Legenda: As apropriações do termo “quântico” em comunidades especialistas e não especialistas em Física Quântica reverbera em apropriações da Teoria Científica não somente em ambientes científicos como também socioculturais. Créditos: Freepik. Disponível em: https://br.freepik.com/vetores-gratis/ilustracao-quantica-de-design-plano-desenhado-a-mao_22112077.htm#&position=2&from_view=collections. Acesso em: 22 fev. 2023.
É importante entender e divulgar a ciência para além do espaço escolar e identificar os seus aspectos constituintes.
Mestranda em Educação em Ciências e Saúde no Instituto Nutes de Educação em Ciências e Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Licenciada em Física pelo Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), Campus Petrópolis. Participou como voluntária no Projeto Astronomia para Todos no CEFET/RJ (2016) e na Escola Germano Valente (COMAC), ministrando aulas de reforço de matemática para turmas de 3º ao 9º ano do Ensino Fundamental (2017). Atuou como bolsista no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), ofertado pelo CEFET/RJ (2016 - 2018), na Iniciação Científica pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (2018 - 2019), e no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) pelo CEFET/RJ (2019 - 2020). Realizou Intercâmbio Estudantil, pelo CEFET/RJ, no Instituto Politécnico de Bragança (2018 - 2019). Atualmente é responsável pela divulgação e comunicação da Organização Internacional para Educação em Ciência e Tecnologia (IOSTE) Regional América do Sul. Seus interesses de pesquisa concentram-se nas relações existentes entre linguagens e Educação em Ciências.
Perfil de instagram: @karlbruna
11 de dezembro de 2023 | 16:00
A Física Quântica é um ramo da Física Moderna, proposta no século XX, que é voltada exclusivamente para estudos de corpos muito pequenos, como é o caso de partículas atômicas e subatômicas. Esta teoria científica foi desenvolvida a fim de resolver problemas que a Física Clássica não conseguia explicar, como é o caso do efeito fotoelétrico. Além disso, proporciona, ainda nos dias de hoje, o desenvolvimento de lasers, a utilização de painéis solares para a geração de energia elétrica etc. Contudo, é possível observarmos um crescente movimento que visa a articulação da Física Quântica com a espiritualidade, por meio de aproximações da Teoria Física com aspectos relativos ao aprimoramento do corpo, da mente e do bem-estar pessoal, mesmo que não tenhamos evidências científicas comprobatórias. Este movimento ficou conhecido como misticismo quântico, e se caracteriza como fenômeno cultural, porque mobiliza e articula conceitos e contextos relativos tanto aos conhecimentos científicos, quanto à religião e à medicina, por exemplo.
O termo “quântico” que não pertence à Física Quântica
A pesquisadora Márcia Saito, em artigo publicado na Revista Brasileira de Ensino de Ciências e Matemática destaca as formas pelas quais o fenômeno cultural do misticismo quântico vem sendo recebido por professores e pesquisadores atuantes no Ensino de Física. As reações acerca deste fenômeno variam entre curiosidade e interesse e até mesmo entre resistência e ironia. Além disso, há uma preocupação com a grande disseminação do termo “quântico” em situações que envolvem temas cotidianos e a resolução de problemas pessoais, afinal, é bem provável que você já tenha visto algum anúncio de sal quântico que auxilia na prevenção de doenças ou de bracelete quântico que estimula o bem-estar, não é mesmo? Estas atribuições do termo “quântico” aos produtos comercializados ultrapassam as barreiras científicas nas quais a Física Quântica foi formulada e podem proporcionar que inverdades sejam propagadas em nossa sociedade. Entretanto, Saito afirma que, para que a discussão sobre o misticismo quântico aconteça de uma forma benéfica ao público especialista e ao público leigo, é necessário que consideremos as perspectivas históricas, filosóficas, sociais e educacionais deste fenômeno para provocarmos reflexões acerca de novas possibilidades de abordarmos esse tema, que são provenientes de processos, interesses e contextos de natureza sociocultural.
Aspectos que envolvem o misticismo quântico
Numa perspectiva histórica, a pesquisadora versa sobre a compreensão da história da Física Quântica e os debates na comunidade científica que foram responsáveis pela criação e pelo desenvolvimento do misticismo quântico. Para isto, se utiliza de exemplificações do período da Guerra Fria, elucidando que este foi um momento favorável a novas interpretações desta teoria científica. Saito também busca tecer paralelos entre o desenvolvimento científico proporcionado pela corrida armamentista e a ascensão do movimento de contracultura. Encontramos citações de diferentes nomes que foram considerados como essenciais para o desenvolvimento da Física Quântica, e para o surgimento e a consolidação do misticismo quântico.
Na perspectiva filosófica, é possível percebermos alguns debates sobre os fundamentos da Física Quântica, além das diferentes interpretações acerca desta teoria que têm circulado no âmbito social. Saito também elucida as discussões sobre os aspectos que propiciaram o surgimento e o desenvolvimento do misticismo quântico, tendo como base o problema da demarcação na ciência e os diferentes tipos de misticismo: o desafiador e o conciliador da ciência. Estas explicações terminam com uma síntese dos fatores que são contemplados no fenômeno cultural do misticismo quântico, reforçando que, mesmo na literatura especializada, ainda não há um consenso.
Por fim, na perspectiva social e educacional, somos capazes de compreender e refletir sobre as influências deletérias do misticismo quântico na sociedade, sobretudo com arcabouços sociais proveitosos ao entendimento das comunidades que este fenômeno alcança, quais são os seus anseios, modus operandi e contexto sociocultural. Sob lentes educacionais, Saito destaca a importância de se abordar a Física Quântica nas escolas com o objetivo de estimular a discussão sobre conhecimentos científicos e não científicos, e de incentivar os processos de tomada de decisão embasados em avaliações críticas das informações que os alunos têm contato. A autora também discute sobre a Nova Era e o neoesoterismo (isto é, a ampliação de práticas esotéricas que envolvem o desenvolvimento de serviços, produtos e atividades na sociedade) na perspectiva social para elucidar que a comunidade associada ao misticismo quântico é adepta a estes tipos de práticas. Ressalta-se a presença dos termos “quântico” e “quântica” nas mais diversas áreas de conhecimento, e não mais exclusivamente na física, se reverberando, também, em interesses mercadológicos provenientes de indústrias, empresas etc., a fim de sustentar afirmações das mais diversas naturezas que visam a sustentação de uma verdade particular.
O que podemos considerar, então, sobre o misticismo quântico?
Em seu texto, Saito percorre estas quatro diferentes perspectivas a fim de ressaltar como o misticismo quântico vem sendo discutido na Educação Científica. Entretanto, é possível que investiguemos este fenômeno sob lentes de outras perspectivas, por exemplo, as discursivas e as sociológicas. O desenvolvimento de novas pesquisas pode permitir que compreendamos novas percepções acerca do fenômeno e desenvolvamos novos estudos que indiquem possibilidades e limitações de discussões no campo científico.
As consequências da pesquisa realizada pela autora proporcionam que novas interpretações sobre o misticismo quântico sejam realizadas e alertam para a importância da divulgação científica sobre Física Quântica em ambientes que não sejam somente os formais de educação. Conforme podemos perceber, em nosso cotidiano, é comum utilizarmos redes sociais e recorrermos às ferramentas de pesquisa online como fontes de pesquisa. No entanto, estes ambientes não inibem a mútua existência de conteúdos científicos e não científicos, cabendo ao leitor reconhecer o tipo de informação que está tendo contato e ponderar se ele é ou não confiável.
Saiba mais lendo o artigo completo!
SAITO, Marcia Tiemi. O Fenômeno Cultural do Misticismo Quântico: possibilidades e perspectivas de investigação. Revista Brasileira de Ensino de Ciências e Matemática, v. 4, n. 3, 2021. Disponível em: http://seer.upf.br/index.php/rbecm/article/view/12903/114116170. Acesso em: 26 nov. 2021.