Como podemos fomentar a Educação Ambiental na formação de professores de Ciências? Estudo investiga as representações de licenciandos ingressantes das Ciências da Natureza acerca do tema.
Sou professor de Química pela UFES e atualmente mestrando pelo PIEC-USP. Meus interesses acadêmicos perpassam por temáticas como Experimentação no Ensino de Química e Profissionalidade docente. Em meio tempo livre, enquanto não estou lendo, amo pesquisar curiosidades geek sobre cultura pop, fazer atividade física e ouvir música pop. Não menos, integro o corpo editorial da Revista BALBÚRDIA.
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12 de agosto de 2024 | 10:00
Em tempos em que cada vez mais se discute mudanças climáticas, aquecimento global e antropização (ação do ser humano no meio ambiente), se torna urgente promover discussões acerca da Educação Ambiental. Mas muito se questiona: o que vem a ser esta educação? Minimizar impactos antrópicos é de longe uma das ideias mais comuns quando falamos em Educação Ambiental, que pode apresentar muitos sentidos e em diferentes contextos, particularmente, entre ingressantes de cursos de Licenciatura das Ciências da Natureza.
Compreender a polissemia que envolve as discussões concernentes à Educação Ambiental é a proposta de Rafael Almeida de Freitas e Marcos Vogel em publicação de 2022 na Revista Brasileira de Educação Ambiental. Os autores nos apresentam um estudo que visa preencher uma lacuna existente no campo acadêmico que tenta articular a representação de licenciandos em formação inicial, o Ensino de Ciências e a Educação Ambiental. Para os autores, por exemplo, é explícita a sua perspectiva como “Filosofia de Vida”, em que a Educação Ambiental se mostra como uma maneira de como nos orientamos para compreender as relações com nossa própria realidade socioambiental e como nos comportamos frente a ela. A dupla, assim, investigou a partir do referencial teórico-metodológico Teoria das Representações Sociais, se ingressantes das Licenciaturas de Química, Física e Ciências Biológicas da Universidade Federal do Espírito Santo compartilhavam socialmente de uma representação acerca da Educação Ambiental. Para tanto, aplicaram um questionário a 66 licenciandos. O questionário foi desenvolvido com o objetivo de compreender as expressões mais importantes para eles ao pensarem em Educação Ambiental. Após obterem essas expressões, os pesquisadores as analisaram para compreender o seu sentido.
Mas antes de tudo, o que é Representação Social?
Quem nunca ouviu falar que somos seres sociais? Que nossas trajetórias de vida e profissional são marcadas por experiências coletivas e individuais, como na família, na escola, na universidade, em nosso campo de trabalho, etc.? Os autores nos apresentam esses aspectos para que possamos compreender um conceito chave de seu estudo: a representação social. Surgida no campo da Psicologia Social, por Serge Moscovici (2010), embora seja um conceito um tanto complexo, podemos assim simplificá-lo: é o nosso senso comum, é a maneira de expressarmos e comunicarmos aquilo que sabemos, sobre as mais diferentes coisas (acontecimentos, pessoas, ideias) que fazem parte da nossa vida cotidiana. Significa dizer que podemos, ao mesmo tempo, pertencer a vários grupos sociais.
Só construímos e mobilizamos essa maneira de pensar quando nos relacionamos e nos comunicamos socialmente, quando compartilhamos consensos com outras pessoas sobre um assunto, e não necessariamente precisamos estar em um mesmo local. As experiências que vivenciamos anteriormente e os diferentes modos de como nos comunicamos vão sendo incorporados nessa forma de pensarmos. Nos guiamos nela para explicar e compreender nossa realidade, tomamos e justificamos nossas ações por ela, seja no trabalho, seja socialmente.
A sustentabilidade como eixo formativo na Educação Ambiental
Dito isso, Rafael e Marcos (2022) nos apresentam quatro (4) palavras-chave que nos indicam o que os licenciandos imaginam que seja a Educação Ambiental. São elas “preservação”, “conscientização”, “reciclagem” e “poluição”. Mas como eles chegaram nesses resultados? As análises utilizadas pelos pesquisadores mostram que estes termos são os mais frequentes dentre os sinalizados pelos sujeitos investigados. O resultado indica o quão significativos são esses termos ao se pensar o que é Educação Ambiental.
Uma das ideias mais comuns desses sujeitos é a de que a Educação Ambiental refere-se a ações de preservar a natureza, de cuidá-la com qualidade e respeito. Preocupar-se com as nossas ações perante a natureza é, assim, uma responsabilidade. O exemplo mais claro diz respeito à poluição, causada ao ambiente por diferentes ações prejudiciais. Embora não explicite efeitos, fica implícita ainda a relação com questões como saúde humana a curto e a longo prazos. Os pesquisadores evidenciam, assim, entre as ideias desses futuros professores, a de que a Educação Ambiental envolve aprender a lidar com os diferentes tipos de poluição.
Se a poluição é um problema e a Educação Ambiental é uma via de solução, é comum entre os participantes conscientizar-se. Conscientizar é visto como um processo de mudança do comportamento e da visão perante nossa realidade socioambiental. É estar ciente dos efeitos de nossas próprias ações para tomar decisões que sinalizem essa preservação de recursos. É uma conscientização em campos éticos e morais, ressignificando sua relação com os outros e com a natureza. Essa mudança comportamental se daria, por exemplo, pelos processos de reciclagem. Descartes inadequados e excesso de materiais industriais são fortemente apontados pelos professores em formação como aspectos a serem trabalhados com os alunos. É explícita a defesa de ações sustentáveis por toda população.
Mas os autores nos fazem questionar: como trabalhar estas questões em sala de aula? Eles compreendem que estas ideias são importantes na inserção do trabalho dialógico com esses diferentes conceitos. Torna-se importante trabalhar cada uma dessas palavras com os estudantes, para auxiliá-los a compreender e a se apropriar desses conceitos e valores, trabalhando-se diferentes dimensões de aprendizagem, como quanto a pensar a poluição e reciclagem como práticas a serem tomadas. São ações que requerem uma dimensão atitudinal dos alunos, de responsabilidade para com a conscientização e preservação do ambiente.
Olhares para a formação inicial de professores das Ciências da Natureza
As ideias retratadas pelos ingressantes são apontadas como claramente conservacionistas, resolutivas e responsáveis, centradas no ato de conservar recursos e buscar informações para tomadas de posição. O estudo de Rafael e Marcos (2022) nos possibilita compreender aspectos que têm sido trabalhados na educação básica e que devem ser aprofundados ao longo da formação inicial de professores das Ciências da Natureza. Princípios como preservação e sustentabilidade são possibilidades de dialogar com as questões relativas à Educação Ambiental. Situa-se que estes princípios estão de acordo com alguns aspectos esperados ao longo desse percurso formativo, desvelando-se uma consciência crítica que possa ser incorporada em sua futura atuação.
Os autores nos fazem refletir sobre a sustentabilidade como um eixo de destaque, como objeto de reflexão na formação de professores, no que diz respeito a seus princípios e práticas que são marcadas pelas relações entre ser humano e natureza, sinalizadas como relações ecocívicas (ou relacionadas ao ecocivismo). A defesa por uma Educação Ambiental não perpassa longe das discussões sobre currículo e formação docente. É necessário repensar como ela é (e deveria ser) trabalhada na formação inicial, tanto em termos de questionar as disposições curriculares dos cursos de licenciatura quanto na identificação e preenchimento de lacunas entre essas duas dimensões, regimental e teórico-prática, dos futuros professores. Por exemplo, no que diz respeito à ausência ou a escassez de atividades que auxiliem no estabelecimento de relações entre os conteúdos das disciplinas e discussões que versam a Educação Ambiental, à oferta de disciplinas optativas voltada a discutir tópicos particulares e à própria estrutura curricular, que muitas vezes se orienta pela fragmentação das disciplinas. Por serem egressos do ensino médio, deixa-se em aberto discussões acerca da relação entre essa educação e a ciência, em questionar o papel científico, na medida em que se possa construir caminhos pelos quais esses futuros professores também as façam com o seu público, dialógica e criticamente.
E então, ficou curioso pelo tema? Segue o link do artigo na íntegra:
FREITAS, Rafael Almeida de; VOGEL, Marcos. A Educação Ambiental pela representação social de alunos ingressantes e Cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas, Física e Química da Universidade Federal do Espírito Santo. Revista Brasileira de Educação Ambiental, v. 17, n. 2, p. 239-259, 2022. Disponível em: <https://doi.org/10.34024/revbea.2022.v17.12622>. Acesso em: 11 jul. 2024.
MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigações em psicologia social. 7ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010, 404 p.