENT OF ECONOMIC AND SOCIAL AFFAIRS (UNDESA). Make the SDGs a reality. UNDESA, 2024. Disponível em: https://sdgs.un.org/#goal. Acesso em: 10 set. 2024.
TULDER, Rob van; RODRIGUES, Suzana B.; MIRZA, Hafiz; SEXSMITH, Kathleen. The UN’s Sustainable Development Goals: can multinational enterprises lead the Decade of Action? Journal of International Business Policy, v. 4, n. 1, p. 1-21, 2021. DOI: 10.1057/S42214-020-00095-1. Acesso em: 6 set. 2024.
WORLD TRADE ORGANIZATION (WTO). WTO’s contribution to attaining UN sustainable development goals: 2024 update to the high-level political forum. World Trade Organization, 2024. Disponível em: https://www.wto.org/english/res_e/publications_e/un_hlpf24_e.htm. Acesso em: 5 set. 2024.
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