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Caso Israel x Hamas: histórico do caso no Tribunal Penal Internacional e a nova decisão capaz de alterar o rumo do processo

Caso Israel x Hamas: Histórico do caso no Tribunal Penal Internacional e a nova decisão capaz de alterar os rumos do processo

The International Criminal Court has now openly taken its place in the conflict between Israel and Hamas. Photo montage: Justice Info.

Desde 7 de outubro de 2023, os territórios de Israel e Palestina estão envolvidos em um conflito de grandes proporções, com repercussões humanitárias devastadoras. Relatório da Human Rights Watch estima cerca de 44 mil mortes na Faixa de Gaza — número que não inclui pessoas desaparecidas sob os escombros ou falecidas por causas secundárias, como doenças e fome. Além disso, aproximadamente 87% da infraestrutura educacional local, incluindo escolas e universidades, foi danificada ou destruída.

A gravidade da situação levou à intensificação de apelos internacionais por responsabilização, considerando-se, ainda, que desde 2015 a Palestina aderiu ao Estatuto de Roma, permitindo ao Tribunal exercer jurisdição sobre crimes cometidos em seu território. Assim, em 17 de novembro de 2023, cinco países — África do Sul, Bangladesh, Bolívia, Comores e Djibuti — enviaram ao Escritório do Procurador do Tribunal Penal Internacional (TPI) remessa solicitando investigação formal sobre a situação no Estado da Palestina. Posteriormente, Chile e México também apresentaram pedidos semelhantes. Mesmo antes do atual conflito, e considerando o histórico da região, o próprio TPI já havia iniciado, em março de 2021, uma investigação sobre a situação na Faixa de Gaza.

Na semana passada, novo desdobramento relevante ocorreu no caso. Em 24 de abril de 2025, foi proferida nova decisão no âmbito do caso Israel x Hamas, com potencial para redefinir os rumos do processo no Tribunal, conforme será detalhado a seguir.

 

1. Histórico do caso no Tribunal Penal Internacional (TPI)

Desde 21 de novembro de 2024, a Câmara de Pré-Julgamento I do Tribunal Penal Internacional (TPI) havia expedido mandados de prisão em desfavor de Benjamin Netanyahu (Primeiro-ministro de Israel), Yoav Gallant (ex-Ministro da Defesa de Israel) e Mohammed Deif (comandante do grupo Hamas, cuja morte ocorreu em julho de 2024, mas só foi formalmente confirmada em janeiro de 2025). Naquela oportunidade, a Câmara rejeitou, por unanimidade, duas impugnações apresentadas por Israel com fundamento nos artigos 18 e 19 do Estatuto de Roma.

As impugnações israelenses haviam sido apresentadas em 26 de setembro de 2024, contendo dois pedidos. No primeiro, foi contestada a jurisdição do Tribunal sobre a situação em Gaza e sobre os cidadãos israelenses, invocando o artigo 19(2). No segundo, solicitou-se que a Promotoria emitisse uma nova notificação sobre o início da investigação, conforme o artigo 18(1). Ao declinar de ambas as alegações, a Câmara entendeu que a aceitação da jurisdição do Tribunal por Israel não era necessária, dado que a Palestina, enquanto Estado Parte, já havia conferido tal competência. Além disso, considerou que Israel não poderia impugnar a jurisdição nos termos do artigo 19(2) antes da emissão dos mandados de prisão. Quanto ao segundo pedido, a Câmara concluiu que, como Israel já havia sido notificado da abertura da investigação pelo Procurador Geral do TPI em 2021 e, nesta ocasião, não solicitara o adiamento, não caberia nova comunicação nem a suspensão dos procedimentos.

No entanto, a situação passou por significativa modificação recentemente em 24 de abril de 2025, quando a Câmara de Apelações do TPI determinou o reexame das objeções de Israel por um painel de primeira instância. De acordo com os juízes de apelação,  o Tribunal, ao considerar inicialmente as impugnações como “prematuras”, teria cometido um “erro de direito”, deixando de analisar adequadamente os questionamentos israelenses quanto à jurisdição e à validade dos mandados de prisão.

Importante salientar que esta última decisão não adentrou o mérito das acusações contra os indivíduos investigados, tampouco analisou o conteúdo dos crimes imputados. A deliberação limitou-se a aspectos preliminares e procedimentais, relacionados à admissibilidade e à jurisdição do Tribunal. Em outras palavras, a decisão concentrou-se em garantir que as etapas formais do processo fossem adequadamente respeitadas, reabrindo a análise das impugnações apresentadas por Israel sem, contudo, alterar a vigência dos mandados de prisão nem pronunciar-se sobre a culpa ou inocência dos acusados.

Na hipótese de o reexame do Tribunal julgar favoravelmente às objeções apresentadas por Israel, então o curso processual poderá ser profundamente impactado, com possíveis implicações para a validade dos mandados de prisão já expedidos e para a própria continuidade da investigação em relação a autoridades israelenses. A eventual declaração de inadmissibilidade da situação — seja por insuficiência de jurisdição, seja por alegada duplicidade de procedimentos internos eficazes em Israel — abriria precedentes relevantes sobre os limites da atuação do TPI em contextos de ocupação prolongada e conflitos assimétricos. Ao mesmo tempo, tal desfecho poderia ser reinterpretado em face do princípio da complementaridade, especialmente frente a cenários com alegações de impunidade sistêmica. Por essa razão, o reexame das objeções de Israel transcende aspectos meramente técnicos, inscrevendo-se no debate mais amplo sobre a autoridade e a efetividade da justiça penal internacional em situações de elevado risco político e humanitário.

 

2. O que esperar?

O caso também revela a inter-relação entre o Direito Internacional e as Relações Internacionais. Isso porque, a partir das decisões do Tribunal Penal Internacional (TPI), tem-se observado o constante posicionamento de representantes de diferentes países no cenário internacional, manifestando concordância ou discordância — sobretudo em relação às determinações de prisão — e evidenciando, assim, os alinhamentos político-diplomáticos e as diretrizes de política externa de cada Estado.

Nesse contexto, recentemente, o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, ao recusar-se a prender o primeiro-ministro de Israel durante visita oficial ao país, anunciou a retirada da Hungria do TPI. Em sentido semelhante, os Estados Unidos impuseram sanções econômicas e restrições de entrada em território americano a funcionários do Tribunal, em clara retaliação às ordens de prisão emitidas contra autoridades israelenses.

Em consonância com o que se espera de uma instituição no âmbito do Direito Internacional, o TPI tem mantido sua imparcialidade e independência judicial, resistindo a pressões políticas e ameaças externas. A reafirmação desse posicionamento em questões sensíveis e complexas — como a que envolve Israel e Palestina — reforça o compromisso do Tribunal com a aplicação universal do Direito Penal Internacional, sem, contudo, se submeter a interesses de cunho político. 

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